sexta-feira, 20 de março de 2020

O que Martinho Lutero nos Ensina Sobre o Coronavírus



Uma reflexão pastoral sobre epidemias, escrita pelo reformador alemão, pode orientar estudantes de medicina como eu e cristãos na China — e em todos os lugares por onde o vírus tem se espalhado. Do seu epicentro em Wuhan, na China, o atual surto de coronavírus está fomentando o medo e impactando viagens e negócios mundo afora. Somente na China 3,000 pessoas já morreram e mais de 95.000 foram infectadas em cerca de 75 países — número maior que a epidemia de SARS em 2003.

Os moradores de Wuhan, uma importante cidade tão populosa quanto Chicago, nos EUA, estão sob bloqueio do governo e atividades públicas foram suspensas, inclusive as celebrações do Ano Novo Chinês (que começou em 25 de janeiro). Cristãos chineses, em Wuhan e na China em geral, têm enfrentado decisões difíceis, como se devem voltar para casa para visitar a família (semelhante a milhões de chineses durante o feriado do Ano Novo Lunar), deixar a área continental, ou até mesmo se devem se reunir para os cultos de domingo.

Mas os seguidores de Jesus estão certos em fugir de uma epidemia enquanto pessoas estão sofrendo ou morrendo? Cristãos alemães no século XVI fizeram essa mesma pergunta ao teólogo Martinho Lutero.

Em 1527, menos de 200 anos após a Peste Negra ter dizimado metade da população da Europa, a praga ressurgiu na própria cidade de Lutero, Wittenburg, e em cidade vizinhas. Em sua carta “Se Alguém Deve Fugir de uma Praga Mortal”, o famoso reformador reflete sobre as responsabilidades do cidadão comum durante um contágio. Seus conselhos servem como um guia prático para cristãos enfrentando o problema de surtos contagiosos em nossos dias.

Em primeiro lugar, Lutero argumenta que qualquer pessoa que tenha uma relação de serviço com o próximo tem a responsabilidade vocacional de não fugir. Os que estão no ministério, escreveu ele, “devem permanecer firmes diante do perigo da morte”. Os doentes e moribundos precisam de um bom pastor que os fortaleça, conforte e administre os sacramentos — para que não lhes seja negada a Eucaristia antes de sua morte. Oficiais públicos, incluindo prefeitos e juízes, devem permanecer e manter a ordem pública.
Os funcionários públicos, incluindo médicos e policiais, devem continuar seus deveres profissionais. Até os pais e responsáveis têm deveres vocacionais em relação aos filhos.

Lutero não limitou o cuidado dos doentes aos profissionais de saúde. Numa época em que Wuhan enfrenta uma escassez de leitos e pessoal hospitalar, seu conselho é especialmente relevante. A cidade, uma das maiores da China, com uma população de cerca de 11 milhões, está em processo de construção rápida de dois novos hospitais para acomodar uma crescente multidão de pacientes com coronavírus. Os cidadãos leigos, sem qualquer treinamento médico, podem encontrar-se em condições de prestar assistência aos doentes. Lutero desafia os cristãos a ver oportunidades de cuidar dos doentes como se estivessem cuidando do próprio Cristo (Mt 25: 41–46). Do amor a Deus emerge a prática de amar ao próximo.

Mas Lutero não incentiva seus leitores a se exporem de forma imprudente ao perigo. Sua carta aborda constantemente dois temas concorrentes: honrar a santidade da própria vida e honrar a santidade dos necessitados. Lutero deixa claro que Deus dá aos seres humanos uma tendência à autoproteção e confia que eles cuidarão de seus corpos (Ef 5:29; 1 Cor. 12: 21–26). “Todos nós”, diz ele, “temos a responsabilidade de afastar esse veneno da melhor maneira possível, porque Deus nos ordenou que cuidássemos do corpo”. Ele defende medidas de saúde pública, como quarentenas, e a procura a atendimento médico quando disponível. De fato, Lutero propõe que não fazer isso é agir de forma imprudente. Assim como nossos corpos são dádivas de Deus, também são os remédios disponíveis no mundo.
E se um cristão ainda assim deseja fugir? Lutero afirma que essa pode ser, realmente, a resposta fiel do crente, desde que seu próximo não esteja em perigo imediato e que haja outros que “cuidem e acolham os doentes em seu lugar”. Notadamente, Lutero também lembra aos leitores que a salvação é independente dessas boas obras. Em última análise, ele ordena que “cristãos devotos … cheguem à sua própria decisão e conclusão”, quer fujam ou permaneçam durante epidemias, confiando que eles chegarão a uma decisão fiel através da oração e meditação nas Escrituras. Participar na obra de cuidar do doente surge da graça, não da obrigação.
No entanto, o próprio Lutero não teve medo. Apesar das admoestações de seus colegas da universidade, ele permaneceu para ministrar aos doentes e moribundos. Ele urge seus leitores a não terem medo de “uma pequena fervura” no serviço ao próximo.
Apesar dos filhos de Deus enfrentarem sofrimentos aqui na terra, todos os que professam a fé em Cristo compartilham a promessa celestial de um dia serem livres da doença e do sofrimento. Numa carta aberta em que pede a oração de cristãos de todo o mundo, um pastor anônimo de Wuhan afirma que “a paz de Cristo não consiste em nos tirar do desastre e da morte, mas em ter paz diante do desastre e da morte, pois Cristo já venceu essas coisas.” Tanto Lutero quanto o pastor anônimo de Wuhan expressam a realidade do sofrimento, mas reconhecem que a palavra final não pertence à morte ou ao sofrimento.

Essa semana meus avós na China me enviaram uma mensagem dizendo que estão bem, mas que estão “vivendo como ratos” em seu apartamento, saindo apenas quando necessário. Coincidentemente, 2020 é o Ano do Rato no zodíaco chinês — justamente o animal portador de pulgas que causaram diversas pestilências por toda a Europa no século XIV. Meus avós vivem na província de Sichuan, a oeste de Wuhan, onde mais de 100 casos de coronavirus já foram confirmados. É impossível não pensar neles nesse momento, assim como meus outros familiares que atualmente moram na China. Na esperança de enviá-los máscaras que estão esgotadas em muitas lojas na Ásia, meus pais e eu descobrimos essa semana que até mesmo nos Estados Unidos as lojas já não têm mais máscaras.

Nessa atmosfera de medo em volta do surto, me volto à carta de Lutero para me orientar. Como estudante de medicina e futura médica, tenho um compromisso vocacional de cuidar dos doentes — sejam eles acometidos pelo coronavirus, tuberculose ou influenza. Sim, tomarei precauções. Mas Lutero me lembra que, independente de qualquer coisa, são pessoas que merecem cuidado.

“Quando te vimos doente?” perguntam os justos na parábola das ovelhas e dos cabritos, e Jesus responde, “Sempre que o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes” (Mt. 25: 39,40). Se e quando o coronavirus invadir nossas comunidades, como responderemos fielmente?

Emmy Yang é pesquisadora em Teologia, Medicina e Cultura na Duke Divinity School e estudante de medicina na Icahn School of Medicine no complexo hospitalar Mount Sinai.

terça-feira, 17 de março de 2020

Porto Seguro ou Kit de Emergência?

Alguns norte-americanos encontraram certa segurança contra o coronavírus com o estoque de álcool gel e papel higiênico. Para outros, a paz é conseguida com a compra de uma bolsa de emergência de US$ 4.995 equipada com dispositivos ao estilo James Bond e monograma personalizado. Ou um purificador de ar pessoal de "eliminação de vírus" de US$ 149,95, usado como um colar. Ou o produto "Safe Heaven", um saco para dormir por US$ 99,95 feito de tecido antimicrobiano patenteado que mata quase 100% de bactérias, fungos e vírus. 

Esses itens fazem parte de uma série de produtos de sobrevivência que flutuam no extremo rarefeito do mercado de bem-estar, que movimenta US$ 4,5 trilhões. Com a propagação da pandemia, esses produtos estão esgotados, com pedidos pendentes ou em falta no estoque. Assim como o papel higiênico. Ter as ferramentas e suprimentos certos pode proporcionar um alívio incrível da ansiedade.

Contudo, quando a época parece lembrar o pôr-do-sol, existe um raio de esperança: as misericórdias de Deus não têm fim - “O Senhor é bom, um refúgio em tempos de angústia. Ele protege os que nEle confiam.” (Naum 1,7). 

Acredite ou não, cada um de nós está construindo algo sobre algum tipo de alicerce. Nós temos sempre algum tipo de fundação, algo em que estamos colocando a nossa esperança e fé. Talvez esse alicerce seja nós mesmos: “Eu sei que posso fazer da minha vida um sucesso se eu der duro o bastante…”; um estilo de vida: “Se eu puder ganhar bastante dinheiro, a vida será maravilhosa”; um outro trabalho: “É hora de mudanças.”; ou o kit de segurança...”. Algumas pessoas se sentem seguras por serem filhas de um multimilionário, e podem adquirir um kit de sobrevivência. 

Mas Deus tem um ponto de vista diferente. Ele diz que colocar a nossa esperança e fé em nós mesmos, em outras pessoas, ou em qualquer outra coisa que o mundo oferece é alicerçar uma construção num terreno instável. 

Ele quer, pelo contrário, que confiemos NEle, pois diz: “Portanto, quem ouve estas minhas palavras e as pratica é como um homem prudente que construiu a sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, e ela não caiu, porque tinha seus alicerces na rocha. Mas quem ouve estas minhas palavras e não as pratica é como um homem insensato que construiu a sua casa sobre a areia. Caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, e ela caiu. E foi grande a sua queda.” (Mateus 7:24-27). 

Essa é a mensagem de Jesus para o mundo neste momento da história, sob o coronavírus – uma mensagem para todo ser humano. Eu e você, e todos que estão lendo, e todos os governantes do planeta, todas as pessoas que leem sobre isso, estão recebendo uma mensagem de Deus com trovoada, dizendo: “Arrependam-se”!

Rugirá o leão no bosque, sem que tenha presa? Levantará o leãozinho no seu covil a sua voz, se nada tiver apanhado? Cairá a ave no laço em terra, se não houver armadilha para ela? Levantar-se-á da terra o laço, sem que tenha apanhado alguma coisa? Tocar-se-á a trombeta na cidade, e o povo não estremecerá? Sucederá algum mal na cidade, sem que o Senhor o tenha feito? Certamente o Senhor DEUS não fará coisa alguma, sem ter revelado o seu segredo aos seus servos, os profetas. Rugiu o leão, quem não temerá? Falou o Senhor DEUS, quem não profetizará? Amós 3:4-8

"Por isso também vos dei limpeza de dentes em todas as vossas cidades, e falta de pão em todos os vossos lugares; contudo não vos convertestes a mim, disse o Senhor. Além disso, retive de vós a chuva quando ainda faltavam três meses para a ceifa; e fiz que chovesse sobre uma cidade, e não chovesse sobre a outra cidade; sobre um campo choveu, mas o outro, sobre o qual não choveu, secou-se. E andaram errantes duas ou três cidades, indo a outra cidade para beberem água, mas não se saciaram; contudo não vos convertestes a mim, disse o Senhor. Feri-vos com queimadura, e com ferrugem; a multidão das vossas hortas, e das vossas vinhas, e das vossas figueiras, e das vossas oliveiras, comeu a locusta; contudo não vos convertestes a mim, disse o Senhor. Enviei a peste contra vós, à maneira do Egito; os vossos jovens matei à espada, e os vossos cavalos deixei levar presos, e o mau cheiro dos vossos arraiais fiz subir às vossas narinas; contudo não vos convertestes a mim, disse o Senhor. Subverti a alguns dentre vós, como Deus subverteu a Sodoma e Gomorra, e vós fostes como um tição arrebatado do incêndio; contudo não vos convertestes a mim, disse o Senhor. Portanto, assim te farei, ó Israel! E porque isso te farei, prepara-te, ó Israel, para te encontrares com o teu Deus". Amós 4:6-12

É sábio ter Deus envolvido nas nossas vidas naqueles momentos quando as catástrofes vêm. Mas a intenção dEle é que tenhamos uma vida mais plena, não importando quais sejam as circunstâncias. Ele quer ter uma influência positiva em cada área de nossas vidas. Quando nos apoiamos nEle e nas suas palavras, estamos construindo sobre a Rocha. 

Deus é poderoso. Diferente de nós, Deus sabe o que vai acontecer amanhã, na próxima semana, na próxima década. Ele diz: “Eu sou Deus, e não há nenhum como eu. Desde o início faço conhecido o fim.” (Isaías 46:9-10). Ele sabe o que vai acontecer e estará lá por nós quando acontecer, se escolhemos incluí-lo na nossa vida. Ele diz que pode ser “nosso refúgio e a nossa fortaleza, auxílio sempre presente na adversidade.” (Salmos 46:1) Mas devemos fazer um esforço sincero em buscá-lo. Ele diz: “vocês me procurarão e me acharão quando me procurarem de todo coração.” (Jeremias 29:13).

Isso não quer dizer que aqueles que conhecem a Deus não passarão por momentos difíceis. Eles irão passar. Se um país sofrer ataques terroristas, pestes, aqueles que conhecem a Deus estarão incluídos no sofrimento. Mas existe uma paz e uma força que só a presença de Deus dá. Um seguidor de Jesus Cristo disse da seguinte maneira: “De todos os lados somos pressionados, mas não esmagados; ficamos perplexos, mas não desesperados; somos perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não destruídos.” (2 Coríntios 4:8-9). 

A realidade nos diz que enfrentaremos problemas. Porém, se passarmos por eles tendo um relacionamento com Deus, podemos reagir a eles com uma perspectiva diferente e com uma força que não é a nossa. 

Nenhum problema é insuperável para Deus. Ele é maior do que qualquer problema que possa nos alcançar, e nós não estamos sozinhos para lidar com eles. 

A única segurança é ter um relacionamento com Deus. Deus sabe disso, por isso Ele providenciou uma solução para o problema da nossa separação dEle. Ele preparou um caminho para que nós encontrássemos o nosso caminho de volta pra Ele…através de Jesus Cristo. Nossa segurança é Jesus, o Filho de Deus, e oferece gratuitamente o seu kit de proteção: amor, perdão, segurança, apoio, conforto, aceitação e um propósito para viver. Ele é a nossa força, o nosso remédio. 
Com Deus envolvido nas nossas vidas, podemos descansar facilmente. Assim que começamos a conhecer Deus e a ouvir o que Ele diz na Bíblia, Ele nos traz segurança; podemos colocar a nossa esperança NEle como algo constante. Deus está esperando para nos dar provas de Si se nos voltarmos para Ele e O buscarmos. 

A falta de segurança resulta simplesmente de uma ausência de Deus nas nossas vidas. 
Deus tem muito cuidado por seu povo e não tolerará indefinidamente essa situação. Misericórdia é oferecida a esses aproveitadores da desgraça alheia para que se converta. A oferta de misericórdia dada por Deus precisa suscitar alguma reação interior de mudança; se assim não for, não acontecerá a renovação e o juízo chegará. 

Assim, roguemos a Deus perdão e graça a esses especuladores para que não continuem a esterilizar seu povo santo e caro. Fomos comprados a preço de Sangue. Não importa o que aconteça na vida, não é o “fim do mundo” — porque este mundo não é o fim. Temos a esperança da Vida Eterna!

domingo, 15 de março de 2020

As Grandes Epidemias da História


Em virtude das condições sanitárias das cidades e do desconhecimento da etiologia das doenças infecciosas, grandes epidemias assolaram as Nações no passado, dizimando suas populações, limitando o crescimento demográfico, e mudando, muitas vezes, o curso da história.

Tais epidemias foram genericamente rotuladas de peste, embora muitas delas não tenham sido causadas pelo bacilo da peste (Yersinia pestis) e fossem, provavelmente, epidemias de varíola, tifo exantemático, cólera, malária ou febre tifoide. 


Possivelmente a primeira notícia sobre a peste bubônica seja a narrativa que se encontra na Bíblia sobre a praga que acometeu os filisteus. Estes tomaram dos hebreus a arca do Senhor e foram castigados. "A mão do Senhor veio contra aquela cidade, com uma grande vexação; pois feriu aos homens daquela cidade, desde o pequeno até ao grande e tinham hemorroidas nas partes secretas" (Samuel 1:6.9). Decidiram, então, devolver a arca, com a oferta de 5 ratos de ouro e 5 hemorróidas de ouro. "Fazei, pois, umas imagens das vossas hemorróidas e as imagens dos vossos ratos, que andam destruindo a terra, e dai glória ao Deus de Israel" (Samuel 1:6.5). E os hebreus também foram vitimados pela peste após receberem a arca de volta. "E feriu o Senhor os homens de Bete-Semes, porquanto olharam para dentro da arca do Senhor, até ferir do povo cinquenta mil e setenta homens; então o povo se entristeceu, porquanto o Senhor fizera grande estrago entre o povo (Samuel 1:6.19).1 

É digno de nota o fato de que os povos daquela época já haviam estabelecido ligação entre os ratos e a peste; do contrário, a oferta de expiação não seria constituída de hemorróidas (bubões) e de ratos. Aliás, esta ligação já havia sido referida em textos antigos da medicina hindu (Susruta, 1000 d.C.)2. 

A palavra Epholim do texto original hebraico tem o sentido de inchação, tumefação, e poderia referir-se a gânglios enfartados (bubões na região inguinal) e não a uma afecção benigna como as hemorróidas. Os gânglios inflamados ou bubões, que caracterizam a peste é que lhe valeram o nome de peste bubônica.3 

Em edições mais recentes da Bíblia, os seus organizadores tiveram o bom senso de trocar "hemorróidas" por "tumores" (A Bíblia Sangrada. Trad. de João Ferreira de Almeida, 4a. edição, revista e atualizada no Brasil. Milwaukee, Spanish Publications, Inc., 1993, p. 302-3).4 
As maiores epidemias registradas pelos historiadores foram a peste de Atenas, a peste de Siracusa, a peste Antonina, a peste do século III, a peste Justiniana e a Peste Negra do século XIV. No interregno entre as citadas epidemias, outras de menor vulto foram registradas. 

Peste de Atenas 

A peste de Atenas ocorreu em 428 a.C. e foi narrada por Tucídides, em seu livro "A guerra do Peloponeso". O relato que deixou da epidemia é tão rico de informações que merece ser conhecido no texto original. Vejamos algumas passagens:5 

[...] "No começo do verão, os peloponesos e seus aliados invadiram o território da Ática. Firmaram seu campo e dominaram o país. Poucos dias depois, sobreveio aos atenienses uma terrível epidemia, a qual atacou primeiro a cidade de Lemos e outros lugares. Jamais se vira em parte algum açoite semelhante e vítimas tão numerosas; os médicos nada podiam fazer, pois de princípio desconheciam a natureza da enfermidade e além disso foram os primeiros a ter contato com os doentes e morreram em primeiro lugar. A ciência humana mostrou-se incapaz; em vão se elevavam orações nos templos e se dirigiam preces aos oráculos. Finalmente, tudo foi renunciado ante a força da epidemia. 

[...] Em geral, o indivíduo no gozo de perfeita saúde via-se subitamente presa dos seguintes sintomas: sentia em primeiro lugar violenta dor de cabeça; os olhos ficavam vermelhos e inflamados; a língua e a faringe assumiam aspecto sanguinolento; a respiração tornava-se irregular e o hálito fétido. Seguiam-se espirros e rouquidão. Pouco depois a dor se localizava no peito, acompanhada de tosse violenta; quando atingia o estômago, provocava náuseas e vômitos com regurgitação de bile. Quase todos os doentes eram acometidos por crises de soluços e convulsões de intensidade variável de um caso a outro. A pele não se mostrava muito quente ao tato nem também lívida, mas avermelhada e cheia de erupções com o formato de pequenas empolas (pústulas) e feridas. O calor intenso era tão pronunciado que o contato da roupa se tornava intolerável. Os doentes ficavam despidos e somente desejavam atirar-se na água fria, o que muitos faziam...". "A maior parte morria ao cabo de 7 a 9 dias consumida pelo fogo interior. Nos que ultrapassavam aquele termo, o mal descia aos intestinos, provocando ulcerações acompanhadas de diarreia rebelde que os levava à morte por debilidade. 

[...] A enfermidade desconhecida castigava com tal violência que desconcertava a natureza humana. Os pássaros e os animais carnívoros não tocavam nos cadáveres apesar da infinidade deles que ficavam insepultos. Se algum os tocava caía morto. 

[...] Nenhum temperamento, robusto ou débil, resistiu à enfermidade. Todos adoeciam, qualquer que fosse o regime adotado. O mais grave era o desespero que se apossava da pessoa ao sentir-se atacado: imediatamente perdia a esperança e, em lugar de resistir, entregava-se inteiramente. Contaminavam-se mutuamente e morriam como rebanhos.5 

As consequências da peste foram desastrosas para Atenas. Uma das vítimas da epidemia foi Péricles, o grande estadista, sob cujo governo a civilização grega atingiu o seu apogeu.

Muito se tem discutido sobre a verdadeira natureza desta epidemia de Atenas.6 

A doença que mais se aproxima do quadro clínico descrito por Tucídides é o tifo exantemático; todavia, investigações recentes, utilizando técnicas avançadas de biologia molecular, sugerem tratar-se de febre tifoide. Papagrigoraks e col., em 2006, examinando a polpa dentária de esqueletos exumados de um antigo cemitério de Atenas da época da epidemia, detectaram, pela técnica de amplificação do DNA, a sequência genômica da Salmonella enterica serovar typhi, tendo sido negativas as pesquisas para os agentes da peste, tifo, antraz, tuberculose, varíola bovina e bartonelose.7

Peste de Siracusa 

Ocorreu no ano 396 a.C, quando o exército cartaginês sitiou Siracusa, na Itália. A doença surgiu entre os soldados, espalhando-se rapidamente entre eles e dizimou o exército. Manifestava-se inicialmente com sintomas respiratórios, febre, tumefação do pescoço, dores nas costas. A seguir sobrevinham disenteria e erupção pustulosa em toda a superfície do corpo e, por vezes, delírio. 

Os soldados morriam ao fim do quarto ao sexto dia, com sofrimentos atrozes. O Império Romano foi o grande beneficiário dessa epidemia, vencendo facilmente os invasores.8

Peste Antonina 

Assim chamada por ter surgido no século II d.C, quando dirigia o Império Romano o Imperador Marco Aurélio, da linhagem dos antoninos. Causou grande devastação à cidade de Roma em 166 d.C., estendeu-se a toda a Itália e, após um declínio temporário, recrudesceu em 189 d.C.9 

Foi contemporânea de Galeno, quem assim descreveu os sintomas apresentados pelos doentes: "Ardor inflamatório nos olhos; vermelhidão sui generis da cavidade bucal e da língua; aversão pelos alimentos; sede inextinguível; temperatura exterior normal, contrastando com a sensação de abrasamento interior; pele avermelhada e úmida; tosse violenta e rouquidão; sinais de flegmásia laringobrônquica; fetidez do hálito; erupção geral de pústulas, seguida de ulcerações; inflamação da mucosa intestinal; vômitos de matérias biliosas; diarreia da mesma natureza, esgotando as forças; gangrenas parciais e separação espontânea dos órgãos mortificados; perturbações variadas das faculdades intelectuais; delírio tranquilo ou furioso e término funesto do sétimo ao nono dia".10 

Vê-se que há certa semelhança do quadro clínico com o da peste de Atenas. Uma das vítimas da peste Antonina foi o próprio Imperador, Marco Aurélio.

A peste do século III 

Oriunda do Egito, rapidamente se espalhou à Grécia, norte da África e Itália nos anos de 251 a 266. d.C., devastando o Império Romano. São Cipriano, bispo de Cartago, deixou a seguinte descrição da doença: "Iniciava-se por um fluxo de ventre que esgotava as forças. 

Os doentes queixavam-se de intolerável calor interno. Logo se declarava angina dolorosa; vômitos se acompanhavam de dores nas entranhas; os olhos injetados de sangue. Em muitos doentes, os pés ou outras partes atingidas pela gangrena, destacavam-se espontaneamente. Alquebrados, os infelizes eram tomados de um estado de fraqueza que lhes tornava a marcha vacilante. 

Uns perdiam a audição, e outros a visão. Em Roma e em certas cidades da Grécia, morriam até 5.000 pessoas por dia".11 

Peste justiniana 

A peste justiniana foi assim chamada por ter-se iniciado no Império bizantino, ao tempo do Imperador Justiniano, no ano de 542 d.C. Espalhou-se pelos países asiáticos e europeus, porém não teve a importância da grande epidemia do século XIV. Ao atingir Constantinopla, capital do Império (hoje Istambul), no ano de 542, chegou a causar cerca de 10.000 mortes por dia. 

O pouco que se sabe sobre esta peste se deve ao relato de Procopius, um arquivista do Império. Assim descreve os principais sintomas: "Subitamente os doentes apresentam febre ligeira; passado um dia ou mais surge um bubão em ambas as regiões, inguinal e axilar, ou em outra parte do corpo...a partir daí há diferenças individuais; alguns entram em coma, outros em delírio...Alguns morrem logo, outros depois de muitos dias; e os corpos de alguns mostram bolhas negras do tamanho de uma lentilha... e muitos morrem vomitando sangue..." 12 Este relato de Procopius sugere tratar-se de epidemia causada pelo bacilo Yersinia pestis.

Peste negra do século XIV 

Esta foi a maior, a mais trágica epidemia que a História registra, tendo produzido um morticínio sem paralelo. Foi chamada peste negra pelas manchas escuras que apareciam na pele dos enfermos. Como em outras epidemias, teve início na Ásia Central, espalhando-se por via terrestre e marítima em todas as direções. Em 1334 causou 5.000.000 de mortes na Mongólia e no norte da China. Houve grande mortandade na Mesopotâmia e na Síria, cujas estradas ficaram juncadas de cadáveres dos que fugiam das cidades. No Cairo os mortos eram atirados em valas comuns e em Alexandria os cadáveres ficaram insepultos. Calcula-se em 24 milhões o número de mortos nos países do Oriente.13 
Em 1347 a epidemia alcançou a Criméia, o arquipélago grego e a Sicília. Em 1348 embarcações genovesas procedentes da Criméia aportaram em Marselha, no sul da França, ali disseminando a doença. Em um ano, a maior parte da população de Marselha foi dizimada pela peste. 
Em 1348 a peste chegou ao centro e ao norte da Itália e dali se estendeu a toda a Europa. Em sua caminhada devastadora, semeou a desolação e a morte nos campos e nas cidades. Povoados inteiros se transformaram em cemitérios. Calcula-se que a Europa tenha perdido. pelo menos. um terço de sua população. Esta epidemia inspirou o livro DECAMERÃO, de Giovanni Bocaccio, que viveu de 1313 a 1375. As cenas que descreve no prólogo do livro se passam na cidade de Florença, na Itália. Eis alguns trechos: 
"A peste, atirada sobre os homens por justa cólera divina e para nossa exemplificação, tivera início nas regiões orientais. Incansável, fora de um lugar para outro, e estendera-se de forma miserável para o Ocidente. [...] 

Nenhuma prevenção foi válida, nem valeu a pena qualquer providência dos homens". Assim descreve Bocaccio os sintomas: 
"Apareciam, no começo, tanto em homens como nas mulheres, ou na virilha ou nas axilas, algumas inchações. Algumas destas cresciam como maçãs, outras como um ovo; cresciam umas mais, outras menos; chamava-as o povo de bubões. Em seguida o aspecto da doença começou a alterar-se; começou a colocar manchas de cor negra ou lívidas nos enfermos. 

Tais manchas estavam nos braços, nas coxas e em outros lugares do corpo. Em algumas pessoas as manchas apareciam grandes e esparsas; em outras eram pequenas e abundantes. E, do mesmo modo como, a princípio, o bubão fora e ainda era indício inevitável de morte, também as manchas passaram a ser mortais". 
Retrata, a seguir, a situação de caos que se instalou na cidade: 
Entre tanta aflição e tanta miséria de nossa cidade, a autoridade das leis, quer divinas quer humanas desmoronara e dissolvera-se. Ministros e executores das leis, tanto quanto outros homens, todos estavam mortos, ou doentes, ou haviam perdido os seus familiares e assim não podiam exercer nenhuma função. Em consequência de tal situação permitia-se a todos fazer aquilo que melhor lhes aprouvesse. 
Uma das maiores dificuldades era dar sepultura aos mortos: 
"Para dar sepultura a grande quantidade de corpos já não era suficiente a terra sagrada junto às Igrejas; por isso passaram-se a edificar Igrejas nos cemitérios; punham-se nessas Igrejas, às centenas, os cadáveres que iam chegando; e eles eram empilhados como as mercadorias nos navios".14
Em Avignon, na França, vivia Guy de Chauliac, o mais famoso cirurgião dessa época, médico do Papa Clemente VI. Chauliac sobreviveu à peste e deixou o seguinte relato: 
"A grande mortandade teve início em Avignon em janeiro de 1348. A epidemia se apresentou de duas maneiras. Nos primeiros dois meses manifestava-se com febre e expectoração sanguinolenta e os doentes morriam em 3 dias; decorrido esse tempo manifestou-se com febre contínua e inchação nas axilas e nas virilhas e os doentes morriam em 5 dias. Era tão contagiosa que se propagava rapidamente de uma pessoa a outra; o pai não ia ver seu filho nem o filho a seu pai; a caridade desaparecera por completo". E continua: "Não se sabia qual a causa desta grande mortandade. Em alguns lugares pensava-se que os judeus haviam envenenado o mundo e por isso os mataram".15 
Durante a epidemia, o povo, desesperado, procurava uma explicação para a calamidade. Para alguns tratava-se de castigo divino, punição dos pecados, aproximação do Apocalipse. Para outros, os culpados seriam os judeus, os quais foram perseguidos e trucidados. Somente em Borgonha, na França, foram mortos cerca de 50.000 deles. 
Atribuía-se, também, a disseminação da peste a pessoas que estariam contaminando as portas, bancos, paredes, com unguento pestífero. 

Muitos suspeitos foram queimados vivos ou enforcados. Em Koenisberg, na Alemanha, uma criada que havia transmitido a peste a seus patrões foi enforcada depois de morta e a seguir queimada. Na Itália, o conde que governava a Calábria decretou que todo pestoso fosse conduzido ao campo para ali morrer ou sarar, e ainda confiscou os bens dos que haviam adquirido a peste. 
No meio de tanto desespero e irracionalidade, houve alguns episódios edificantes. Muitos médicos se dispuseram a atender os pestosos com risco da própria vida. Adotavam para isso roupas e máscaras especiais. 

Alguns dentre eles evitavam aproximar-se dos enfermos. Prescreviam à distância e lancetavam os bubões com facas de até 1,80 m de comprimento. Frades capuchinhos e jesuítas cuidaram dos pestosos em Marselha, correndo todos os riscos. Foi fundada a Confraria dos Loucos, que invocava a proteção de São Sebastião para combater o medo da morte. São Roque foi escolhido o padroeiro dos pestosos. Tratava-se de um jovem que havia adquirido a peste em Roma e havia se retirado para um bosque para morrer. Foi alimentado por um cão, que lhe levava pedaços de pão e conseguiu recuperar-se.
As consequências sociais, demográficas, econômicas, culturais e religiosas dessa grande calamidade que se abateu sobre os povos da Ásia e da Europa, foram imensas. As cidades e os campos ficaram despovoados; famílias inteiras se extinguiram; casas e propriedades rurais ficaram vazias e abandonadas, sem herdeiros legais; a produção agrícola e industrial reduziu-se enormemente; houve escassez de alimentos e de bens de consumo; a nobreza se empobreceu; reduziram-se os efetivos militares e houve ascensão da burguesia que explorava o comércio. O poder da Igreja se enfraqueceu com a redução numérica do clero e houve sensíveis mudanças nos costumes e no comportamento das pessoas 16 
A peste negra foi a maior, mas não a última das epidemias. A doença perseverou sob a forma endêmica por muitos anos e outras epidemias menores, localizadas, foram registradas nos séculos seguintes. Citam-se como surtos mais importantes a peste de Milão, Brescia e Veneza no século XVI; a peste de Nápoles, em 1656; a peste de Londres em 1655 (setenta mil mortes); a de Viena em 1713, e a de Marselha em 1720, que matou metade de sua população. 
Entre 1894 e 1912 houve uma outra pandemia que teve início na Índia que se estendeu à China (10 milhões de mortes). de onde trasladou-se para a costa do Pacífico, nos Estados Unidos. No Brasil, a peste entrou pelo porto de Santos em 1899 e propagou-se a outras cidades litorâneas. A partir de 1906 foi banida dos centros urbanos, persistindo como enzootia em pequenos focos endêmicos residuais.na zona rural 17 
O terrível flagelo da peste inspirou a imaginação criativa de pintores famosos. 


Os quadros mais notáveis são: A peste em Atenas, do pintor belga Michael Sweerts (1624-1664), A peste em Nápoles, de Domenico Gargiulo (1612-1679), O triunfo da morte, do pintor belga Peter Breugel (1510-1569), e São Roque, de Bartolomeo Mantegna (1450-1523). Inspirou igualmente Albert Camus, prêmio Nobel de literatura, a escrever uma de suas obras mais conhecidas: "A peste".         

No Novo Continente as mais importantes epidemias foram as de varíola, trazidas pelos colonizadores espanhóis e portugueses, que dizimaram as populações indígenas, e a de febre amarela, que atingiu os membros da expedição de Cristóvão Colombo e se espalhou para outros países do continente, inclusive o Brasil autóctone da América Central. Finalmente cabe mencionar a pandemia de gripe, chamada gripe espanhola, oriunda da Europa, em 1918, após a Primeira Guerra Mundial, com cerca de 20 milhões de vítimas.18 

O Coronavírus

Os coronavírus (CoV) são uma grande família viral, conhecidos desde meados dos anos 1960, que causam infecções respiratórias em seres humanos e em animais. Geralmente, infecções por coronavírus causam doenças respiratórias leves a moderada, semelhantes a um resfriado comum. A maioria das pessoas se infecta com os coronavírus comuns ao longo da vida, sendo as crianças pequenas mais propensas a se infectarem. 

Em 2012, foi isolado outro novo coronavírus, distinto daquele que causou a SARS no começo da década passada. Esse novo coronavírus era desconhecido como agente de doença humana até sua identificação, inicialmente na Arábia Saudita e, posteriormente, em outros países do Oriente Médio, na Europa e na África. Todos os casos identificados fora da Península Arábica tinham histórico de viagem ou contato recente com viajantes procedentes de países do Oriente Médio – Arábia Saudita, Catar, Emirados Árabes e Jordânia.

Um novo Coronavírus chinês, primo do vírus da SARS, infectou centenas de pessoas desde o início do surto em Wuhan , na China, em dezembro. O que se sabe é que causa pneumonia e, em seguida, não responde ao tratamento com antibióticos.

O vírus pode deixar as pessoas doentes, geralmente com uma doença do trato respiratório superior de leve a moderada, semelhante a um resfriado comum. Os sintomas do Coronavírus incluem coriza, tosse, dor de garganta, possivelmente dor de cabeça e talvez febre, que pode durar alguns dias.

Para aqueles com um sistema imunológico enfraquecido, idosos e muito jovens, há uma chance do vírus causar uma doença do trato respiratório mais baixa e muito mais grave, como uma pneumonia ou bronquite.



Referências bibliográficas

1. A Bíblia Sagrada. Trad. de João Ferreira de Almeida, 1981, p. 287-9). 2. A. Castiglioni. História da medicina (trad, de R Laclette); São Paulo, Cia. Editora Nacional, p. 104, 1947. 3. P. Santos. "O termo hemorróidas na Bíblia". Jornal Brasileiro de Medicina 12, pp.511-513, 1967.4. A Bíblia Sangrada. Trad. de João Ferreira de Almeida, 4a. ed.., 1993, pp. 302-3 5. Tucídides. História da guerra do Peloponeso. Apud O. C. Lopes, A medicina no tempo, 1969, pp. 161-162. 6. J. C. Sournia; J. Ruffier. As epidemias na história do homem, 1964, p.79 7. M. J. Papagrigorakis; C. Yapijakis; P. N. Synodinos; E. Baziotopoulou-Valavani. "DNA examination of ancient dental pulp incriminates typhoid fever as     a probable cause of the Plague of Athens". International Journal of Infectious Diseases 10, pp.334-336. 8. O. C. Lopes. A medicina no tempo, 1969, pp. 163-164. 9. F. F; Cartwright, F. F. Disease and history, 1991, p. 13 10. O. C. Lopes. Op. cit., pp. 164-165. 11. O. C. Lopes. Op. cit., p. 165. 12. H. Zinsser. Rats, lice and history, 1996, pp. 146-147. 13. O. C. Lopes. Op. cit., p. 172 14. G. Boccaccio, 1979, pp. 11-16. 15 A. Castiglione, op, cit., 1947, p. 420 16 R. H. Major. A history of medicine, 1954, p. 341. 17 S. C. Ujvari.  A história e suas epidemias, 2003, pp. 67-69 18. C. Liu. "Influenza". Infectous diseases, p. 3230


Joffre M. de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História da Medicina
e-mail: joffremr@ig.com.br
http://www.jmrezende.com.br

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Getsêmani, o Lagar de Azeite


“Mas eu sou como uma oliveira que floresce na casa de Deus; confio no amor de Deus para todo o sempre” (Salmo 52:8).

Uma das características mais impressionantes da oliveira é sua perenidade! Elas crescem praticamente sob quaisquer condições: nas montanhas ou nos vales, nas pedras ou na terra fértil. Crescem otimamente sob o intenso calor, com pouca água e são quase indestrutíveis! Seu desenvolvimento é lento, porém contínuo. Quando é bem cuidada, pode atingir até 7 metros de altura. Até as oliveiras doentes continuam a lançar novos ramos!

Algumas árvores tem troncos torcidos e velhos, mas sempre com folhas verdes. Ainda que estejam velhas, as oliveiras não deixam de lançar de si novos ramos e dar frutos! Até 10 ou mais mudas brotam das raízes longas que buscam água nos lugares mais profundos da terra. Ainda que cortada e queimada novos ramos emergirão de sua raiz. Algumas brotam e crescem num sistema de raízes com mais de 2.000 anos de idade, mas o lavrador tem que esperar 15 anos para a colheita de uma árvore nova.
Os frutos da oliveira são as azeitonas. Mas de que nos servem as azeitonas? Sabemos que elas são uma fonte de comida, luz, higiene e cura.
A palavra em hebraico para azeite de oliva é שׂמנּ (shemen). A segunda é que a palavra para a prensa ou lagar usados na produção do azeite é גת (gath). Quando você junta essas duas palavras גת (gath) e שׂמנּ (shemen), prensa de azeite ou azeites, você tem “gathshemen” ou “gatshmanim”. Na antiguidade os frutos das oliveiras eram postas na prensa, para que, pelo peso da alavanca mais o peso das pedras que imprensavam a azeitona, o azeite fosse extraído.
Você talvez não se lembre, mas conhece bem o som dessa palavra, pois representa um lugar muito conhecido pelos cristãos … “Getsêmani”, em grego γεθσημανι (Gethsemane), que significa … “lagar de azeite” … o lugar onde começou o sofrimento do Messias. Foi onde a prensa começou a se movimentar sobre Jesus, por isso não tinha local mais apropriado em todo o Israel para tal … perceba que tudo tem um propósito, nada é por acaso. Esse movimento da prensa sobre Jesus começou a extrair dEle todo o seu “azeite”, começando primeiro por retirar a sua vontade própria (fazer a vontade do Pai) até terminar tirando dEle a sua vida. Mas todo esse “azeite” por Ele derramado não foi em vão, visto que todo esse “azeite” mais do que puro, esse fantástico “óleo de unção” extraído do Senhor, tem sido então derramado sobre a Igreja através do Espírito Santo ao longo dos séculos, desde o dia do pentecostes até os dias de hoje.
Jesus, às vésperas de Sua prisão e execução, passou por momentos de oração no Jardim das Oliveiras, no Getsêmani. Foi exatamente ali que Ele enfrentou sua mais esmagadora batalha, onde envolto em angústia, pavor, terror, aflição, confessou: “minha alma está triste até a morte”, e revelando sua humanidade, intimidade, e sentimentos aos seus discípulos, lhes pediu: “ficai aqui, vigiai e orai”. Foi ali no Getsêmani que Jesus se angustiou profundamente. Tão profundamente que se achou nele uma tristeza mortal. Foi aí que o cálice seria passado, se possível fosse. O lugar onde se prensava o azeite, lugar ainda hoje cheio de oliveiras (por isso chamado de Monte das Oliveiras), se assemelhava com o "lugar" do sofrimento de Deus na alma de Jesus. O Getsêmani foi o lugar onde o azeite da vida eterna foi prensado dentro de Jesus. Foi tão prensado, tão prensado, tão esmagado pelos nossos pecados, que suou gotas como de sangue. Jardim do Getsêmani... Lugar de prensa. Lugar de agonia. Lugar de sangue. Lugar de dor. Mas também é lugar de flores, lugar de ressurreição, lugar de vitória, lugar de elevação.

Não é notável que Deus nos tenha comparado justamente a esta tão significativa árvore? Assim como Cristo tinha que passar pela “prensa de azeite”, nós também teremos. Haverá coisas em nossa vida que vamos sentir como se estivéssemos sendo colhidos, esmagados e prensados. Mas, se deixarmos que essas coisas nos ensinem, irão se transformar em algo doce, benéfico, curativo e nutritivo para os outros. Essa prensa de azeite continua funcionando até hoje. Assim como a oliveira, nós fomos chamados por Deus para darmos frutos independentes do local onde formos plantados. Não importam as condições do terreno, mas sim a nossa perseverança em frutificar ali. Deus nos chamou justamente para que sejamos "plantados" em solos hostis para ali darmos os frutos necessários naquela situação. E se porventura formos momentaneamente vencidos, não nos desanimaremos! Assim como a oliveira que é queimada, lançaremos novos ramos de nossas raízes e continuaremos vivendo e frutificando! Há também conosco um período de amadurecimento até que possamos frutificar abundantemente! Durante esse período vamos crescendo em estatura e finalmente produzimos a quantidade desejada de frutos. O “Getsêmani” ainda atua sobre nós cristãos da mesma forma, buscando começar primeiro retirando de cada um de nós a nossa vontade própria, pecadora e egoísta, que está ligada a “velha natureza“; e então vai trabalhando e se movimentando sobre nós até que essa “velha natureza” morra, para que então ganhemos uma “nova vida“, sendo “nova criatura” em Cristo, com quem morremos e renascemos.
Nascidos agora do “alto“, sendo livres da “velha natureza” e com a promessa de uma vida abundante e eterna no Senhor. Esse processo se tornará efetivamente completo em toda a sua extensão quando o Senhor voltar novamente; enquanto isso, nós vamos derramar o nosso “azeite”, alcançando e “ungindo” no processo a muitos outros, buscando terminar a nossa carreira plenos na realização dos propósitos do Senhor para as nossas vidas e, ao mesmo tempo, … vazios … sem que sobre qualquer “azeite” para ser extraído de nós …

Este azeite não procede de qualquer um, mas somente daquelas azeitonas que foram previamente escolhidas e depois prensadas a fim de liberarem de si este óleo para unção dos reis, sacerdotes e profetas. Muitas vezes você está sendo "prensado" por Deus e este ato está lhe causando muitas dores. Para alguns chega a ser quase insuportável e chegamos até mesmo a dizer: "Senhor, por favor, pare, pois a dor está me massacrando!" Mas, quando o Senhor acaba de nos "prensar" sai o óleo fresco que ungirá a muitos para a seara do Deus vivo!
O azeite propriamente dito nesta passagem, são os nossos atos com Deus. O azeite para ser produzido era algo notório às azeitonas, primeiramente eram selecionadas e depois elas passavam em uma prensa ou em moinhos de pedra. Ou seja, para se extrair o mais puro azeite as azeitonas sofriam grandes atritos onde eram literalmente massacradas nessas prensas e moinhos.

Assim somos nós, com nossas vidas, fomos atraídos a Cristo, ou seja, selecionados. Satanás, o mundo com todos os seus perigos e pecados atraentes são as prensas e moinhos, que vão nos levar em atritos contra a nossa fé e obediência à Palavra de Deus, afim de que nessas tribulações e tentações venha o óleo ser extraído de nós, para que não falte o puro azeite, Espírito Santo, para que a Luz do Evangelho e de Cristo nunca pare de brilhar em nós, assim como na Menorah do Antigo Testamento da qual estava dentro do Tabernáculo não podia se apagar.
O arrebatamento será num piscar de olhos (50 milésimos de segundo), e aí, nesse momento, não será possível pedir perdão pelos nossos pecados; não haverá tempo de nos arrependermos afim de que o azeite seja restabelecido em nós. Tribulações, dificuldades, seja de qual gênero for, tentações e fraquezas, são as prensas e moinhos extraindo e fabricando em nós o melhor óleo do Santo Espírito em nós.

Faz-se necessário o uso da prensa para que o azeite possa ser produzido! Não se engane, somente quando nossas vidas são "prensadas" por Deus é que somos habilitados a produzirmos o "puro azeite para unção".

Somente quem ama incondicionalmente permite ser prensado como o azeite. E quem é prensado como o azeite da oliveira torna suco saudável daquilo que antes era só o cheiro. Imaginem o cheiro das oliveiras. Melhor que o cheiro é o próprio azeite que dá o cheiro e também o sabor. Jesus dá sabor a nossa vida.

O azeite de oliva é um símbolo do Espírito Santo, a fonte e o meio da iluminação espiritual. Usando azeite de oliva porque é facilmente atraído para o pavio, sua luz arde claramente.

O azeite na antiguidade também era conhecido por seus efeitos terapêuticos. Nós fomos comissionados pelo Senhor a trazer cura às nações, povos, tribos e homens em toda a terra! Isaías profetizou isso quando disse:
"O Espírito do Senhor Deus está sobre mim; porque o Senhor me ungiu para pregar boas novas aos mansos, enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos e a abertura de prisão aos presos" (Is 61.1).

O azeite também abastecia as lâmpadas que traziam luz, e esta é justamente nossa função primordial: iluminar um mundo em trevas! O próprio Jesus nos disse: "Vós sois a luz do mundo", e quando a luz chega em qualquer lugar, imediatamente as trevas têm que recuar!

O apóstolo Paulo nos adverte: “Não apaguem o Espírito”. Para que os seus propósitos eternos sejam plenamente cumpridos em nós e através de nós!

Não são poucas as passagens da Bíblia, tanto do Antigo quanto do Novo Testamento, em que o azeite de oliva aparece com um importante significado. Hoje mais popular na alimentação, também teve ao longo da história um forte sentido espiritual, além de outros usos, como em medicamentos e cosméticos. A oliveira, cujo fruto dá origem ao tipo de azeite mais usado no mundo (existem os feitos com outros vegetais), surgiu na região que hoje compreende a Síria – não por acaso, segundo a Bíblia, onde já se situou o famoso Jardim do Éden, primeira morada do homem. Também já foram achadas oliveiras fossilizadas na área do atual Irã.
Há indícios de que o óleo extraído das azeitonas já era usado há 6 mil anos. Os povos da Mesopotâmia o usavam como protetor contra o frio. Untavam a pele com o azeite, que “pega emprestado” o calor do ambiente e não deixa o corpo perder o seu com facilidade. Guerreiros da época também o passavam para ressaltar a musculatura, a fim de intimidar os adversários.
O óleo extraído das azeitonas foi usado por milênios como combustível para lamparinas, fornecendo iluminação noturna nos imóveis, acampamentos ou com intuito cerimonial, como nas menorás (candelabros judaicos de sete lâmpadas, como os que eram usados no Tabernáculo e no Templo de Salomão).
Os mercadores de Tiro eram importantes comerciantes de azeite. Vendiam-no até mesmo ao Egito, já que as azeitonas egípcias não eram de boa qualidade. Israel também produzia muito azeite, mas também o comprava de Tiro. Relatos da comercialização do produto aparecem em livros bíblicos como 2 Crônicas, 1 Reis, Isaías, Ezequiel e Oseias.
Os fenícios e gregos espalharam o uso do azeite pelas outras regiões mediterrâneas (até hoje o óleo grego figura entre os melhores do mundo). Médicos da Grécia já o utilizavam em seus unguentos no século VII (a.C.), assim como os romanos e os próprios israelitas, além dos mesopotâmicos e egípcios, como atestam vários achados arqueológicos.

Além da utilização em temperos e para fritar alimentos, e também para conservá-los, o azeite era matéria-prima de medicamentos de uso tópico (como cremes e pomadas), de cosméticos (cremes e óleos para cabelos e pele) ou ainda misturado a essências perfumadas para uso no corpo ou em ambientes. Misturado a especiarias e flores, com ele era feito uma espécie de incenso.

O sentido espiritual do azeite é frequente até os dias atuais para povos como os judeus e os cristãos. O óleo simboliza a presença do Senhor, também representando o Espírito Santo. Com ele, eram ungidos reis e sacerdotes, conforme a vontade de Deus. Jacó, em suas experiências com Deus em Betel, por duas vezes ergueu altares de pedra, sobre os quais deitou azeite.
Nos sacrifícios diários, também era usado o azeite, sempre de ótima qualidade, assim como na purificação dos leprosos. Manjares para ofertas a Deus eram comumente usados sem fermento e com azeite. A ausência do fermento significa a abstinência do pecado, enquanto o azeite simboliza a presença do Senhor. Quando as ofertas eram feitas para a expiação de pecados ou por causa de ciúmes, entretanto, não se usava o azeite. Também era comum os judeus untarem levemente o corpo com azeite após o banho (tem um eficiente efeito hidratante e suavizante da pele) ou antes de importantes festas. Mas em ocasiões tristes como a de luto, ele não devia ser usado – o óleo simbolizava, entre muitas coisas, a alegria.

Em uma das famosas parábolas contadas por Jesus, um samaritano encontra um judeu vitimado por agressão, e, piedosamente, trata suas feridas com vinho (desinfecção, por causa do álcool) e azeite (com propriedades cicatrizantes). Este uso terapêutico também aparece em Isaías 1:6 (amolecimento de chagas para tratamento), além da cura espiritual. Graças aos antigos mercadores do Mediterrâneo, o uso do azeite se propagou para outras terras, que também passaram a produzi-lo.

Hoje, o óleo é usado na culinária, cosmética e medicina de várias culturas, inclusive no Brasil, onde chegou pelas mãos dos colonizadores portugueses e espanhóis, cujos países produzem azeite em larga escala, exportado para várias regiões do planeta. Nosso país é o sétimo maior importador mundial de azeite e o segundo de azeitonas, produtos presentes maciçamente em nossa culinária diária. Embora não tenhamos tradição no plantio de oliveiras, pesquisas já começam a dar frutos em Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, e logo poderemos consumir muito azeite de olivas brasileiras, cuja cultura se propagará para outros estados de clima propício.

sábado, 22 de fevereiro de 2020

De Carnaval a Carnaval, tudo é Cinzas!


"Disse eu no meu coração: Ora vem, eu te provarei com alegria; portanto goza o prazer; mas eis que também isso era vaidade. Ao riso disse: Está doido; e da alegria: De que serve esta?”. Ecl. 2.1,2

Imagino Salomão se vivesse nos nossos dias. Talvez o carnaval do Brasil fosse o lugar onde tentaria descobrir o sentido da vida na busca pelo prazer. Então, na companhia de mulatas e loiras, talvez ele caísse na folia e, quanto à cerveja, “enxugaria” todas e seria o número um da avenida. No momento diria que a vida era boa tipo “sapo caindo na lagoa”.

Mas, depois dos quatro dias de folia ele concluiria que carnaval também era um correr atrás do vento e ele então escreveria isto: Hoje é quarta feira. Esfriam-se os tamborins e os foliões voltam à rotina. O show já terminou; é hora de tirar as máscaras e cair na real.

Na passarela da vida a alegria passou como confetes lançado ao ar. Nos pés, bolhas e inchaços. Na cabeça o remorso brilha como purpurina; fruto de uma barganha louca do topa tudo por prazer.

Antes que queime sua honra, sua dignidade e sua vergonha; antes que sua vida espiritual se torna uma vida carnal e você um produto perecível. Antes que você deteste aquele sorriso bobo e a cara de assustado dos mais de mil palhaços no salão; antes que a arvore de seus sonhos se tornem em galhos secos. Antes que as chamas da morte atinjam estes galhos e na quarta feira esses galhos viram cinzas... Lembre-se do seu Criador.

De carnaval a carnaval tudo é ‘cinzas’, é fumaça de vida esvaindo ao ar. É ilusão. É canseira e enfado e aflição de espirito. É vaidade...

Dê um cartão vermelho ao rei momo; abrace Jesus, o rei do riso, e descubra o verdadeiro sentido da vida e o prazer de viver. Ele veio para que você tenha “vida e vida em abundância” (João 10.10). 

sábado, 8 de fevereiro de 2020

A Magnificência de Deus

Deus é forte, mas ao mesmo tempo é delicado. Ele sustenta o Universo inteiro, os mares, as mais altas montanhas, vulcões... e ao mesmo tempo cuida de cada coração dos mais de 7 bilhões de seres humanos; corações que batem com uma média de 70 batidas por minuto, 37 milhões de vezes por ano, que são ligados a cerca de 321 mil km de vasos que transportam o sangue por todo o nosso corpo.

Quantos detalhes e Ele cuida de cada um deles perfeitamente! Fora os animais, as plantas... Enfim, Deus é tão forte, é o todo poderoso e ainda assim cuida das coisas simples dessa vida; se preocupa com cada um de nós; sabe o número de grãos de areia das praias e o número de cabelos das nossas cabeças. Conhece todos os nossos pensamentos, sonhos, planos... nos dá a vida diariamente e nos abençoa constantemente.

São tantas bênçãos que geralmente nos esquecemos da maior parte delas. Já parou para pensar que você já foi abençoado pelo simples fato de nascer nos tempos de hoje? De quanta coisa Ele te livrou mesmo antes de você nascer!

Ele ainda mandou seu único filho para morrer de uma maneira brutal em nosso lugar, mesmo com todo o desprezo e pecado do ser humano Ele teve misericórdia. Ele poderia simplesmente abandonar tudo, colocar fogo, fazer desaparecer e adeus problemas né? Mas não! Ele não desistiu de mim, não desistiu de você. Mesmo nós sendo tão pequenos diante da magnificência dEle, esse amor perdoador nos reveste e nos traz a vida. Desde sempre.

E o que podemos fazer diante de um Deus tão grande, de um Rei que está acima de todos os reis? Apenas obedecer e adorar! A Bíblia está repleta de motivos para isso. E é muito pouco frente a tudo o que Ele faz. E mesmo Ele fazendo tudo isso, não nos pede nada em troca, Ele somente nos ama. Puramente nos ama, pois Ele é o próprio amor.

Quando louvamos e adoramos ao Senhor, nossa alma e o coração de Deus se alegram. E quando o obedecemos, nós o amamos: “Se me amais, guardai os meus mandamentos” – João 14:15.

Enfim tudo o que Deus quer de nós e que nós nos voltemos para Ele e creiamos no seu poder. Ele quer ser seu amigo, mesmo sendo o mais importante, o mais poderoso, Deus compartilha o seu amor conosco e também quer o amor que você pode dar a Ele.(Vivian Marques de Lima).

domingo, 2 de fevereiro de 2020

Carros de Ferro



Pela sua rebeldia contra o Senhor, Israel estava sob opressão de Jabim, rei de Hazor, território de Canaã. Sísera era o comandante do exército de Jabim e tinha a sua disposição novecentos carros de ferro, o que dava aos cananeus grande mobilidade e superioridade bélica. Isto facilitava a dominação.

Débora, salvadora do povo, é a única mulher no grupo dos juízes. Era uma mulher casada, embora não se fale do seu marido (casada com Lapidote. Jz. 4:4); também era profetisa. Parece que neste período os homens tiveram um papel apagado, já que nem mesmo Baraque, comandante do exército de Israel, recebe méritos pela vitória. Ele se nega a subir à batalha se Débora não for com os dez mil homens. Aliás, dez mil homens na frente do exército de Sísera era um número bem insignificante. Além do mais, os cananeus tinham os temidos carros de ferro.

Jael, mulher de Heber, queneu, era uma mulher nômade, acostumada a montar e desmontar sua tenda, já que isto era tarefa das mulheres, portanto, tinha um bom manejo ao bater uma marreta numa estaca (Jz. 5:26).

Nos dias de batalha choveu muito. Baal, deus dos cananeus, era conhecido como o deus das tempestades. Mas o Deus de Israel também tem este título (Sl. 18:9-15). Providencialmente a tempestade favoreceu a Israel, já que os carros de ferro não andavam bem na lama. Além do mais. O ribeiro de Quisom encheu, reduzindo o espaço para as manobras dos carros. A enchente os arrastou (Jz. 5:2-12). Como não havia como fugir nos carros, muitos desertavam a pé, como foi o caso de Sísera.

Quando empreende fuga, Sísera encontra a tenda de Jael; contente por encontrar abrigo, após uma refeição, exausto, adormece. Sísera não sabia, mas a mulher que o abrigara pertencia a uma tribo que mantinha laços fortes com os israelitas, e, portanto, estava na tenda de um inimigo. A eficiência com que Jael crava a estaca na têmpora do homem vem de longos anos de experiência. Ela não precisou fazer muito esforço.

Podemos afirmar, como Débora, que Deus lutou por Israel (Jz.5:13). Comecemos falando do pequeno número de soldados israelitas. Fora a inferioridade numérica, havia a inferioridade bélica; os cananeus tinham os carros de ferro que tanto medo causavam a Israel. Israel não tinha como vencer a batalha confiando apenas nos seus combatentes. 

A tempestade não foi, então, uma coincidência, mas uma providência. Não era tempo de chuvas, por isso Sísera mobiliza as carruagens para a área ao longo do ribeiro de Quisom, onde sobrava espaço para alinhá-las. Deus mandou a chuva. As rodas dos equipamentos atolavam na lama das planícies. Isto impossibilitava aos cananeus de tirar vantagem de seu maior trunfo. Na lama, carro de ferro é problema, não solução. A lentidão dos veículos era tal que se dava preferência a fugir a pé.

O ribeiro de Quisom enche com o temporal e muitos cananeus a bordo dos carros têm sua sepultura debaixo das águas, à semelhança do exército de Faraó. De fato, o Senhor faz seu caminho na tempestade.

O líder do exército de Jabim encontra a morte pelas mãos de uma mulher e não de um guerreiro. Jael não armou coincidentemente sua tenda naquele caminho (Jz.5:24-26).

Débora reconhece a intervenção de Deus. Por isso convoca a que se louve ao Senhor. À semelhança do povo de Israel, às vezes tememos os “carros de ferro” do inimigo. Carro de ferro, neste sentido, pode representar algo aparentemente invencível, que nos desestimule até mesmo a tentar lutar. Baraque atendeu ao desafio de Débora com certa reserva. Talvez pensado nos carros de ferro. Porém Deus é quem peleja pelos que tem fé. Logo os milhares de ferro que possam nos cercar não serão suficientes para impressionar o nosso Deus. O Senhor tem sempre um meio de enlamear o plano do inimigo. Devemos confiar no Deus que trava as rodas dos carros de ferro.

Outra lição que podemos tirar da história citada é a importância dos instrumentos anônimos de Deus. Pessoas que talvez passem despercebidas do olhar de quem cultua grandes nomes. Jael era apenas uma mulher no meio de tantas outras, de tantas tribos nômades de sua época. Foi considerada “bendita sobre todas as mulheres” por Débora. Deus entregou o inimigo de seu povo nas mãos de alguém que não era uma heroína. Confiemos em Deus que nos dá livramentos e respeitemos as pessoas, Ele poderá usar qualquer uma delas pra nos ajudar. (Izaias Maia).