"Foi Roboão a Siquém, porque todo o Israel se reuniu lá,
para o fazer rei. Tendo Jeroboão, filho de Nebate, ouvido isso (pois estava
ainda no Egito, para onde fugira da presença do rei Salomão, onde habitava e
donde o mandaram chamar), veio com toda a congregação de Israel a Roboão, e lhe
falaram: Teu pai fez pesado o nosso jugo; agora, pois, alivia tu a dura
servidão de teu pai e o seu pesado jugo que nos impôs, e nós te
serviremos." (1 Rs 12.1-4)
Roboão, filho de Salomão, assumiu o lugar de seu pai quando
tinha a idade de 41 anos (2 Cr 12.13). Podemos afirmar que se tratava de um
jovem rei. De início o novo monarca precisou lidar com as reivindicações do
povo, que reclamava do pesado jugo a que fora submetido. O referido jugo pode
ser entendido como trabalho forçado (2 Cr 10.18) ou uma alta carga de impostos.
Diante do pedido do povo, a atitude do rei foi inicialmente
sensata, digna de um governante prudente:
"Ele lhes respondeu: Ide-vos e, após três dias, voltai a
mim. E o povo se foi." (1 Rs 12.5)
Ao assumir uma liderança, seja ela em qualquer nível, é comum
que os líderes tenham uma certa preocupação em agradar o povo, e em buscar
meios de promover a sua aceitação imediata. Neste momento muitos falham, pois
no desejo de agradar e ser aceito, acabam atendendo algumas solicitações do
povo sem analisar melhor a questão.
No caso de Roboão, ele não se afobou, antes pediu um prazo
para pensar e decidir sobre a questão. A alteração na carga de trabalho ou de
impostos teria que ser avaliada, e as consequências administrativas, econômicas
e sociais precisariam ser analisadas. Os efeitos de uma decisão precisam ser
pensados a curto, médio e longo prazo. O passo seguinte de Roboão dentro do
tempo pedido foi o de consultar os homens idosos que faziam parte do grupo de
conselheiros de seu pai.
"Tomou o rei Roboão conselho com os homens idosos que
estiveram na presença de Salomão, seu pai, quando este ainda vivia, dizendo:
Como aconselhais que se responda a este povo?" (1 Rs 12.6)
Um jovem e sábio líder terá ao seu lado idosos experientes,
que poderão lhe auxiliar das mais diversas formas e maneiras, principalmente na
condição de conselheiros. Fico impressionado com líderes jovens que não
conseguem enxergar o valor dos idosos. Conheço o caso de um companheiro que ao
assumir uma congregação percebeu que havia vários diáconos e presbíteros
idosos. Expressando um certo ar de preocupação, perguntou ao pastor presidente:
- Eu não sei o que vou fazer com tantos velhos. Igual a este jovem líder e
obreiro, há muitos precisando entender e descobrir o valor do
"velhos".
Roboão, até então, parecia estar indo na direção certa.
Diante de seu pedido, os conselheiros idosos responderam:
"Eles lhe disseram: Se, hoje, te tornares servo deste
povo, e o servires, e, atendendo, falares boas palavras, eles se farão teus
servos para sempre." (1 Rs 12.7)
A resposta dos anciãos precisa ser bem entendida. Em primeiro
lugar, encontramos nesse texto o princípio da liderança servidora, que será
ampliado nos ensinos e vida de Jesus. O rei não deveria ter uma postura
dominadora, mas servidora. Deveria ser alguém que estivesse disposto a colocar
os interesses do povo antes dos seus próprios interesses. Há nos dias atuais
uma geração de líderes e obreiros que só pensam em seu próprio bem-estar, e no
bem-estar da sua família, não se importando com o povo. Não é difícil
percebê-los. Quando alguém ousa questioná-los, logo se escondem, se defendem e
se protegem por trás do manto do "ungido". Em última instância, tenho
a certeza que Deus tratará com os tais líderes que assim procedem. A rica
sabedoria do conselheiros idosos deixa claro que o serviço voluntário é algo
que se conquista. A verdadeira liderança não se sustenta no cargo ou no título
do líder, mas em sua disposição de servir e amar o povo, de pensar nas pessoas
antes das coisas. De enxergar e tratar gente, como gente deve ser tratada.
Em segundo lugar, o conselho de "falar boas
palavras" não implica que o líder sempre deva atender e agradar ao povo.
As boas palavras aqui implicam uma questão de justiça. Nem sempre aquilo que o
povo pensa ser o melhor pra si, na realidade o é. A percepção e visão do povo
nem sempre é sistêmica, ou seja, nem sempre contempla e considera todas as
partes, e as consequências envolvidas na decisão ou escolha a ser tomada.
Quando geralmente um grupo procura um líder para fazer uma solicitação, essa
solicitação na maioria dos casos visa apenas o melhor par ao próprio grupo. Um
líder, antes de atender positivamente um pedido de determinado grupo, precisar
analisar as consequências para os demais grupos, e para o trabalho como um
todo. Na ânsia de agradar grupos específicos, muitos líderes comprometeram a
saúde administrativa e até espiritual da obra. Quando um líder e obreiro não
consegue dizer um "não", justificando plausivelmente sua decisão,
logo promoverá confusão e perderá o controle em sua gestão. Há casos em que o
medo de responder negativamente ao povo está associado ao medo de perder
liderados, membros ou congregados. Para fecharmos este ponto, duas coisas precisam
ser consideradas e lembradas: o pedido do povo é justo? a solução promoverá um
bem maior para todos?
"Porém ele desprezou o conselho que os anciãos lhe
tinham dado e tomou conselho com os jovens que haviam crescido com ele e o
serviam. E disse-lhes: Que aconselhais vós que respondamos a este povo que me
falou, dizendo: Alivia o jugo que teu pai nos impôs?" (1 Rs 12.8-9)
É a partir deste ponto que a insensibilidade e insensatez de
Roboão se manifestam. Ele simplesmente desprezou o sábio conselho dos homens
idosos, e se voltou agora para buscar orientação com os conselheiros jovens.
Voltemos a fazer aqui algumas considerações. Primeiro, o fato de um líder ser
jovem, como no caso de Roboão, não significa que todos os líderes jovens são
insensíveis e insensatos. Conheço lideranças jovens e sábias, que não abrem mão
de bons conselhos. Segundo, nem todo conselho que vem de idosos significa que é
bom para o momento e circunstâncias. Idosos também podem falhar em suas
análises dos fatos. É preciso que o líder sempre pondere sobre o que escuta,
para depois buscar a ação necessária. Terceiro, percebemos no texto que Roboão
tinha conselheiros idosos e jovens. Essa mescla é muito boa. Todo líder deveria
ter ao seu lado conselheiros e assessores com idade, formação e outras
características diversificadas, pois desta forma poderia ter opiniões que
contemplariam um mesmo problema e alternativas de soluções por vários ângulos e
visões distintas. Assim, como nem todo conselho de um idoso é bom, nem todo
conselho de um jovem é ruim. Idosos e jovens se completam, e quando há o
respeito e a consideração entre ambos, grandes ideias e ações brotam. No caso
dos jovens procurados por Roboão, a insensibilidade e a insensatez
prevaleceram:
"E os jovens que haviam crescido com ele lhe disseram:
Assim falarás a este povo que disse: Teu pai fez pesado o nosso jugo, mas tu
alivia-o de sobre nós; assim lhe falarás: Meu dedo mínimo é mais grosso do que
os lombos de meu pai. Assim que, se meu pai vos impôs jugo pesado, eu ainda
vo-lo aumentarei; meu pai vos castigou com açoites, porém eu vos castigarei com
escorpiões." (1 Rs 12.10-11)
O justo pedido do povo não foi atendido, pior, a decisão do
rei Roboão implicaria em mais injustiça, opressão e exploração:
"Veio, pois, Jeroboão e todo o povo, ao terceiro dia, a
Roboão, como o rei lhes ordenara, dizendo: Voltai a mim ao terceiro dia. Dura
resposta deu o rei ao povo, porque desprezara o conselho que os anciãos lhe
haviam dado; e lhe falou segundo o conselho dos jovens, dizendo: Meu pai fez pesado
o vosso jugo, porém eu ainda o agravarei; meu pai vos castigou com açoites; eu,
porém, vos castigarei com escorpiões." (1 Rs 12.12-14)
Diante dos fatos, o pior aconteceu, uma indignação geral
desencadeou um processo que culminou na divisão do reino:
"Vendo, pois, todo o Israel que o rei não lhe dava
ouvidos, reagiu, dizendo: Que parte temos nós com Davi? Não há para nós herança
no filho de Jessé! Às vossas tendas, ó Israel! Cuida, agora, da tua casa, ó
Davi! Então, Israel se foi às suas tendas." ( 1 Rs 12.15-16)
Quando analisamos todo o acontecimento, dois textos nos
chamam a atenção:
"O rei, pois, não deu ouvidos ao povo; porque este acontecimento
vinha do SENHOR, para confirmar a palavra que o SENHOR tinha dito por
intermédio de Aías, o silonita, a Jeroboão, filho de Nebate." (1 Rs 12.15)
"Assim diz o SENHOR: Não subireis, nem pelejareis contra
vossos irmãos, os filhos de Israel; cada um volte para a sua casa, porque eu é
que fiz isto. E, obedecendo eles à palavra do SENHOR, voltaram como este lhes
ordenara." (1 Rs 12.24)
Longe de promover qualquer tipo de rebeldia e divisão, a
lição que extraímos dos versículos acima citados, que claramente afirmam que
este "acontecimento vinha do SENHOR", e que "Ele é que fez
isto", é a de que Deus trata com lideranças e líderes insensíveis e
insensatos das mais diversas formas e maneiras.
Fica aqui o alerta para a atual geração de líderes!
Autor: Altair Germano
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