terça-feira, 10 de setembro de 2013

Temer ou não temer, eis a questão!


Por intermédio de quem Abraão alcançou bom testemunho? Não foi por causa do Descendente, que é Cristo? Cristo não é a fé que havia de se manifestar? Ou seja, os antigos alcançaram bom testemunho por meio do Descendente, a fé que havia de se manifestar.

"E disse Moisés ao povo: Não temais, Deus veio para vos provar, e para que o seu temoresteja diante de vós, afim de que não pequeis" ( Ex 20:20 )

Temer ou não temer, eis a questão!

Oprofeta Moisés alertou o povo dizendo: Não temais ( Ex 20:20 ), porém, em Levítico ele reitera para que tivessem temor do Senhor: "Não te assenhorearás dele com rigor, mas do teu Deus terás temor" ( Lv 25:43 ).

Outro ponto intrigante é a recomendação do apóstolo Paulo: "De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor" ( Fl 2:12 ).

Para alguns, este é um caso de contradição. Outros tentam explicar a passagem como sendo uma contradição aparente, ou simplesmente nomeiam de paradoxo. Mas, o que a bíblia tem a dizer? Seria somente um problema de semântica e etimologia?

O Amor lança fora o medo

Uma coisa é certa no alerta que Moisés fez ao povo de Israel: Deus não se relaciona com as suas criaturas através do medo“Não temais” ( Ex 20:20 ). A relação que Deus sempre procurou estabelecer com as suas criaturas pauta-se pela confiança.

Por que as criaturas de Deus devem confiar? Porque Deus é fiel e justo, atributos basilar para se estabelecer uma relação de confiança ( 1Jo 1:9 ).

Além de fiel, justo e imutável, Deus se relaciona com criaturas livres, pois onde o Espírito do Senhor está, aí há liberdade ( 2Co 3:17 ).

Nenhuma das criaturas de Deus deve temê-Lo, pois Deus ama indistintamente as suas criaturas, e o amor lança fora o medo"No amor não há temor, antes o perfeito amor lança fora o temor; porque o temor tem consigo a pena, e o que teme não é perfeito em amor" ( 1Jo 4:18 ).

Ora, Deus é amor, e em Deus não há medo, receio, temor, antes o perfeito amor lança fora o temor. Deus é amor; e quem está em amor está em Deus, e Deus nele ( 1Jo 4:16 ). Quem está em Deus é porque confia n’Ele ( 1Jo 4:16 ).

Qualquer que tem medo teme somente a pena, pois o medo não procede de Deus. O que procede de Deus é a confiança, pois ele é fiel, verdadeiro, justo, santo, imutável, amor, luz, etc. Deus não pode ser tentado com o mal, e a ninguém tenta ( Tg 1:13 ), portanto, o medo não procede de Deus.

Qualquer que tem medo é porque não é ‘perfeito’ em Deus, ou seja, não ‘conhece’ a Deus, não crê em Deus e não está em Deus, pois se confiasse entenderia que, tal Cristo é, são os que crêem aqui neste mundo ( 1Jo 4:15 -18).

Mesmo que o Senhor venha para provar, o homem deve confiar n’Ele, pois assim o Senhor recomenda por intermédio do seu profeta: “Não temais, Deus veio para vos provar...” ( Ex 20:20 ). Aquele que se relaciona através do amor, da justiça, da fidelidade, da imutabilidade jamais despertará nas suas criaturas o medo, antes trará confiança e descanso.

O Temor do Senhor

Mas, se o homem não deve ter medo de Deus, que ‘temor’ é necessário ter de Deus? ( Lv 25:43 ) O que é operar a salvação com temor e tremor?

Parte da resposta encontra-se na palavra anunciada por Moisés: o homem não pode ter medo de Deus, mesmo quando Ele vem prová-lo, porque é essencial que o ‘temor’ de Deus esteja perante o homem, para que ele não venha a pecar contra Deus.

Como? O homem não pode ter medo, mas tem que ter o alardeado ‘temor’ reverente? Isto não seria outro nome para o medo, ou para a falta de confiança?

Para uma interpretação correta, devemos iniciar a análise com o motivo apontado como essencial para se ‘temer’ ao Senhor: “... afim de que não pequeis" ( Ex 20:20 ).

Há outro homem de Deus que disse algo semelhante: "Escondi a tua palavra no meu coração, para eu não pecar contra ti" ( Sl 119:11 ). Quando se compara a meditação de Davi com o alerta de Moisés, chega-se à seguinte conclusão: o ‘temor’ de Deus é a Palavra de Deus!

· "Escondi a tua palavra no meu coração, para eu não pecar contra ti" ( Sl 119:11 );

· “... e para que o seu temor esteja diante de vós, afim de que não pequeis" ( Ex 20:20 ).

O que era válido para Davi é válido para todos os homens: para não pecar, somente a ação da palavra de Deus no coração do homem!

Em vários textos bíblicos a palavra ‘temor’ foi utilizada para fazer referência à palavra de Deus. Ao observar o contexto bíblico onde Moisés alertou o povo de Israel para não ter medo de Deus é possível perceber que o profeta se referiu à palavra de Deus como sendo o ‘temor’ do Senhor.

Deus queria que o povo ouvisse quando Ele falasse com Moisés para que pudessem crer n’Ele ( Ex 19:9 ), mas ao ver que o monte Sinai fumegava e tremia grandemente, o povo teve medo de Deus e não quiseram ouvir a sua voz ( Ex 20:19 ). Foi quando Moisés alertou-os: “Não temais, Deus veio para vos provar...” ( Ex 20:20 ).

O que Deus se propôs fazer que o povo de Israel não podia temer? Pelo texto fica claro que Deus somente queria lhes falar, e a palavra do Senhor tinha o fito de que cressem n’Ele, ou seja, para que não pecassem contra o Senhor ( Ex 19:9 ; Ex 20:20 ).

A bíblia define que o ‘temor’ do Senhor é o princípio da sabedoria "O temor do SENHOR é o princípio da sabedoria..." ( Pv 1:7 e Pv 9:10 ).

O salmista Davi fez a mesma declaração: "O temor do SENHOR é o princípio da sabedoria; bom entendimento tem todos os que cumprem os seus mandamentos; o seu louvor permanece para sempre" ( Sl 111:10 ).

Como é de conhecimento comum, a poesia hebraica trabalha com paralelismo, ou rima de idéias em lugar de rimas de sons. A maioria dos paralelismos é dística, ou seja, expressam pensamentos sinônimos em cada linha. Outros são antíteses de idéias, pois a segunda linha da poesia expressa a negativa da linha precedente. Há também os paralelismos dísticos construtivos ou sintéticos, pois fortalecem um pensamento.

Há vários tipos de paralelismos, mas este não é o foco deste artigo. Se tomarmos o Salmo 111, verso 10, é possível verificar que se trata de um tipo de paralelismo dístico. A idéia que a frase: ‘O temor do Senhor é o princípio da sabedoria’, procura transmitir é a mesma idéia proposta na frase: ‘Bom entendimento tem todos os que cumprem os seus mandamentos’, ou na frase: ‘O seu louvor permanece para sempre’.

Crer na palavra é a obra sobre excelente de Deus ( Jo 6:29 ). É da sua palavra que procede o verdadeiro louvor que dura para sempre "Então creram nas suas palavras, e cantaram os seus louvores" ( Sl 106:12 ); "Com o fim de sermos para louvor da sua glória, nós os que primeiro esperamos em Cristo" ( Ef 1:12 ). Todos que crêem (esperam em Cristo), são novas criaturas criadas para louvor da glória de Deus.

O temor do Senhor é o princípio da sabedoria porque Cristo é a sabedoria de Deus, o verbo de Deus, a palavra encarnada "Mas vós sois dele, em Jesus Cristo, o qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção" ( 1Co 1:30 ).

Cristo é a fonte de água que jorra para a vida eterna, e quem n’Ele crê, ainda que esteja morto, obtém vida. Quando lemos que o temor do Senhor é fonte de vida e que livra o homem das amarras da morte, isto significa que Cristo livra o homem do pecado "O temor do SENHOR é fonte de vida, para desviar dos laços da morte" ( Pv 14:27 ).

Somente Cristo tem poder de perdoar pecado, pois Ele é a misericórdia e a verdade de Deus demonstrada aos homens. Somente o Verbo encarnado desvia os homens do pecado "Pela misericórdia e verdade a iniqüidade é perdoada, e pelo temor do SENHOR os homens se desviam do pecado" ( Pv 16:6 ).

Novamente o salmista utiliza o paralelismo dístico neste verso: "Confirma a tua palavra ao teu servo, que é dedicado ao teu temor" ( Sl 119:38 ), para estabelecer a relação ‘palavra’ e ‘temor’. O salmista aguardava que Deus confirmasse a sua promessa, pois era dedicado à sua palavra. A relação temor, palavra e juízo estão intimamente ligados "O temor do SENHOR é limpo, e permanece eternamente; os juízos do SENHOR são verdadeiros e justos juntamente" ( Sl 19:9 ).

Quando Salomão disse: "No temor do SENHOR há firme confiança e ele será um refúgio para seus filhos" ( Pv 14:26 ), ele também fez uso da palavra ‘temor’ para demonstrar a imutabilidade da palavra de Deus. O homem deve confiar na palavra do Senhor, pois ela é firme, imutável. É na palavra do Senhor que os que crêem se refugiam ( Hb 6:18 compare com Pv 14:26 ).

Quando lemos: "Vinde, meninos, ouvi-me; eu vos ensinarei o temor do SENHOR" ( Sl 34:11 ), vemos o salmista fazendo um convite solene para que o ouvissem, pois seria ensinado a palavra do Senhor. Do mesmo modo, o salmista queria que o Senhor lhe ensinasse, pois o caminho do Senhor é a verdade da palavra de Deus. Cristo é o caminho, e todos que crêem andam n’Ele "Ensina-me, SENHOR, o teu caminho, e andarei na tua verdade; une o meu coração ao temor do teu nome" ( Sl 86:11 ; Jo 14:6 ).

Jesus é o caminho, a verdade e a vida, ou seja, Ele é o temor do Senhor. Quando o salmista ora pedindo: “Une o meu coração ao temor do teu nome” ( Sl 86:11 ), Ele ora para que Deus lhe conceda ser um com a palavra da verdade ( Sl 119:11 ; Pv 4:4 ).

O profeta Isaias ao falar do Messias prometido anunciou: "E repousará sobre ele o Espírito do SENHOR, o espírito de sabedoria e de entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito de conhecimento e de temor do SENHOR" ( Is 11:2 ). O Espírito do Senhor, que também é Espírito de sabedoria e entendimento, Espírito de conselho e fortaleza, Espírito de conhecimento e de temor, repousou sobre o Messias. Deste modo fica demonstrado que, o temor do Senhor é o mesmo que a palavra do Senhor.

Porém, há aqueles que querem se aproximar de Deus com um ‘temor’ expúrio, como era o caso do povo de Israel "Porque o Senhor disse: Pois que este povo se aproxima de mim, e com a sua boca, e com os seus lábios me honra, mas o seu coração se afasta para longe de mim e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, em que foi instruído" ( Is 29:13 ).

Treme terra

Se o temor do Senhor é o mesmo que a Sua palavra, o que é tremor? "Adorai ao SENHOR na beleza da santidade; tremei diante dele toda a terra" ( Sl 96:9 ); "Servi ao SENHOR com temor, e alegrai-vos com tremor" ( Sl 2:11 ).

O que o apóstolo Paulo quis dizer com: ‘... operai a vossa salvação com temor e tremor’? ( Fl 2:12 ) De onde o apóstolo Paulo tirou esta linguagem? Provavelmente das Escrituras, como se lê: “Ao SENHOR dos Exércitos, a ele santificai; e seja ele o vosso temor e seja ele o vosso assombro” ( Is 8:13 ).

Como se santificar ao Senhor dos Exércitos? Sendo Ele o temor e o assombro, ou melhor, temor e tremor!

Como é possível ao homem operar a salvação? Com temor e tremor, ou seja, o homem opera a salvação obedecendo (tremor) a palavra do Senhor (temor).

O homem serve ao Senhor através da sua palavra (temor), e em obedecê-lo (tremor) há bem-aventurança (alegria) "Ouvi a palavra do SENHOR, os que tremeis da sua palavra. Vossos irmãos, que vos odeiam e que para longe vos lançam por amor do meu nome, dizem: Seja glorificado o SENHOR, para que vejamos a vossa alegria; mas eles serão confundidos" ( Is 66:5 ; Sl 2:11 ).

Novamente as palavras ‘temor’ e ‘tremor’ são utilizadas para descrever respectivamente a ‘palavra do Senhor’ e ‘obediência’“Minha aliança com ele foi de vida e de paz, e eu lhas dei para que temesse; então temeu-me, e assombrou-se por causa do meu nome” ( Ml 2:5 ).

Conclusão

Após este pequeno estudo é possível deixar claro que a palavra de Deus não possui contradição alguma. Que em temor e tremor não há paradoxo algum.

Temor e tremor não coadunam com as perspectivas filosóficas que há no mundo, pois a palavra de Deus somente se discerne espiritualmente.

Mas, como discernir ‘espiritualmente’ a palavra de Deus? O apóstolo Paulo demonstra que é necessário comparar ‘coisas espirituais com as espirituais’, ou seja, para discernir o ‘temor’ do Senhor conforme o recomendado pelo apóstolo Paulo, ‘espiritualmente’, basta comparar o Pentateuco com os Salmos, Provérbios com os Profetas, os Profetas com os Evangelhos, os Salmos com as cartas do Novo Testamento, Antigo Testamento com o Novo Testamento, pois a palavra de Deus se auto-explica ( 1Co 2:13 ).

Nunca se deve interpreta a bíblia a partir de experiências pessoais. Jamais a angustia, a desilusão, o medo e o tremor do homem devem ser utilizados como base para se analisar a palavra de Deus.

Crer em Deus não é um ‘salto de fé’, não é um ‘comprometimento com o absurdo’. Ora, tal posicionamento demonstra que se desconhece a natureza da fé.

O escritor aos Hebreus diz exatamente o contrário: "ORA, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem" ( Hb 11:1 ). O salto de fé é inconsistente, pois a fé é o firme fundamento daquilo que se espera. A fé é prova cabal do que não se vê.

A fé não é o mesmo que crença. A fé refere-se à promessa de Deus. Fé é o mesmo que ‘temor’, pois, por meio da fé, que é dom de Deus, os antigos alcançaram testemunho ( Jd 1:3 ; Gl 3:23 ).

Por intermédio de quem Abraão alcançou bom testemunho? Não foi por causa do Descendente, que é Cristo? Cristo não é a fé que havia de se manifestar? Ou seja, os antigos alcançaram bom testemunho por meio do Descendente, a fé que havia de se manifestar.

Quando Judas concita os cristãos a batalhar pela fé, ele tinha em mente a verdade do evangelho, o temor do Senhor ( Jd 1:3). Da mesma forma a fé foi primeiramente anunciada a Abraão, quando Deus disse: “Todas as nações serão benditas em ti” ( Gl 3:8 ), pois somente com a vinda do Descendente, que é Cristo, a fé foi manifesta aos homens ( Gl 3:16 e Gl 3:23 ).

A fé, o temor, o evangelho identificam-se com a pessoa do Cristo, e, portanto, a fé que foi manifesta aos homens é firme, inabalável, âncora da alma, verdadeira, etc.

O pressuposto de que a fé é impossível se houver provas e certezas e inconcebível. Admitir que há riscos na fé é inaceitável! A concepção que demonstra não haver necessidade de provas para que a pessoa possa crer e viver a fé não é bíblica.

A esperança proposta em Cristo é ancora da alma, ou seja, segura e firme, pois por duas coisas imutáveis Deus se interpôs com juramento: a) Deus é imutável, e; b) Deus não pode mentir ( Hb 6:18 ). De qual prova o homem necessita? Onde há segurança maior?

A filosofia existencialista de Soren Kierkegaard não soube distinguir a verdadeira natureza da fé na obra ‘Temor e tremor’. Quando Abraão ofereceu o seu filho em sacrifício, segundo a ordem divina, já havia recobrado em figura o seu filho dentre os mortos, pois teve por firme a palavra que diz: “Em Isaque será chamada a tua descendência” ( Hb 11:18 -19).

Através do temor do Senhor, que diz: ‘Em Isaque será chamada a tua descendência’, Abraão ‘tremeu’ e ofereceu Isaque em sacrifício “Ouvi a palavra do Senhor, vos que tremeis da sua palavra...” ( Is 66:5 ).

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