1. Sexto
mandamento: “Não assassinarás” (Êxodo 20:13);
2. Deus
institui a pena de morte para diversos crimes (Êxodo 21:12-16; 22:19; Levítico
20:10-21; Deuteronômio 13:1-10; 18:20-22; 22:22; 24:7; etc.);
3. Deus
mandou o exército israelita matar os cananitas (Deuteronômio 7:1-2; 20:16-18).
4.
É
importante ressaltar que o Antigo Testamento faz diferença entre
“assassinar” e “matar”:
- “Assassinar” (רצח – ratsach)
é quando o indivíduo tem intenção de tirar a vida do outro e premedita o
crime, como quando Caim premeditou assassinar seu irmão Abel, levando-o
para um lugar afastado, onde ele não teria a quem pedir ajuda (Gênesis
4:8). Isso a Bíblia condena em Êxodo 20:13.
- “Matar” (מות – muwth)
é quando é um acidente, isto é, quando a pessoa não tem a intenção de
tirar a vida do próximo. Em Deuteronômio 19:5, Moisés dá um exemplo disso:
“Por exemplo, se um homem for com o seu amigo cortar lenha na floresta e,
ao levantar o machado para derrubar uma árvore, o ferro escapar e atingir
o seu amigo e matá-lo, ele poderá fugir para uma daquelas cidades para
salvar a vida.”
Vamos
ver agora o caso de legítima defesa:
“Se o ladrão que for pego arrombando
for ferido [נכה – nakah: “ser ferido ou golpeado; receber uma
pancada”] e morrer [מות – muwth: “morrer”], quem o feriu não será
culpado de homicídio [דם – dam: “(culpado de) sangue”], mas se isso
acontecer depois do nascer do sol, será culpado de homicídio [דם – dam:
“(culpado de) sangue”]” (Êxodo 22:2-3, NVI)
Depois
do “nascer do sol” indica um julgamento diferente daquele permitido à
noite. À noite é mais difícil discernir se o intruso é um ladrão ou um
assassino. Além disso, a noite torna mais difícil a tarefa de se defender e, ao
mesmo tempo, evitar matar o ladrão. Durante o dia, seria melhor se esconder ou
fugir e pedir ajuda (cf. Provérbios 22:3; 27:12), caso contrário, a defesa se
torna vingança; logo, configuraria crime de assassinato, pois o ato seria
premeditado. Aqui, duas coisas precisam ser levadas
em conta:
1. Nenhum
texto no Antigo Testamento autoriza o civil a carregar armas; afinal,
para se defender, qualquer objeto ou até mesmo a própria força
física poderia servir como meio de defesa;
2. Existe
diferença entre “legítima defesa” e “justiça com as próprias mãos”. No primeiro
caso, a morte do criminoso resulta de um acidente. Ou seja, a
vítima só estava se defendendo e, sem querer, acabou matando o
bandido. No segundo caso, a vítima ou algum parente dela decide, por vingança,
deliberada e premeditadamente tirar a vida do bandido, o que é absolutamente
errado, pois é crime de assassinado (Êxodo 20:13). O AT diz claramente que não
devemos nos vingar: “Não diga: ‘Eu o farei pagar pelo mal que me fez!’ Espere
pelo Senhor, e ele dará a vitória a você” (Provérbios 20:22). [E o NT diz:
“Amados, nunca procurem vingar-se, mas deixem com Deus a ira, pois está escrito:
‘Minha é a vingança; eu retribuirei’, diz o Senhor” (Romanos 12:19; cf.
Deuteronômio 32:35).]
Como nós não vivemos na época da Antiga Aliança, não estamos sujeitos à essas leis. Afinal, Cristo nos libertou da antiga Lei e agora pertencemos a Ele e estamos sujeitos às Suas leis: “Assim, meus irmãos, vocês também morreram para a Lei, por meio do corpo de Cristo, para pertencerem a outro, àquele que ressuscitou dos mortos, a fim de que venhamos a dar fruto para Deus” (Romanos 7:4).
Na
Nova Aliança, aprendemos que (assim como no Antigo Testamento) só o Governo tem
a autorização de Deus para punir os malfeitores (Romanos
13:1-8). Os civis não são o Governo, são pessoas “comuns”, e, por isso, não
devem matar premeditadamente a ninguém
(inocente ou culpado), pois isso seria assassinato (Mateus
26:52; 2 Coríntios 10:4); salvo, é claro, casos de legítima defesa (lembre-se
de que matar em legítima defesa, de acordo com a Bíblia, significa matar
acidentalmente quando a vítima tenta se defender; nada tem a ver com matar
propositalmente o bandido).
Mas, então, é
permitido aos cristãos portar armas?
Não
existe nenhuma passagem no Novo Testamento que diga que os cristãos civis podem
ou devem andar armados. Como foi dito mais acima, em
casos de legítima defesa, qualquer objeto pode virar uma “arma” de defesa
pessoal, desde que não seja usado com o objetivo de tirar a vida do bandido.
Afinal, legítima defesa é quando a morte do bandido resulta de um acidente.
Quem carrega um revólver e puxa o gatilho contra o próximo, por exemplo,
sabe que isso poderá resultar na sua morte (principalmente se for disparado
contra alguma região vital do corpo). Logo, neste caso, de acordo com a Bíblia,
não se trata de legítima defesa, mas sim de assassinato, pois é um ato
consciente e premeditado.
Jesus
disse:
“Bem-aventurados os pacificadores, pois
serão chamados filhos de Deus.” (Mateus 5:9)
Esta
sétima bem-aventurança estabelece uma relação de interdependência entre duas
qualificações: a de pacificador e a de ser filho de Deus. Ser pacificador é ser
filho de Deus, e vice-versa. É evidente que não é pacificador aquele que, não
sendo uma autoridade, carrega ou possui uma arma. Sua clara intenção é, no
mínimo, revidar qualquer agressão ou ameaça.
“Vocês ouviram o que foi dito: ‘Olho
por olho e dente por dente’. Mas eu lhes digo: Não resistam ao perverso. Se
alguém o ferir na face direita, ofereça-lhe também a outra.” (Mateus 5:38-39)
O
princípio de Jesus é o da não-violência, “pois a ira do homem não produz a
justiça de Deus” (Tiago 1:20).
O
apóstolo Paulo disse que a autoridade “não porta a espada sem motivo”, pois é
“serva de Deus, agente da justiça para punir quem pratica o mal” (Romanos
13:4). Pedro também disse: “Por causa do Senhor, sujeitem-se a toda autoridade
constituída entre os homens; seja ao rei, como autoridade suprema, seja aos
governantes, como por ele enviados para punir os que praticam o mal e honrar os
que praticam o bem. Pois é da vontade de Deus que, praticando o bem, vocês
silenciem a ignorância dos insensatos” (1 Pedro 2:13-15). Portanto,
somente a autoridade pode usar armas, e com o fim exclusivo de defender a
sociedade contra os malfeitores. Nada é dito sobre civis portarem armas.
Alguns textos
bíblicos apoiam o porte de arma para civis?
Muitas pessoas, para negar as evidências bíblicas contrárias ao porte de arma dos cidadãos “comuns”, descontextualizam Lucas 22:36. Vamos ver o contexto:
“35 Então Jesus lhes perguntou: ‘Quando eu os enviei sem bolsa, saco de viagem ou sandálias, faltou-lhes alguma coisa?’ ‘Nada’, responderam eles.
36 Ele
lhes disse: ‘Mas agora, se vocês têm bolsa, levem-na, e também o saco de
viagem; e se não têm espada, vendam a sua capa e comprem uma.
37 Está
escrito: ‘E ele foi contado com os transgressores’; e eu lhes digo que isto
precisa cumprir-se em mim. Sim, o que está escrito a meu respeito está para se
cumprir’.
38 Os discípulos disseram: ‘Vê, Senhor, aqui estão duas espadas’. ‘É o suficiente!’, respondeu ele.” (Luca 22:35-38, NVI)
Jesus exortou a Seus apóstolos que providenciassem duas espadas, não para autodefesa, afinal, nem Jesus – que pretendia se entregar livremente –, nem seus apóstolos – que fugiriam ilesos, como a Escritura profetizava (Zacarias 13:7; Marcos 14:27), e Jesus sabia disso –, precisavam se defender de algo. Como Jesus deixou claro, as espadas eram para que se cumprisse a profecia de Isaías 53:12, que dizia: “E Ele foi contado com os transgressores”. Perceba que se Jesus estava sendo contado entre os transgressores, então os seus apóstolos estavam cometendo uma transgressão. Qual? Eles carregavam armas e um deles a usou para ferir alguém propositalmente, o que a Escritura não permite aos civis. Somente a autoridade tinha o aval de Deus para carregar espadas com o objetivo de punir os malfeitores.
É um erro crasso imaginar que uma espada só servia para matar. A espada tem função de matar somente quando está nas mãos da autoridade, mas nas mãos de um civil a espada tem outra função. Os discípulos carregarem duas espadas não seria algo incomum, pois o historiador judeu Flávio Josefo, no seu livro The Jewish War, diz que era bastante comum judeus da região da Galiléia carregarem armas. Uma espada não servia apenas para matar; poderia ter vários fins, como, por exemplo, ir abrindo caminho numa mata fechada, nas inúmeras jornadas que eles faziam.
Quando
Jesus foi abordado no jardim de Getsêmani, Pedro usou uma dessas espadas
para decepar a orelha de Malco. O que Jesus disse nessa ocasião está
registrado em Mateus 26:52: “Devolve a espada ao seu lugar, pois todos os que
tomarem a espada perecerão pela espada”. Sim, Jesus os ensinou que, não
importava a situação, eles nunca deveriam recorrer à violência, mas serem
sempre pacíficos. Observe também que havia duas espadas, mas apenas Pedro
fez uso de uma delas. Isso mostra que Jesus também tinha por objetivo ensinar
essa grande lição ao Seu discípulo que tinha temperamento forte, pois ele
enfrentaria situações injustas e desesperadoras também, em que seria vítima de
calúnias, perseguições e agressões de toda sorte e deveria aguentar o
sofrimento com paciência. E Pedro aprendeu a lição, pois em sua primeira carta
aconselhou os irmãos a sofrerem com paciência, assim como Jesus
sofreu: “Porque é louvável que, por motivo de sua consciência para com
Deus, alguém suporte aflições sofrendo injustamente. Pois que vantagem há em
suportar açoites recebidos por terem cometido o mal? Mas se vocês suportam o
sofrimento por terem feito o bem, isso é louvável diante de Deus.
Para isso vocês foram chamados, pois também Cristo sofreu no lugar de vocês, deixando-lhes exemplo, para que sigam os seus passos” (1 Pedro 2:19-21).
É interessante notar que no Evangelho de Lucas os discípulos até perguntam a Jesus se deveriam atacar os inimigos com as espadas e, antes que Jesus tivesse tempo de responder, o impulsivo Pedro atacou Malco, mas logo Jesus respondeu “Basta!”: “Ao verem o que ia acontecer, os que estavam com Jesus lhe disseram: ‘Senhor, atacaremos com espadas?’ E um deles feriu o servo do sumo sacerdote, decepando-lhe a orelha direita. Jesus, porém, respondeu: ‘Basta!’ E tocando na orelha do homem, ele o curou” (Lucas 22:49-51). Logo, usar esse texto para defender o porte de arma para a população civil é realmente intrigante, porque o texto, dentro do contexto, mostra que Jesus reprovou a violência de Pedro.
Ademais, Jesus mesmo disse que Seu Reino não era deste mundo, portanto, Seus servos não precisariam lutar para impedir que O prendessem: “Disse Jesus: ‘O meu Reino não é deste mundo. Se fosse, os meus servos lutariam para impedir que os judeus me prendessem. Mas agora o meu Reino não é daqui’” (João 18:36).
Imaginar
que Jesus mandou Seus apóstolos comprarem espadas para defende-Lo é
simplesmente uma blasfêmia (João 10:17-18)! Além disso, como dois homens com
espadas lutariam contra uma multidão com espadas e varas
(Lucas 22:52-53; Mateus 26:55)?
Jesus
disse ainda a Pedro:
“Você acha que eu não posso pedir a meu
Pai, e ele não colocaria imediatamente à minha disposição mais de doze legiões
de anjos? Como então se cumpririam as Escrituras que dizem que as coisas
deveriam acontecer desta forma?” (Mateus 26:53-54)
Jesus
poderia pedir ajuda ao Pai, e então Ele Lhe mandaria, imediatamente, mais
de doze legiões de anjos para salvá-lo! Isso evidencia que o Pai, de
modo algum, forçou Jesus a sacrificar-se pela humanidade; ao contrário, foi
Jesus que, livremente, decidiu cumprir o plano do Pai, para que assim as
Escrituras se cumprissem. De fato, em outra passagem da Escritura, Jesus disse:
“Por isso é que meu Pai me ama, porque eu dou a minha vida para retomá-la.
Ninguém a tira de mim, mas eu a dou por minha espontânea vontade.
Tenho autoridade para dá-la e para retomá-la. Esta ordem recebi de meu Pai”
(João 10:17-18; cf. Efésios 5:2).
Jesus
recusou a ajuda dos anjos, e com maior razão rejeitou a proteção dos homens. A
Bíblia diz: “Assim diz o Senhor: ‘Maldito é o homem que confia nos homens, que
faz da humanidade mortal a sua força, mas cujo coração se afasta do Senhor’”
(Jeremias 17:5). É impensável ao menos sugerir que Jesus estivesse querendo que
Seus apóstolos o defendessem. “É melhor buscar refúgio no Senhor do que confiar
nos homens” (Salmos 118:8).
Em Lucas 14:31-32, Jesus diz:
“Ou, qual é o rei que, pretendendo sair à guerra contra outro rei, primeiro não se assenta e pensa se com dez mil homens é capaz de enfrentar aquele que vem contra ele com vinte mil? Se não for capaz, enviará uma delegação, enquanto o outro ainda está longe, e pedirá um acordo de paz.”
É claro que Jesus, que é Deus presciente (João 1:1-14; 21:17), sabia que os Seus inimigos formavam uma multidão, que vinha para Lhe atacar com espadas e varas. Ele sabia muito bem que com apenas dois discípulos armados não poderia ir para a “guerra”.
Em Lucas 22:52-53, Jesus pergunta aos Seus inimigos: “Então Jesus disse aos chefes dos sacerdotes, aos oficiais da guarda do templo e aos líderes religiosos que tinham vindo procurá-lo: ‘Estou eu chefiando alguma rebelião, para que vocês tenham vindo com espadas e varas? Todos os dias eu estava com vocês no templo e vocês não levantaram a mão contra mim. Mas esta é a hora de vocês — quando as trevas reinam’”. Não, o Senhor não estava chefiando nenhuma rebelião. Ele não era um bandido. Para que, então, Ele pediu que Seus discípulos portassem espadas? Para abrir caminho e/ou dar a Pedro uma lição, e a fim de que assim a profecia de Isaías se cumprisse. Não há outra explicação plausível.
Temos
que levar em conta ainda que Jesus e Seus apóstolos eram judeus e viviam na
época da Antiga Aliança. Eles seguiam as leis do Antigo Testamento, que nunca
autorizou o porte de armas aos cidadãos comuns, mas apenas ao magistrado e ao
exército. Jesus era carpinteiro e os apóstolos que O acompanhavam eram Pedro,
João e Tiago (Mateus 26:37; Marcos 14:33), todos pescadores (Mateus
4:18-22). Nenhum deles pertencia ao exército, tampouco estava indo para uma
guerra, ou uma “rebelião”. Logo, eles não precisavam de espadas para fins
carnais (cf. Efésios 6:11-17).
Outro texto que os defensores do porte de armas para civis descontextualizam é Lucas 11:22. Vamos ver o contexto:
“14 Jesus
estava expulsando um demônio que era mudo. Quando o demônio saiu, o mudo falou,
e a multidão ficou admirada.
15 Mas
alguns deles disseram: ‘É por Belzebu, o príncipe dos demônios, que ele expulsa
demônios’.
16 Outros
o punham à prova, pedindo-lhe um sinal do céu.
17 Jesus,
conhecendo os seus pensamentos, disse-lhes: ‘Todo reino dividido contra si
mesmo será arruinado, e uma casa dividida contra si mesma cairá.
18 Se
Satanás está dividido contra si mesmo, como o seu reino pode subsistir? Digo
isso porque vocês estão dizendo que expulso demônios por Belzebu.
19 Se
eu expulso demônios por Belzebu, por quem os expulsam os filhos de vocês? Por
isso, eles mesmos estarão como juízes sobre vocês.
20 Mas
se é pelo dedo de Deus que eu expulso demônios, então chegou a vocês o Reino de
Deus.
21 ‘Quando
um homem forte, bem armado, guarda sua casa, seus bens estão seguros.
22 Mas
quando alguém mais forte o ataca e vence, tira-lhe a armadura em que confiava e
divide os despojos.
23 Aquele
que não está comigo é contra mim, e aquele que comigo não ajunta, espalha.’”
(Lucas 11:14-23)
Esta parábola também é narrada em Mateus 12:22-32 e Marcos 3:20-30. Agora que já conhecemos o contexto, vamos ver em Mateus e Marcos apenas o versículo que analisaremos logo mais:
“Ou como alguém pode entrar na casa do
homem forte e levar dali seus bens, sem antes amarrá-lo? Só então poderá roubar
a casa dele.” (Mateus 12:29)
“De fato, ninguém pode entrar na casa do homem forte e levar dali os seus bens, sem que antes o amarre. Só então poderá roubar a casa dele.” (Marcos 3:27)
Nos evangelhos
sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas), esta parábola faz parte do trecho que trata
de Belzebu (cujo nome significa “senhor da casa”), no qual os adversários
de Jesus acusam-no de ganhar o seu poder de exorcizar os
demônios por estar em aliança com Satanás.
Interpretada neste contexto, o “homem forte” representaria Satanás e o “mais forte” seria Jesus. O Senhor diz que não poderia realizar exorcismos (representado por roubar pertences do homem forte) sem que Satanás tenha tentado impedi-lo e sido derrotado (“amarrado”).
Não é incomum Jesus se comparar a um ladrão (Mateus 24:42-44; Apocalipse 16:15).
Craig S. Keener sugere que a parábola se relaciona com o senso comum de que “ninguém rouba um homem forte” [1], enquanto R. T. France e outros veem a parábola como ecoando o Livro de Isaías [2][3]:
“Será que se pode tirar o despojo dos guerreiros, ou serem os prisioneiros resgatados do poder dos violentos? Assim, porém, diz o Senhor: ‘Sim, prisioneiros serão tirados de guerreiros, e despojo será retomado dos violentos; brigarei com os que brigam com você, e seus filhos, eu os salvarei. Farei seus opressores comerem sua própria carne; ficarão bêbados com seu próprio sangue, como com vinho. Então todo mundo saberá que eu, o Senhor, sou o seu Salvador, seu Redentor, o Poderoso de Jacó.’” (Isaías 49:24-26)
Já se sugeriu que “Belzebu” significaria “casa de Baal” [3] e que a imagem da casa do homem forte seria originalmente um jogo de palavras sobre este assunto.
De
qualquer forma, não devemos usar uma parábola com uma mensagem tão clara de
Jesus derrotando Satanás e libertando o rapaz possuído como base para porte de
armas para civis. Note que o homem forte e armado é Satanás. Se andarmos
armados, não sendo autoridades ou fazendo parte do exército, nos pareceremos
com Satanás. Jesus é o homem mais forte que Satanás, mas as armas que Ele usou
para derrotá-lo não eram carnais!
Além
disso, o apóstolo Paulo afirmou que:
“Pois, embora vivamos como homens, não
lutamos segundo os padrões humanos. As armas com as quais lutamos não são
humanas; pelo contrário, são poderosas em Deus para destruir fortalezas.
Destruímos argumentos e toda pretensão que se levanta contra o conhecimento de
Deus, e levamos cativo todo pensamento, para torná-lo obediente a Cristo.” (2
Coríntios 10:3-5)
“Vistam toda a armadura de Deus, para poderem ficar firmes contra as ciladas do diabo, pois a nossa luta não é contra pessoas, mas contra os poderes e autoridades, contra os dominadores deste mundo de trevas, contra as forças espirituais do mal nas regiões celestiais. Por isso, vistam toda a armadura de Deus, para que possam resistir no dia mau e permanecer inabaláveis, depois de terem feito tudo. Assim, mantenham-se firmes, cingindo-se com o cinto da verdade, vestindo a couraça da justiça e tendo os pés calçados com a prontidão do evangelho da paz. Além disso, usem o escudo da fé, com o qual vocês poderão apagar todas as setas inflamadas do Maligno. Usem o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.” (Efésios 6:11-17)
Nenhum apóstolo andava armado e os mártires não se defendiam dos seus assassinos com “armas humanas”. Afinal, o Senhor havia dito:
“Vocês ouviram o que foi dito: ‘Ame o
seu próximo e odeie o seu inimigo’. Mas eu lhes digo: ‘Amem os seus inimigos e
orem por aqueles que os perseguem, para que vocês venham a ser filhos de
seu Pai que está nos céus. Porque ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e
derrama chuva sobre justos e injustos. Se vocês amarem aqueles que os
amam, que recompensa receberão? Até os publicanos fazem isso! E se vocês
saudarem apenas os seus irmãos, o que estarão fazendo de mais? Até os pagãos
fazem isso! Portanto, sejam perfeitos como perfeito é o Pai celestial de
vocês.’” (Mateus 5:43-48)
Enquanto
morria apedrejado, Estêvão não procurou se defender com armas humanas. Antes,
orou por seus perseguidores (Atos 7:59-60). E ele só estava seguindo o exemplo
do Mestre, que, na cruz, orou por seus assassinos, dizendo: “Pai, perdoa-lhes,
pois não sabem o que estão fazendo” (Lucas 23:34).
Paulo
e Silas foram duramente maltratados e agredidos em Filipos, e em momento algum
a Escritura diz que eles tinham alguma arma e a usaram (Atos 16:16-24).
Muitos
outros exemplos bíblicos e não-bíblicos como esses poderiam ser usados, mas
esses bastam.
O
que podemos concluir que é o cristão civil não pode portar
armas, visto que esta só pode ser portada pelas autoridades e pelo exército,
conforme a palavra de Deus ensina (Romanos 13:1-8; 1 Pedro 2:13-15). E é dever
do cristão se sujeitar as governantes e às autoridades: “Lembre a todos que
se sujeitem aos governantes e às autoridades, sejam obedientes, estejam sempre
prontos a fazer tudo o que é bom” (Tito 3:1).
Respondendo a
objeções:
1. Quem não cuida
da própria família é pior que um descrente.
“Se alguém não cuida de seus parentes,
e especialmente dos de sua própria família, negou a fé e é pior que um
descrente.” (1 Timóteo 5:8)
Muitos
usam esse texto para dizer que quem não tem uma arma em casa para defender a
família contra bandidos é pior que um descrente. Mas o contexto deste versículo
não permite concluir tamanho absurdo! Paulo disse: “Não ultrapassem o que está
escrito” (1 Coríntios 4:6). O contexto de 1 Timóteo 5:8 revela que o cuidado ao
qual Paulo se referia era o auxílio econômico para com as viúvas (1 Timóteo
5:3-16), pois muitas delas ficavam desamparadas, e a igreja – que não tinha
muitas condições – tinha que mantê-las, quando na verdade este era um
dever moral dos filhos e netos (v. 4). A igreja deveria ajudar somente aquelas
que estivessem totalmente desamparadas, não ficando, assim, sobrecarregada com
as demais: “Se alguma mulher crente tem viúvas em sua família, deve
ajudá-las. Não seja a igreja sobrecarregada com elas, a fim de que as viúvas
realmente necessitadas sejam auxiliadas” (1 Timóteo 5:16).
2. No livro de
Apocalipse, Jesus é descrito com uma foice.
Para argumentar contra os cristãos que afirmam que não imaginam Jesus andando armado por aí, muitos respondem que no Livro do Apocalipse Jesus é descrito com uma foice para matar os ímpios. Todavia, se esquecem que quando Jesus esteve na Terra, Ele era um civil, um simples carpinteiro, filho de carpinteiro (Mateus 13:55; Marcos 6:3). Como um civil, Ele não andava armado. Devemos imitar o seu exemplo (1 Coríntios 11:1; Efésios 5:1). Assim, para um cristão civil, é inadmissível andar armado.
Aqueles
que dizem “não imagino Jesus andando armado por aí” obviamente se referem ao
fato de que um cristão civil portar armas é incompatível com a
mensagem de Jesus durante Seu ministério terreno. É claro que quando o Senhor
retornar à Terra, Ele virá como Juiz, para punir os malfeitores e dar a cada um
segundo as suas obras (Apocalipse 22:12).
Portanto,
o que podemos concluir é que um civil não pode andar armado. Mas se o cristão
for policial, por exemplo, ele pode andar armado, sim, para defender a
população civil.
É um
erro muito grave não fazer distinção entre o civil e o não-civil. Para o
cristão civil, portar armas é errado. Mas para o não-civil, não. Deus, o Justo
Juiz, outorgou às autoridades humanas o direito de portar a espada para punir
os malfeitores (Romanos 13:3-5).
3. Cristão contra o
porte de armas para civis é covarde.
Tem-se
argumentado, ainda, que cristão que é contra o porte de armar é omisso e
covarde. E os covardes não vão herdar o Reino (Apocalipse 21:8).
Primeiramente,
temos que ver que a Bíblia garante salvação eterna para todos aqueles que creem
em Jesus Cristo como Senhor, Salvador e Deus (João 3:16, 36; 8:24; 20:28;
etc.), se arrependem de seus pecados e são batizados (Marcos 16:16; Atos 2:38),
confessam com a boca a Cristo como Senhor e com o coração creem que Deus O
ressuscitou dentre os mortos (Romanos 10:9) e perseveram na fé até a morte (Apocalipse
2:10). Nada na Bíblia diz que quem não porta armas é covarde e não vai para o
Céu.
Vamos analisar o texto de Apocalipse que fala sobre os covardes:
“Mas os covardes, os incrédulos,
os depravados, os assassinos, os que cometem imoralidade sexual, os que
praticam feitiçaria, os idólatras e todos os mentirosos — o lugar deles será no
lago de fogo que arde com enxofre. Esta é a segunda morte.” (Apocalipse 21:8,
NVI)
A
palavra “covardes”, que aparece em Apocalipse 21:8, vem do grego “deilos”,
que também pode ser traduzido como “medrosos” (como o faz a versão João
Ferreira de Almeida Atualizada) ou “tímidos” (como o faz a versão Almeida
Corrigida Fiel). Mas então, o que significa dizer, neste contexto, que o lugar
dos “covardes” será “no lago que arde com fogo e enxofre”?
João faz uma séria advertência aos cristãos covardes que, durante o tempo das perseguições, renunciavam a sua fé em Cristo com o intuito de preservarem suas vidas (“Pois quem quiser salvar a sua vida, a perderá, mas quem perder a vida por minha causa, a encontrará.” – Mateus 16:25). Segundo o Apóstolo, as pessoas que se comportassem assim (como covardes) estavam sentenciadas ao “lago de fogo e enxofre”.
A
lição central deste texto de Apocalipse (particularmente no que se refere aos
“covardes”) é a seguinte: Em épocas de grande perseguição e tribulação, temos
que ser corajosos na expressão da nossa fé em Cristo. É como disse o Apóstolo
Paulo, em Romanos 5:1-5: “Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz
com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo, por meio de quem obtivemos acesso pela
fé a esta graça na qual agora estamos firmes; e nos gloriamos na esperança da
glória de Deus. Não só isso, mas também nos gloriamos nas tribulações,
porque sabemos que a tribulação produz perseverança; a perseverança, um caráter
aprovado; e o caráter aprovado, esperança.
E a esperança não nos decepciona, porque Deus derramou seu amor em nossos corações, por meio do Espírito Santo que ele nos concedeu.”
Os
discípulos foram chamados de covardes:
Certa
vez, quando Jesus e Seus discípulos estavam num barco, começou uma grande
tempestade. Jesus estava dormindo e os discípulos se apavoraram. Eles estavam
com tanto medo da tempestade que despertaram Jesus e lhe perguntaram se o
Senhor não se importava que eles morressem. Ora, é claro que Jesus se
importava, e inclusive levantou-Se e repreendeu o vento e o mar, e a
tempestade se acalmou. Logo em seguida, Jesus repreendeu também os Seus
discípulos, e lhes perguntou o porquê de eles serem tão covardes [deilos]
na fé.
“Naquele dia, ao anoitecer, disse ele
aos seus discípulos: ‘Vamos atravessar para o outro lado’. Deixando a
multidão, eles o levaram no barco, assim como estava. Outros barcos também o
acompanhavam. Levantou-se um forte vendaval, e as ondas se lançavam sobre
o barco, de forma que este foi se enchendo de água. Jesus estava na popa,
dormindo com a cabeça sobre um travesseiro. Os discípulos o acordaram e
clamaram: ‘Mestre, não te importas que morramos?’ Ele se levantou,
repreendeu o vento e disse ao mar: ‘Aquiete-se! Acalme-se!’ O vento se
aquietou, e fez-se completa bonança. Então perguntou aos seus discípulos: ‘Por
que vocês estão com tanto medo [deilos]? Ainda não têm fé?’
Eles estavam apavorados e perguntavam uns aos outros: ‘Quem é este que até o
vento e o mar lhe obedecem?’” (Marcos 4:35-41, NVI; ver Mateus 8:23-27 e Lucas
8:22-25)
O
que podemos aprender com isso é que nos momentos de dificuldade devemos sempre
confiar em Deus. Afinal, não importa o tamanho das ondas, Deus está no barco!
Não sejamos covardes na fé.
Claramente,
o termo grego “deilos” não tem nada a ver com covardia de portar armas,
mas sim covardia na fé. Não é por covardia que alguns cristãos são contra o
porte de armas para civis, mas sim porque não há respaldo bíblico
para tal.
4. Se o Estado
permitir, então o cristão pode portar armas.
Um teólogo
brasileiro bastante conhecido (cujo nome não será revelado) afirmou em seu
canal no YouTube que se as leis do Estado permitirem ao cidadão andar armado,
então o cristão pode andar armado. Todavia, se esqueceu ele que não há
absolutamente nada na Escritura que embase tal pensamento. É verdade que
devemos nos submeter às autoridades governamentais do país onde vivemos
(Romanos 13:1-5), mas somente se elas estiverem de acordo com a Palavra de
Deus.
Como
frisaram Pedro e os outros apóstolos: “É preciso obedecer antes a Deus do que
aos homens!” (Atos 5:29).
Como
vimos, não há base bíblica para o armamento do civil. Portanto, ainda que o
Estado permita, o cristão não deve se submeter; antes, deve obedecer a Deus.
Não
é por que o Estado permite algo que aquilo seja realmente o certo. Nos Estados
Unidos, por exemplo, foi legalizado em todos os estados o casamento gay [4].
Deveríamos concluir que é permitido e certo para um cristão se casar com
alguém do mesmo sexo? É claro que não (veja Romanos 1:24-28; 1 Coríntios
6:9-10; 1 Timóteo 1:8-10; Apocalipse 21:8; 22:15)!
Em
diversos países, o aborto é permitido, inclusive no Brasil (em alguns casos
específicos apenas, não em todos) [5]. Será que uma mulher
cristã pode abortar? É claro que não.
Antes é preciso obedecer a Deus do que aos homens!
5. Se a polícia substitui o armamento do cidadão, então o corpo de bombeiros substitui o extintor de incêndio.
Para
defender a ideia de que cristãos civis podem andar armados, dois rapazes (cujos
nomes não serão revelados) de um conhecido canal de Teologia no YouTube
afirmaram que: “Dizer que não precisamos de armas por que temos a polícia é
como dizer que não precisamos de extintores porque temos os bombeiros”.
Essa analogia contém muitos erros:
1. Não
há comparação entre uma arma, que serve para matar, e um extintor de incêndio,
que serve para salvar vidas. Analogias devem sempre ser correspondentes, e esta
claramente não é. Ela comete a falácia da falsa
analogia [6], a qual ocorre quando os elementos comparados
têm diferenças relevantes que acabam “neutralizando” a semelhança entre ambos;
2. Não
há nada na Escritura que proíba um civil de portar um instrumento que salve
vidas. Mas nenhum texto bíblico diz que um civil pode portar armas.
Isso só é permitido às autoridades (Romanos 13:4);
3. Uma
analogia falha não pode servir como base para defender algo que a Escritura
condena.
4.
Assim, essa analogia é simplesmente ridícula.
6. Em países onde o
porte de armas é permitido aos cidadãos, a taxa de violência é menor.
Isso
pode ser verdade em relação a alguns países (não
todos). Todavia, concluir que a taxa de violência é menor devido à
liberação do porte de armas é simplesmente uma falácia da falsa causa,
como veremos a seguir [7]. A Austrália, por
exemplo, introduziu restrições duras para a posse de armas após a morte de 35
pessoas, em 1996, por um atirador. O caso criou comoção nacional e, em apenas
algumas semanas, o governo iniciou um projeto para comprar armas da população,
o que levou à redução de 750 mil armas que estavam nas mãos de civis.
O Reino Unido também adotou uma das legislações mais rígidas do mundo após um massacre em uma escola na Escócia em 1997. As armas são proibidas para a população civil. E o índice de homicídios e outros crimes é tão pequeno que até mesmo alguns setores da polícia trabalham sem elas — como os patrulheiros que fazem rondas nas ruas.
As
leis duras parecem ter sido eficazes na redução de mortes em massa, e o total
de mortes por armas é baixo em comparação com os Estados Unidos.
O
número de mortes por armas per capita nos Estados Unidos em 2012 é quase 30
vezes maior do que no Reino Unido: 2,9 a cada 100 mil em comparação a apenas
0,1.
E de todos os assassinatos cometidos nos EUA, 60% foram por arma de fogo, em comparação com apenas 10% no Reino Unido.
Então, se é para comparar a violência do Brasil com outros países, primeiramente a comparação deve ser justa. Deve-se comparar o Brasil com uma nação que também não permita aos civis portarem armas, como o Reino Unido e a Austrália, por exemplo, e não com Estados Unidos. Isso evidenciará que a menor violência em outros países não se deve ao porte de armas, mas sim a leis rígidas, entre outras razões.
O levantamento Mapa da Violência 2015, divulgado em maio, estimou que 160.036 pessoas (sendo 70% delas jovens) tenham sido poupadas de mortes por armas de fogo no Brasil entre 2004 e 2012 graças ao Estatuto do Desarmamento. O cálculo é feito a partir de projeções de quantas mortes eram esperadas (segundo análises estatísticas) para cada ano e quantas mortes de fato ocorreram.
O
problema de armar a população é que as pessoas ditas do “bem” acabam
usando a sua arma para resolver problemas pessoais (como som alto, brigas de
trânsito, problemas amorosos, problemas de estresse, etc.) que nada têm a
ver com bandidos, ou seja, resolver atritos com outras pessoas do bem.
Mas
o argumento mais forte para se restringir o acesso a armas pode não ter nada a
ver com assassinato: as grandes vítimas de armas nos Estados Unidos não foram
mortas por outros. Cometeram suicídio.
Segundo
um relatório da Universidade de Harvard de 2008, o número de suicídios superou
o de homicídios numa proporção quase de dois para um.
O
estudo diz que muitos dos 30 mil suicídios registrados todos os anos podem ser
evitados. “A pesquisa mostra que a chance de um suicida viver ou morrer está em
parte na disponibilidade de meios altamente letais, especialmente armas de
fogo”.
7. Pedro usou a
espada no momento errado, mas Jesus é a favor do armamento civil porque mandou
os apóstolos comprarem espadas.
Isso
já foi discutido com mais detalhes acima. Os cristãos que defendem o porte de
armas para civis deturpam o texto bíblico em que Jesus manda Seus apóstolos
comprarem espadas, deduzindo que espadas nas mãos de civis têm a mesma função
que espadas nas mãos de autoridades, o que não é verdade.
Segundo
eles, se Jesus mandou os apóstolos comprarem espadas, então Ele estava
aprovando e incentivando o armamento civil. Mas se esse fosse o caso, Ele
estaria indo contra a Escritura, que dizia claramente que somente as
autoridades poderiam portar armas com o objetivo de punir os malfeitores.
Soma-se a isso o fato de que, em Mateus 26:52, Jesus mandou Pedro guardar a
espada, dizendo: “Guarde a espada! Pois todos os que empunham a espada, pela
espada morrerão”.
Para
fugir da conclusão óbvia de que a Escritura não aprova o armamento civil, os
defensores desta ideia dizem que Jesus só mandou Pedro guardar a espada porque
o Apóstolo a usou em um momento inadequado e da maneira errada. Mas, se isso
for verdade, então qual seria o momento certo? Se Jesus não queria que Pedro
usasse aquela espada para defendê-lo, então por que o mandou comprá-la? Que
utilidade teria aquela espada senão autodefesa ou defesa de outrem, como os
armamentistas afirmam? Se a espada não pode ser usada por um civil para
autodefesa ou defesa de outra pessoa, como os cristãos pró armamento querem,
então que sentido faria Pedro ter uma espada? Usar esse texto para defender o
porte de armas para civis é um “tiro no pé”!
Se é certo um civil usar armas para se defender ou defender outrem, então Pedro teria usado a arma no momento oportuno. Caso contrário, qual seria o objetivo de Jesus quando mandou os apóstolos comprarem espadas? Ou aquelas espadas seriam usadas para abrir caminho e cumprir a profecia de Isaías, que afirmava que o Messias seria contado com os transgressores, ou o texto fica completamente sem sentido e Jesus acaba se contradizendo e violando a Lei Mosaica!
8. Êxodo 22:2 diz que a
vítima pode matar um ladrão em legítima defesa.
Êxodo
22:2 não diz que a vítima pode matar em legítima defesa, mas
que se o ladrão for morto acidentalmente dento
da casa da vítima e durante a noite, a vítima não seria culpada de
homicídio, pois só estava se defendendo e não teria tencionado tirar a vida do
ladrão.
A palavra hebraica usada neste texto, e que geralmente é traduzida por “ser morto” ou “morrer”, é מות (muwth), que indica que a pessoa vítima de roubo dentro de casa não teve a intenção de tirar a vida do próximo, mas que ele veio a falecer por causa das pancadas. É assim que a Bíblia define a morte por legítima defesa: quando a vítima não tira intencionalmente a vida do bandido.
Mas
mesmo que Êxodo 22:2 dissesse que o civil pode matar o bandido, isso seria
irrelevante para essa discussão, visto que já não vivemos mais debaixo da Lei
de Moisés, mas sim debaixo da lei da Nova Aliança, a Lei da Liberdade (Tiago
2:12) de Cristo Jesus (João 1:17). A Lei foi completamente cumprida na cruz
(João 19:28), e a Nova Aliança tomou o seu lugar (Hebreus 8:6-13). E
simplesmente não há base bíblica no Novo Testamento para o armamento civil (bem
como não há no Antigo Testamento).
9. Em 1 Samuel 17,
Davi usou armas contra Golias.
Os
israelitas estavam em guerra contra os filisteus. Cada exército escolheu o seu
representante. Davi usou armas porque naquele momento representava o seu povo
Israel, ou seja, fazia parte do exército. Como vimos antes, a Bíblia permite ao
exército usar armas, mas não o permite aos civis. Portanto, usar o caso de Davi
matando Golias como base para o armamento civil é insustentável. Não se
deve confundir o exército com os civis.
10. “O Senhor
treina as minhas mãos para a guerra.”
Davi
disse no Salmo 144:1: “Bendito seja o Senhor, a minha Rocha, que treina as
minhas mãos para a guerra e os meus dedos para a batalha”. Este salmo foi
entoado depois que Deus o livrou das mãos de todos os seus inimigos e das mãos
de Saul (veja 2 Samuel 22 e Salmo 18). O comentário bíblico Moody diz
que:
“O
salmista começa com um hino de louvor pela ajuda que Deus lhe tem
concedido na qualidade de guerreiro”. Portanto, usar um texto
que fala de vitória militar para dizer que a Bíblia permite aos civis andar
armados é simplesmente absurdo. O exército é uma coisa, a população civil é
outra!
11. Deus é o Senhor
dos Exércitos.
No
Antigo Testamento, Deus é muitas vezes chamado de Senhor dos Exércitos porque
guiava o exército israelita nas guerras contra os seus inimigos. Não vivemos
mais na Antiga Aliança e Israel não é mais o povo escolhido de Deus desde que
rejeitou o Messias (hoje o povo de Deus é a Igreja; veja João 1:11-13; 10:16;
Efésios 1-3; 1 Pedro 2:9-10). De qualquer forma, se Deus é o Senhor dos Exércitos,
como o título sugere, é dos Exércitos, não dos civis. Então, usar
um título de Deus que denota que Ele guiava o exército israelita para sustentar
que Ele permite o armamento civil é simplesmente desonesto.
12. Os cristãos
estão sendo massacrados pelo Estado Islâmico.
Sim,
os cristãos estão sendo massacrados pelo Estado Islâmico, infelizmente. Mas
Jesus já havia dito que isso aconteceria (Mateus 10:22; Lucas 21:17) e que
neste mundo os Seus seguidores teriam aflições (João 16:33). Então, não há
como impedir isso. Daniel disse que guerras estão decretadas até o fim (Daniel
9:26). O que os cristãos enfrentam hoje no Oriente Médio não é muito diferente
do que os primeiros cristãos enfrentaram no sinédrio judeu e no coliseu
romano.
Quando
os cristãos de Roma quiseram organizar uma rebelião, foram repreendidos pelo
apóstolo Paulo, que disse que eles deveriam se sujeitar às autoridades, e que é
função delas punir os malfeitores (Romanos 13:1-7; veja Romanos
12:19-21). Ele disse que a autoridade “não porta a espada sem motivo”,
pois “é serva de Deus, agente da justiça para punir quem pratica o mal”
(Romanos 13:4). Em momento algum o apóstolo afirmou que os civis são servos de
Deus para punir os malfeitores. Deus só autorizou a autoridade a portar
armas e com o fim exclusivo de punir os malfeitores (Romanos 13:1-8).
A
nossa autoridade é falha? Sim. Isso, todavia, não nos dá o direito de
comprarmos e portarmos armas de fogo para matar os bandidos que nos atacarem,
pois não somos policiais (exceto, é claro, se a morte do bandido ocorrer
acidentalmente, em legítima defesa; mas portar uma arma e atirar contra o
bandido para matá-lo não é legítima defesa, mas sim justiça com as próprias
mãos, haja vista que legítima defesa é quando a morte resulta por acidente, o
que não seria o caso se a pessoa atirasse para matar intencionalmente).
Lembre-se
de que o sistema de saúde público também não funciona bem no país e isso não
nos dá o direito de reivindicar para nós a autoridade de nos automedicarmos ou
nos auto-operarmos, pois não somos médicos!
13. Eu tenho
direito à autodefesa.
É
claro que tem. Todos têm. Todavia, carregar uma arma e atirar para matar, de
acordo com a Bíblia, não é legítima defesa, e sim vingança, algo
condenado por Deus (Romanos 12:19). Como foi dito mais acima, a definição
bíblica de legítima defesa é “a morte do bandido resulta de acidente”, ou seja,
quando a vítima não premedita a morte do bandido. Além disso, não há respaldo
bíblico para civil andar armado. Como já vimos, Deus só autorizou a autoridade a
portar armas e com o fim exclusivo de punir os malfeitores (Romanos 13:1-8).
14. A polícia não
está presente no momento exato em que eu preciso dela. Portanto, eu tenho
direito de ter uma arma para me defender!
Mas
o corpo de bombeiros também não está presente no momento exato em que a sua
casa pega fogo. Então que tal não chamar o corpo de bombeiros e, em vez disso,
apagar o incêndio por conta própria? Os socorristas do SAMU também não estão
por perto quando você tem um infarto na sala de casa ou quando se afoga na sua
piscina. Então, que tal, em vez de chamar o SAMU, você resolver (de alguma
forma) o seu problema por si mesmo?
As
analogias poderiam continuar, mas essas já foram o suficiente para mostrar a
irracionalidade do argumento armamentista. Nós sabemos que cada um tem a sua
profissão, e estudou muito e tem muita experiência para nos ajudar. Assim como
precisamos chamar ou ir até um profissional x quando estamos com um problema x,
precisamos chamar ou ir até a polícia quando estamos com problemas de segurança.
Quando
nosso dente está doendo, em vez de simplesmente arrancá-lo, nós mesmos
procuramos um profissional especializado no assunto, a saber, o dentista. Se o
nosso apêndice dói, em vez de arrancá-lo, nós mesmos procuramos um hospital
lotado de profissionais especializados, os médicos, que estudaram mais de uma
década e lidam diariamente com casos como esse. Se queremos construir uma casa,
logo procuramos um engenheiro e pedreiros… Mas no caso de segurança pública
criaram essa falácia de que é cada um por si, no esquema faça-você-mesmo. Que
absurdo! Será que “o cidadão de bem”, simplesmente por portar uma arma, poderá
enfrentar bandidos profissionais armados até os dentes? Como se já não
existissem profissionais especializados em lidar com esse problema, a saber, os
policiais!
Precisamos entender que mesmo que “o cidadão de bem” possa possuir e portar uma arma, ele não estará magicamente mais seguro só por isso. Por quê? Porque ele não vai andar por aí com a arma carregada e em punho – mas o bandido vai! De que adianta, então, “o cidadão de bem” ter uma arma, que provavelmente estará descarregada e guardada na cintura ou na mochila ou no porta-luvas do carro se para pegá-la, carregá-la, apontá-la para o bandido e disparar o gatilho levará alguns segundos, segundos esses nos quais o bandido, que já vem para cima da vítima com a arma carregada e em punho, apontando para a vítima, vai atirar, e, depois disso, roubar o celular, a carteira e, ironicamente, até a arma dela? Assim, a única coisa que vamos conseguir é dar aos bandidos mais armas que eles usarão para cometer mais e mais crimes.
Notas de rodapé:
[1] KEENER,
Craig S. A Commentary on the Gospel of Matthew, Wm. B. Eerdmans
Publishing, 1999, p. 364.
[2] FRANCE,
R. T. The Gospel of Matthew, Wm. B. Eerdmans Publishing,
2007, p. 481.
[3] EDWARDS,
James R. The Gospel according to Mark, Wm. B. Eerdmans Publishing,
2001, p. 121.
[4] “Numa
decisão histórica, a Suprema Corte dos Estados Unidos legalizou nesta
sexta-feira (26) [26/06/2015] o casamento entre pessoas do mesmo sexo em todo o
país. Os 13 estados que ainda proibiam não podem mais barrar os casamentos
entre homossexuais, que passam a ser legalizados em todos os 50 estados
americanos. A decisão veio por cinco votos contra quatro.”
Fonte:
[5] Art. 128 do Código Penal – Decreto Lei 2848/1940.
[6] “Numa
analogia mostra-se, primeiro, que dois objetos, a e b, são semelhantes em
algumas das suas propriedades, F, G, H. Conclui-se, depois, que como a tem a
propriedade E, então b também deve ter a propriedade E. A analogia falha quando
os dois objetos, a e b, diferem de tal modo que isso possa afetar o facto de
ambos terem a propriedade E. Diz-se, neste caso, que a analogia não teve em
conta diferenças relevantes.” (Stephen Downes)
[7] http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/11/151104_geral_controle_armas_gch_hb
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