quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Arrependimento: Processo Espiritual de Impeachment

Somente o Filho de Deus, Jesus, pode trazer o Seu Reino aqui na terra, implantá-lo em nossa cidade, em nossa geografia, em toda área espiritual, geograficamente. 

O Filho de Deus inaugurou a manifestação do Reino dos Céus num estágio tão superior e poderoso como jamais foi visto. Jesus veio inaugurar uma era na qual o Reino seria manifesto no coração dos homens por meio da fé no Salvador. 

Anunciar que é chegado o Reino de Deus é falar da nova realidade trazida por Jesus; é falar do cumprimento do plano de Deus para a história da redenção. 

Em Cristo se cumprem as promessas do reinado eterno de Deus. A espera havia acabado; o tempo da ação decisiva e soberana de Deus na história da redenção havia se cumprido. O Reino de Deus havia chegado porque o Rei em pessoa estava ali, anunciando sua chegada. 

Dizer que é chegado o Reino de Deus pela pessoa de Jesus, significa dizer que Jesus inaugurou um novo momento na história da redenção; uma nova maneira de Deus se relacionar com os homens. 

O Messias verdadeiro, o Rei prometido nas Escrituras Sagradas, não veio cumprir a agenda dos homens; Ele veio cumprir o propósito soberano de Deus. 

O Reino de Deus possui dois aspectos: presente e futuro. Em seu aspecto presente, o Reino essencialmente é de caráter espiritual. Mas em seu aspecto futuro, na consumação dos séculos, o Reino de Deus alcançará sua plenitude e se manifestará de forma visível e gloriosa. 

A entrada no Reino de Deus expressa justamente a realidade de ser redimido por Jesus e habitado pelo Espírito Santo. Então ninguém pode entrar no Reino de Deus por seus próprios méritos. 

O Reino de Deus envolve a completa salvação. Em outras palavras, o Reino de Deus inclui todas as bênçãos materiais e espirituais que acontecem quando Deus é reconhecido e obedecido como o Rei do nosso coração. 

A Igreja é a comunidade de pessoas em cujos corações Deus é reconhecido como Rei e Senhor. Então há um sentido específico em que o Reino de Deus e a Igreja são expressões quase que equivalentes. 

Isso explica a promessa de Jesus ao falar sobre a liderança e o fundamento apostólico na edificação da Igreja: “Dar-te-ei as chaves do Reino dos Céus” (Mateus 16:19). 

Quando entendemos que o Reino de Deus está dentro de nós, entramos no desafio de descobrir que nossa responsabilidade se ampliou. Quando entendemos sobre o Reino e não nos posicionamos, somos considerados súditos do Rei e revelados ignorantes aos direitos que os príncipes têm por direito. 

O reino celestial não é como os reinos mundanos. O governo de Deus se dirige ao coração (espírito) do homem. Deus governa seu povo por meio do convencimento e direção dados pelo Espírito Santo em direção a Jesus e em consonância a Sua Palavra. 

Os cidadãos do reino são aqueles que renasceram em Cristo. A palavra Reino é ligada diversas vezes a palavra de arrependimento: “Arrependei-vos, porque está próximo o Reino dos Céus” (Mateus 3:2). Para que um governo seja posto, um outro deve ser deposto. Não há como servir a dois senhores. Para que o Reino de Deus venha, o reino dos homens deve dar passagem. 

Arrependimento seria como um impeachment (impedimento para continuar no governo). Um impedimento do homem para com o seu próprio governo. É abrir mão do controle da própria vida e se render ao controle do Espírito Santo de Deus.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

O Homem Que Não Morreu, e Já Não Era.

“Jarede viveu cento e sessenta e dois anos e gerou a Enoque. Depois que gerou a Enoque, viveu Jarede oitocentos anos; e teve filhos e filhas. Todos os dias de Jarede foram novecentos e sessenta e dois anos; e morreu. Enoque viveu sessenta e cinco anos e gerou a Matusalém. Andou Enoque com Deus; e, depois que gerou a Matusalém, viveu trezentos anos; e teve filhos e filhas. Todos os dias de Enoque foram trezentos e sessenta e cinco anos. Andou Enoque com Deus e já não era, porque Deus o tomou para si”. Gn 5, 18–24.
 

Enoque foi o sétimo depois de Adão. Ele vem da geração que começou após a morte de seu irmão Abel. 

Sabemos muito pouco sobre Enoque. O pouco que sabemos, contudo, nos permite compreender o porquê de Deus tê-lo colocado na lista de heróis da fé, na lista daqueles cujo testemunho devemos imitar, enquanto perseveramos nós também em nossas próprias histórias de vida. 

Enoque foi filho de Jarede e pai de Matusalém. Ele foi um descendente de Sete, e essa geração era famosa por sua longevidade. A ciência já recorreu a possibilidade disso acontecer em situações extraordinária quando o quadro genético da pessoa é favorável a isso. 

Numa geração onde as pessoas viviam séculos e séculos, Enoque viveu pouco; foram somente 365 anos de vida. Isso era considerado pouco em sua geração e, especialmente, dentro de sua descendência. Ao contrário de Enoque, seu filho Matusalém foi o homem que mais tempo viveu sobre a face da terra, morrendo com 969 anos de idade. Ninguém na longínqua geração de Sete, filho de Adão, viveu tanto tempo. 

Mas, o tempo mais curto de vida de Enoque não se deu por qualquer acidente. Ao contrário. Foi o próprio Deus que decidiu interromper sua história de vida, chamando-o para Si de uma forma desconhecida naquele tempo. Enoque não morreu. Deus o levou vivo para o céu. Deus o trasladou sem que tivesse que encarar o último inimigo do homem, a morte. 

Além dele, outros poucos viveram isso na história. E a razão pela qual Deus o levou dessa maneira é o que torna a vida de Enoque especial para todos nós. 

Enoque teve muitos irmãos. No entanto, ninguém temia ao Senhor como ele. Nós nem mesmo sabemos do nome de seus irmãos. Seus irmãos não são chamados de heróis da fé. Isso não significa que eles não tenham temido ao Senhor, mas que eles não chegaram ao ponto onde Deus espera que todos cheguemos um dia. E Enoque chegou lá, e chegou o mais perto que qualquer outro homem tenha chegado. 

Isso já nos mostra o quanto Enoque era especial e diferente dos de sua geração. Diferente, mas nem tanto. Enoque teve um filho, Matusalém. Isso significa que Enoque se casou, e teve com sua esposa filhos e filhas. Ou seja, nesse quesito, Enoque foi bastante parecido com as pessoas de sua época. Ele não era um super-homem, mas um homem comum que nasceu, teve irmãos e irmãs, conheceu uma garota, casou-se com ela e teve filhos e filhas com ela. 

Mas, o diferencial na vida de Enoque é que “Andou Enoque com Deus”. O que significa andar com Deus? Andar com Deus significa andar com pensamentos em Deus. Significa também andar com atos de amor pelo Senhor, dizendo não ao pecado e a tudo que sua geração lhe oferecia. Significa que o coração de Enoque estava o tempo todo em Deus. 

O mundo na época de Enoque não era muito diferente do nosso. A maldade e o pecado já enchiam a Terra que, após somente quatro gerações, seria totalmente destruída. É possível que muitos contemporâneos de Enoque tenham morrido no dilúvio, no qual se destacou um bisneto, um homem chamado Noé. 

Então, imagine o mundo já em sua época crescendo em maldade e pecado. Lembre-se do que disse Jesus, de que o mundo estaria como nos dias de Nós, nos dias que antecedessem sua segunda vinda. Muitos já cremos que estamos muito próximos desse dia, talvez vivendo aquilo que Enoque viveu — os dias que antecederam o dilúvio. 

E foi nesse tempo de pecado que um homem se destacou pelo simples fato de ter decidido andar com Deus. 

É interessante notar que outros em sua geração haviam sido fiéis e tementes a Deus. Enoque vem da geração de Sete e Enos, no tempo de quem “Começou a invocar o nome do Senhor”

No entanto, Enoque amou mais a Deus do que, provavelmente, todos os seus antepassados. Ele viveu uma vida de serviço ao Senhor e de adoração. É bem provável que ele tenha se destacado diante de seus antepassados, razão pela qual nem mesmo conheceu a morte. A Bíblia apenas diz que “Andou Enoque com Deus e já não era, porque Deus o tomou para Si”, Gn 5.24. 

Quando a genealogia de Jesus é contada em Lucas, ele é colocado na geração de Enoque e de seu filho Matusalém. A forma como ele deixou este mundo é contada pelo autor de Hebreus: 

“Pela fé, Enoque foi trasladado para não ver a morte; não foi achado, porque Deus o trasladara. Pois, antes da sua trasladação, obteve testemunho de haver agradado a Deus. De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador dos que o buscam”, Hb 11.5–6). 

Assim, completa-se a ideia de que Enoque agradou a Deus, creu na existência de Deus, e viveu com essa certeza todos os dias de sua vida, agindo de um modo diferente dos de sua geração. 

Ele temeu a Deus, como muitos outros, mas sua fé era de tal modo prática, que o texto bíblico diz que ele agradou ao Senhor, e não outros. 

Enoque aponta para Cristo no sentido de ele mesmo ter andado como Cristo andou. A vida de Cristo foi, como a de Enoque, um andar com Deus. Suas ações, suas palavras, suas orações, refletem um homem que também andou com Deus. 

E é interessante que nossas vidas devem ser marcadas por um seguir dos passos de Jesus, um andar como Ele andou. 

“Portanto, vede prudentemente como andais, não como néscios, e sim como sábios”. Ef 5.15 

Devemos andar na luz, disse Jesus: 

“Respondeu-lhes Jesus: Ainda por um pouco a luz está convosco. Andai enquanto tendes a luz, para que as trevas não vos apanhem; e quem anda nas trevas não sabe para onde vai”. João 12.35. 

Hoje, podemos viver em meio a muitas pessoas que também expressam uma espécie de temor ao Senhor. No entanto, isso não muda nada na vida dessas pessoas. 

E creio que o Senhor espera que você seja alguém como Enoque em sua geração, alguém que cause mudanças, que seja diferente, que caminhe com Ele, pensando nEle, falando com Ele, sempre diante da face dEle. 

Andar com Deus não é simplesmente afirmar-se como um cristão. Andar com Deus hoje significa ser alguém que honra a Deus em cada palavra que fala, em cada atitude que toma, em cada passo que dá. Assim, você também pode andar com Deus em nosso tempo. 

É bem possível que você não seja trasladado como Enoque foi; isso, provavelmente não acontecerá com você. Mas, é bem possível que sua vida seja um exemplo para muitos, como Enoque foi para sua geração e as futuras. Os efeitos da santidade na vida de alguém perduram por gerações e gerações. Os frutos ainda são colhidos mesmo depois da morte da pessoa que andou com Deus. 

Isso significa que, mesmo depois de sua morte, seu testemunho e história ainda podem continuar a abençoar e influenciar a vida de muitas e muitas pessoas. 

Que você e eu possamos olhar para a vida de Enoque e concluirmos que não há nada melhor do que escolhermos por esse caminho para viver: andando com Deus.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Cristãos em Mundos Paralelos

Uma das características dos movimentos pentecostais é sua enorme preocupação com a vida após a morte e com o julgamento final que Deus trará sobre as nações. Isso se manifesta constantemente nas diversas pregações, bem como nos diversos cânticos que compõem os cultos pentecostais, de maneira que é muito difícil ir a alguma igreja desse movimento e não ouvir esse tipo de discurso. 

Como consequência, a preocupação a respeito da vida espiritual se torna imprescindível para toda pessoa que se diz fiel à proposta cristã. Essa vida deve ser cuidada, alimentada, provada, devendo também resistir às tentações enviadas pelo diabo para que não se caia nelas, a fim de não comprometer a santidade que se deve manter diante de Deus. Santidade essa, que é garantidora de que, no julgamento final, tal pessoa receberá o galardão como recompensa da vida que viveu na Terra, dando testemunho a respeito de Cristo. 

O testemunho, por sua vez, deve se manifestar por meio das atitudes de santidade e posturas condizentes com uma suposta postura que se acredita que Jesus teria, o que, na maioria das vezes e de forma errônea, recai sobre questões de usos e costumes e questões de cunho moral fundamentalista. Com isso, não é de se espantar que na maioria das igrejas pentecostais brasileiras se encontrem pessoas que acreditam na literalidade do texto bíblico, pregando essa literalidade como justificativas para pautas morais conservadoras. Sob o discurso do “Está escrito” e “Deus disse em sua Palavra” condenam tudo aquilo que foge de uma moral puritana, colocando essa moral como consequência da vida em santidade e a santidade como espelho dessa vida moral. Com isso, percebe-se um círculo vicioso: é preciso estar em santidade, mas essa santidade é percebida por meio do conservadorismo moral, que por sua vez, leva à santidade requerida por Deus. 

Diante desse círculo, que nasce com uma preocupação a respeito da vida espiritual santa que se deve ter, não é difícil encontrar pessoas cristãs vivendo em mundos paralelos, como se existisse um mundo espiritual, com suas regras, moralidade etc., e um mundo físico, no qual se trabalha e vive o cotidiano, sendo o primeiro mais importante do que o segundo, uma vez que o mundo do cotidiano é visto por muitos como somente uma fase que precisa se passar para atingir o tão esperado céu. 

Essa postura, no entanto, mostra-se como extremamente perigosa e como um banquete para charlatões da fé que desejam manter o seu domínio sobre as pessoas que não tem conhecimento sobre a fé cristã e que acreditam que o pastor, a pastora ou o padre são as vozes de Deus no mundo. Sob o discurso de que são enviados por Deus e devem ser seguidos sem questionamentos, visto estes serem indícios de falta de fé, os/as charlatões induzem seus fieis a não se preocuparem com as questões políticas, sociais, econômicas e culturais da sociedade em que vivem, por considerá-las como “coisas do mundo” que devem ser rejeitadas e são empecilhos para a vida em santidade requerida por Deus. 

O discurso de preocupação com a vida espiritual, dessa forma, gera cristãos e cristãs apáticos e que não se envolvem com a sociedade visando sua transformação estrutural. No lugar, acreditam que Deus está preocupado com pautas morais e que são elas as garantidoras de que Jesus está sendo pregado e compreendido. Esquecem-se de que Jesus foi um péssimo exemplo de moral na sua sociedade, condenado justamente pelos líderes religiosos do seu tempo que viam nele um “glutão e bebedor de vinho”, e alguém que “caminha com pecadores e come com eles”. 

O Reino de Deus pregado por Jesus não tem a ver com pautas morais e listas de pode e não pode. Muito pelo contrário, tem a ver com a luta pela justiça para com os injustiçados, pelo direito dos pobres, pela igualdade social e pelo amor caridoso e fraterno entre irmãos e irmãs, uma vez que todos e todas são filhos e filhas do mesmo Deus. 

Em Jesus se percebe que não há vida espiritual que não seja também mundana e que não toque a realidade do mundo visando sua transformação estrutural. Todo discurso que visa somente uma preocupação com a vida pós-morte se mostra como ameaça ao testemunho de Cristo e do anúncio do Reino de Deus que há de vir. 

O chamado de Cristo nunca foi para se viver num mundo paralelo e a pregação de Jesus mostra que nunca foram pautas morais as definidoras de santidade e comunhão com Deus. Muito pelo contrário, é o amor dedicado a cada um e cada uma que mostra que somos discípulos e discípulas de Jesus, de maneira que não há lista de pode e não pode, mas, como diz Agostinho, deve-se amar a Deus e fazer o que se quiser fazer, justamente por ser o amor a medida cristã de todas as coisas. Fabrício Veliq é protestante e teólogo. Doutor em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE), Doctor of Theology pela Katholieke Universiteit Leuven (KU Leuven), Bacharel em Filosofia (UFMG). 

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

A Fé e a Ciência

Enquanto o livro de Hebreus nos diz que a fé é a prova das coisas que não vemos e a certeza daquilo que esperamos, por definição, a ciência é exatamente o oposto disso. 
A ciência é a prova das coisas que são vistas, tocadas, manuseadas, observadas, documentadas, quantificadas e medidas. 

A ciência trabalha com o sensível. Os cientistas sempre dizem que só acreditam naquilo que veem, que tocam. O desconhecido para a ciência não existe. A ciência é orgulhosa. Ela tem um complexo tão grande porque não sabe criar a vida, e nem saberá nunca. É preciso mais fé para acreditar na ciência, do que na existência de adão e Eva. (Ariano Suassuna)

Ao contrário da ciência, a fé não precisa de provas. A fé consiste em acreditar naquilo que não vemos. Então, se é para acreditar naquilo que não vemos, não tocamos, há como questioná-la? 

A arma da ciência, só se manifesta em longo prazo: ao longo dos anos, ela vai explicando o universo e as coisas de forma lógica e racional em vez de atribuí-las a fenômenos sobrenaturais, enquanto a Espada do Espírito, segundo Romanos 1,17, diz: “Porque nele se descobre a justiça de Deus de fé em fé, como está escrito: Mas o justo viverá da fé”. 

A fé é representada por uma espada, mas não foi feita para apresentação em um dia de gala, nem para ser usada em ocasiões solenes, nem para ser exibida em um desfile. É uma espada que foi feita para cortar, ferir e matar. E aquele que a tem empunhado pode esperar, entre aqui e o céu, que saberá o que significa a batalha. 

Enquanto a função dos cientistas são fabricantes de mapas do mundo físico, nenhum mapa diz tudo o que poderia ser dito sobre um terreno particular, mas em uma determinada escala pode fielmente representar a estrutura existente. No sentido de uma verosimilitude crescente, de aproximações cada vez melhores da verdade sobre a matéria, a ciência proporciona um domínio cada vez mais firme da realidade física (John Polkinghorne)

A missão do cristão e da fé é explicada pelas Sagradas Escrituras: são testemunhas de fé de mapas do mundo espiritual. A fé revela tudo o que existe e é verdade nesse mapa espiritual: 

“E levou-me em espírito a um grande e alto monte, e mostrou-me a grande cidade, a santa Jerusalém, que de Deus descia do céu. E tinha a glória de Deus; e a sua luz era semelhante a uma pedra preciosíssima, como a pedra de jaspe, como o cristal resplandecente. E tinha um grande e alto muro com doze portas, e nas portas doze anjos, e nomes escritos sobre elas, que são os nomes das doze tribos dos filhos de Israel. Do lado do levante tinha três portas, do lado do norte, três portas, do lado do sul, três portas, do lado do poente, três portas. E o muro da cidade tinha doze fundamentos, e neles os nomes dos doze apóstolos do Cordeiro”. Apocalipse 21,10-14. 

Se o mundo visível foi formado a partir de materiais que foram objetos de observação humana, não haveria espaço para a fé; a ciência poderia apenas ter traçado de volta à sua origem. Conclui-se que de acordo com hebreus 11,3: 

“Pela fé compreendemos que o Universo foi criado por intermédio da Palavra de Deus e que aquilo que pode ser visto foi produzido a partir daquilo que não se vê”. 

O tempo iria nos faltar para dizer dos poderes, dos privilégios, das posses e das perspectivas da fé. Para a fé, acreditar é uma graça de Deus, porque se Deus também não ajudar, também não iríamos acreditar. Temos que cooperar com a graça de Deus. Aquele que a possui é abençoado. 

A fé é certa, mais certa que qualquer conhecimento humano, porque se funda na própria Palavra de Deus, que não pode mentir. 

O motivo de crer não é o fato de as verdades reveladas aparecerem como verdadeiras e inteligíveis à luz da nossa razão natural. Cremos por causa da autoridade do próprio Deus revelador, que não pode enganar-se nem nos enganar. Contudo, para que a homenagem da nossa fé fosse conforme à razão, Deus quis que os auxílios interiores do Espírito Santo fossem acompanhados de provas exteriores da sua Revelação. 

Assim, os milagres de Cristo e dos homens, as profecias, a propagação e a santidade da Igreja, a sua fecundidade e estabilidade são sinais certos da Revelação, adaptados à inteligência de todos, motivos de credibilidade, mostrando que o assentimento da fé não é, de modo algum, um movimento cego do espírito. 

Muito embora a fé esteja acima da razão, nunca pode haver verdadeiro desacordo entre ambas: o mesmo Deus, que revela os mistérios e comunica a fé, também acendeu no espírito humano a luz da razão. E Deus não pode negar-Se a Si próprio, nem a verdade pode jamais contradizer a verdade. 

É por isso que a busca metódica, em todos os domínios do saber, se for conduzida de modo verdadeiramente científico e segundo as normas da moral, jamais estará em oposição à fé: as realidades profanas e as da fé encontram a sua origem num só e mesmo Deus. (Catecismo da Igreja Católica – 156-159).

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Banalização da vida e da morte.

A banalização do Evangelho, do sagrado, da graça, do pecado, do mal, da morte da cruz (a cruz de Cristo temida, proibida, banalizada, porém triunfante!).

Quando a morte se impõe... Ah, morte! Ela geralmente arranca uma parte de nosso ser. O próprio Deus humanizado não se contém diante do sofrimento alheio. Ao ver Marta e Maria chorando pela morte do irmão, Lázaro, Jesus também se comove. 

Com milhares de pessoas morrendo ao redor do mundo, a morte ficou banalizada. Trata-se da própria desumanização das relações e das ações sociais. A pandemia está banalizando a morte. A morte durante o coronavírus virou algo tão rotineiro que não se pensa mais nela como algo dolorido e triste, mas como números. Porém, somos mais que números. Números são vidas que se vão. São novos tempos muito ruins e estão morrendo tantas pessoas que não percebemos a dor dos outros. Temos que olhar para o próximo para entender que quem você ajuda hoje pode ajuda-lo amanhã. A morte causa dor e essa não pode ser banalizada. 

A vida e a morte são tratadas como coisas meramente descartáveis e funcionais. Um dos perigos com consequências mais letais para a vida cristã é a banalização. Banalizar é transformar valores em coisas triviais, é a vulgarização do que é importante e o esvaziamento das coisas significativas. 

A prova da banalização da morte é que não nos escandalizamos com ela. É a banalidade da morte, no país em que há 150 homicídios por dia, em média, segundo números oficiais. E a prova da banalização é que não nos escandalizamos com isso. Tem gente que cruza com um corpo logo pela manhã a caminho do trabalho e já acha isso normal; outros que nem se interessam mais pelas notícias policiais dos jornais que de tão recorrentes parecem até repetidas. Nós, brasileiros, é que deveríamos nos chocar com a notícia. Deveríamos nos chocar porque os crimes violentos estão se tornando cada vez mais banais no Brasil. 

O que torna as pessoas insensíveis, como ocorre no Brasil atual, onde a dor dos outros não importa? Mortes no trânsito, mortes com motos, homicídios, o quadro é bastante dramático. Violência física, violência psíquica, violência encoberta. Uma espécie de conformismo com a brutalidade das cenas, dos choques e das informações. O mal está enraizado. 

A banalização da morte é a decadência de qualquer civilização. É doloroso saber que muitos não se importam com o extermínio de centenas de jovens numa universidade no Quênia; ou que sejam assassinadas centenas de pessoas inocentes no Iraque e na Síria; ou que uma adolescente seja espancada e queimada viva em frente a uma multidão ávida por sangue na Guatemala; ou que milhares de pessoas morram no Nepal, na Índia, na China ou em qualquer lugar distante que nem nos interessa. Banalizamos a vida dos desconhecidos, contanto que o nosso círculo de conhecidos viva para sempre! 

Nesse final dos tempos, nosso olhar de tanto ver cenas chocantes de violência, degradação moral, assaltos, calamidades, escândalos, corrupção, tragédias, guerras e mortes repetidas à exaustão tem nos embrutecido a tal ponto de julgá-las como fatos corriqueiros que pouco desperta nosso sentimento de benignidade. Jesus disse que no fim dos tempos o amor de muitos se esfriaria e na sua segunda vinda encontraria fé na terra? 

“Ai dos que chamam ao mal de bem e ao bem de mal, que fazem das trevas luz e da luz, trevas, do amargo, doce e do doce, amargo.” Is. 5,20. 

Jesus, morreu na cruz derramando o Seu sangue precioso para nos resgatar do império das trevas e nos fazer andar definitivamente no caminho santo. Fomos salvos pela obra redentora de Jesus. É a morte da nossa morte espiritual na morte de Jesus. Jesus matou a morte!

A banalização da cruz minimiza o significado da morte de Jesus e da sua ressurreição que nos dá a vida eterna. Sem amor: destruição da civilização; sem fé: perdição eterna. 

A nossa sociedade banaliza tudo o que pode. Vulgariza a sexualidade, coisifica o corpo humano, faz comédia da tragédia, abranda as consequências dos atos malsãos e trata com leviandade tanto a vida como a morte. 

Afinal, o que é o pecado, para que tão grande sacrifício fosse exigido para salvar a sua vítima? Acaso foi preciso todo esse amor, todo esse sofrimento, toda essa humilhação para que não perecêssemos, mas tivéssemos a vida eterna? 

“Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo.” (1Pe 1:18-19) 

O fato de ter Cristo dado a sua vida em lugar do pecador, não é assunto para ser tratado com leviandade. Não é fácil confiar em alguém a quem nunca se viu no que tange ao assunto mais importante de nossa vida, nosso destino eterno. Mas esta, e somente esta, é a condição, a maneira pela qual somos salvos. 

É nosso dever como povo de profetas não banalizar a violência, a iniquidade e a injustiça e jamais fazer escolhas fáceis, populistas ou passionais. É nosso dever não fazer pilhéria e gracejo de nossas tragédias de cada dia. É nossa vocação demonstrar que o Reino, ainda que provisório já chegou e pede passagem e com ele a Justiça e a Paz querem se instalar no meio de todos os homens. 

O Reino dos céus é dos que choram, dos pobres em espírito, dos humildes e dos perseguidos por causa da justiça. Podemos até mesmo afirmar que o Reino dos céus pertence aos fracos e desvalidos deste mundo.

O Reino dos Céus é o contrário das coisas supérfluas que o mundo oferece, é o contrário de uma vida banal: é um tesouro que renova a vida a cada dia e a expande em direção a horizontes mais amplos.

O escândalo da morte torna-se banal. Nós estamos banalizando a morte. Eu sou contra a pessoa atropelar o direito do próximo. A morte não é a maior perda da vida. A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos. (Pablo Picasso).

Fontes de Pesquisa:

GAJOP (Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares), 1991. Grupos de Extermínio — A Banalização da Vida e da Morte em Pernambuco. Olinda: Gajop/Centro Luiz Freire. 

Século diário; 

A 12 – Redação

sábado, 6 de fevereiro de 2021

Plenitude dos Tempos


O homem se perdeu desde o jardim do Éden, e aquele que está perdido busca um caminho, busca ser achado. O Filho de Deus, Jesus, não veio para ser um grande mestre, um fundador de religião nem somente operar sinais, prodígios e maravilhas, mas para buscar o que se perdeu. Jesus é a resposta para as perguntas que gritam do coração de quem ainda não o conhece: “Quem sou, de onde vim, para onde vou?”

O Salvador veio na plenitude do tempo. Diz Agostinho de Hipona: ‘Muitos se perguntam por que Cristo não veio antes. É que a plenitude do tempo ainda não havia chegado, de acordo com a disposição d’Aquele por quem todas as coisas foram feitas no tempo. Assim que chegou a plenitude do tempo, veio Aquele que devia nos libertar do tempo. Uma vez libertos do tempo, chegaremos a essa eternidade em que o tempo terá desaparecido’. 

"Plenitude dos tempos" significa a época em que a espera e a preparação da salvação dos homens fixada por Deus, está totalmente cumprida. Assim, depois de milhares de anos de promessas, de figuras e de profecias, a terra ouviu este feliz anuncio de João Batista: "Eis o cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo" (Jo 1, 29). 

Deus enviou o Seu Filho Jesus quando chegou a hora certa, no exato momento que havia designado. Este é o sentido mais simples que podemos atribuir a essa expressão. Deus preparou, ao longo dos séculos, todo um cenário para que Seu Filho nascesse. Preparou todo um ambiente, um momento histórico, que favoreceu de modo singular a expansão da fé cristã por todo o mundo. 

Plenitude dos tempos é como uma janela no tempo, onde Deus inseriu Seu Filho no mundo para resgatar a humanidade. Para isso, teve que preparar a humanidade para receber Seu Filho. Deus trabalhou nas civilizações, através da arquitetura, língua, política, filosofia, escrita, direito e assim por diante... 

“Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei”. Gálatas 4, 4. 

A Palestina onde o cristianismo deu seus primeiros passos possuía uma posição geográfica privilegiada pois ocupava uma área onde era a encruzilhada das grandes rotas comerciais que uniam o Egito à Mesopotâmia, e a Arábia com a Ásia Menor. 

Por isso vemos na história descrita no Velho Testamento esta área tão cobiçada, sendo invadida por vários impérios. 

O judaísmo era diferente da maioria das religiões, pois se baseava no monoteísmo. Tinha uma forte esperança na vinda do messias. Um sistema moral que contrastava com as diversas religiões possuidoras de deuses adúlteros, fornicários, assassinos, cheios de vícios e carnalidades. A formação do Antigo Testamento já estava concluída e o judaísmo acreditava no desenvolvimento teocrático da história. Além das sinagogas serem escolas de ensino e divulgação da Palavra. 

A língua predominante na época era o grego. Uma língua universal, apesar do império dominante ser o império Romano, que unia em um só governo boa parte do mundo conhecido. Era um governo pacífico (Pax Romana) e próspero e suas cidades estavam em progresso e viajar não era mais difícil pois muitas estradas foram construídas. Os povos vencidos desacreditaram em seus deuses e necessitavam de substitutos que viriam não do poder opressor romano. 

Apesar de haver muitas religiões e filosofias (a política dos romanos era, em geral, tolerante em relação a religião e aos costumes dos povos conquistados), os gregos e os romanos estavam preocupados com a busca da verdade, as filosofias estóica e epicurista deu aos povos helenizados uma aspiração abstrata pelo Ser e o cristianismo veio preencher esse vazio espiritual com um Deus pessoal e salvador. Assim, o mundo estava pronto para a recepção de uma nova religião. 

Jesus nasceu dentro deste contexto e que biblicamente se conhece como "plenitude dos tempos". A igreja, respondendo às ansiedades da época com a revelação de Deus em Jesus, conseguiu rapidamente conquistar o Império. 

A "plenitude do tempo" não quer dizer que o mundo estivesse pronto a se tornar cristão, mas quer dizer que, nos desígnios de Deus, havia chegado o momento de enviar o seu filho ao mundo. 

À doença universal, forneceu um remédio universal, o que faz Agostinho dizer: ‘Então chegou o grande médico, quando todo o universo era um grande enfermo’ (JACOPO DE VARAZZE. Legenda Áurea – Vidas de Santos. Cia. das Letras – São Paulo, 2003, p. 48). 

Com essas indicações, fica mais fácil de entender a demora da vinda do Messias, sobretudo se considerarmos o que diz Gregório de Nissa (330-395), respeitado comentador das Sagradas Escrituras: 

“Eis a razão por que o Divino Médico não aplicou o seu tratamento ao mundo imediatamente após o ciúme de Caim e o assassínio de Abel, seu irmão. […] Foi quando o vício atingiu o seu auge e não restava nenhuma perversidade que os homens não tivessem ousado, que Deus começou a tratar a doença. Não no seu início, mas no seu desenvolvimento pleno. Desse modo, o tratamento divino pôde abarcar todas as enfermidades humanas” (Grande Catequese, 29-30). 

A conversão é condição para ingressar nos tempos novos. A conversão (“Tesubá” ou “Metanoia” – mudanças de mentalidade) é uma volta ao original, a primeira vontade de Deus. 

Com a proclamação de um novo Reino disponível a todos, o tempo messiânico está presente e o seu passaporte de entrada é o arrependimento. 

Chegou ao fim a longa espera da humanidade pelo Messias. Acabou no tempo do Senhor o fim da gloriosa espera. 

“Arrependei-vos, porque está próximo o Reino dos céus”. (Mateus 3:1-3). 

O divino Redentor demorou a sua vinda milhares de anos, não somente para que fosse mais apreciada pelos homens, senão também para que melhor se conhecesse a malícia do pecado e a necessidade do remédio. 

Nessa época, o mundo estava mergulhado nas trevas. Era possível ver claramente como a vinda do Salvador era necessária para remediar isso. Na sombra das trevas, era preciso que viesse a Luz das Nações, Cristo. Nosso Senhor nasce no meio da noite, da escuridão, para dissipá-la. Por outro lado, vários elementos favoreciam essa vinda porque facilitavam a difusão da doutrina de Cristo de modo ordenado. 

Nosso Senhor vem ao mundo na plenitude dos tempos. Não convinha, de fato, que o Verbo se encarnasse logo depois do pecado original. Se Ele tivesse feito assim, a humanidade daria pouquíssimo valor ao Redentor, sem perceber a gravidade do pecado e sem perceber a necessidade que tem do Salvador. Não convinha, por outro lado, que o Verbo se encarnasse próximo ao fim do mundo, pois os homens poderiam cair em desespero. 

O Verbo encarnou-se, então, na plenitude dos tempos, no momento conveniente, para mais favorecer a nossa salvação. É Deus o Senhor da história, que dispõem todas as coisas de maneira suave e forte de acordo com a sua Sabedoria infinita, que dispõe mesmo o emaranhado dos episódios históricos.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

Deus e o tempo

Mas, quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido debaixo da Lei. (Gl. 4.4) 
É dito que o patriarca Abraão invocou o nome de El Olam, o Deus Eterno. Embora Deus esteja acima do tempo, é no tempo que sua mão entra para operar e trazer para nós redenção. 

Foi dentro do tempo que Jesus entrou e se fez homem. As marcas dos seus passos ficaram na história e na história também ficou seu sangue derramado. E na história aconteceu sua vitória sobre a morte. Não é o tempo uma limitação de Deus, mas é uma limitação nossa e de tudo o que nos envolve. 

Dê tempo para Deus. Mesmo o Eterno age neste nosso mundo dentro dos limites de nossos calendários e relógios. Os planos de Deus em nossa vida não podem se cumprir de uma só vez. Não suportaríamos se tudo fosse dito e feito em um único momento. Suas sementes em nossa vida levarão tempo para germinar, brotar e dar fruto. 

Com certeza Jesus ainda tem muitas coisas para falar ao seu coração. Mas como Ele disse aos discípulos, naquele momento eles ainda não eram capazes de suportar e por isso só lhes seria falado depois. Ele não terminou a obra que começou a realizar em sua vida, mas com certeza Ele a completará até o dia de Jesus Cristo. Aliás, nem o que Ele está fazendo hoje você está compreendendo, mas você entenderá depois. 

Nossa pressa, nossa ansiedade, nossa humanidade não nos permitem ver as coisas como Deus vê. Nem Abraão no deserto, nem José na prisão, nem Davi na caverna entendiam a contradição entre as promessas de Deus e a situação na qual viviam. Entretanto, quando a plenitude dos tempos chegou para eles, foram capazes de perceber que vale a pena esperar no Senhor e confiar em Sua fidelidade. 

Enquanto o tempo corre, Deus corre com ele. Ele jamais para, jamais cansa, jamais desiste. Ele trabalha para aquele que Nele espera. Então aguarde. Deus não esqueceu você. E a plenitude do tempo lhe mostrará isso claramente.