sábado, 31 de outubro de 2015

O Halloween é mesmo uma festa americana?

Originalmente, o Halloween era um ritual dos celtas, um povo que habitou a Grã-Bretanha, Irlanda e a França entre o ano 2000 e o ano 100 antes da era cristã. Para eles, a noite de 31 de outubro, data da comemoração até hoje, era a véspera do Samhain, uma importante celebração que acontecia no dia 1 de novembro e que marcava 3 fatos importantes: o fim da colheita, o Ano-Novo celta e também o início do inverno.
A "estação da escuridão e do frio" era um período de introspecção e resguardo. Acreditava-se que o portal entre o mundo real e o mundo espiritual ficava aberto e bruxos, mortos e criaturas místicas saíam do além e vagavam pela comunidade.
A maioria das pessoas sensatas ficavam em casa, rezando pelos antepassados, mas quem tinha que sair, se vestia de morto ou bruxo para não ser notado pelos bruxos e mortos "de verdade".
Se um bruxo ou morto batesse na sua porta, teria que receber alguma comida para não amaldiçoar a casa no ano que estava começando.
Ano novo também era a época de em que as tribos pagavam tributo se tivessem sido conquistadas por outro povo. Era também o início do armazenamento de alimentos para o inverno, o retorno dos rebanhos dos pastos e o período de renovação das suas leis.
Na Europa durante a Idade Média a festa de Halloween passou a ser chamada de Dia das Bruxas e aqueles que comemoravam esta data eram perseguidos e condenados à fogueira pela Inquisição. (Kilkenny 1324)
Na Europa durante a Idade Média a festa de Halloween passou a ser chamada de Dia das Bruxas e aqueles que comemoravam esta data eram perseguidos e condenados à fogueira pela Inquisição. (Kilkenny 1324) - Foto: irishhistorypodcast
Com o objetivo de diminuir as influências pagãs na Europa Medieval, a Igreja cristianizou a festa. Samhain, dia 1 de novembro, virou Dia de Todos os Santos e foi criado também o Dia de Finados, celebrado em 2 de novembro no calendário cristão.
Dia de Todos os Santos na língua Inglesa é chamado de All Hallows e a véspera desta festa é chamada de Halloween. Em Irlandês é chamada de Oiche Shamhna - literalmente, véspera de Samhain.
Por volta do século XIX, boa parte da população Irlandesa foi embora a procura de novas oportunidades na América do Norte e a tradição da festa seguiu com eles.
Era uma festa de fantasias, fogos de artifícios e fogueiras altas. Brincadeiras com maçãs, bolos com surpresas dentro, doces e histórias de pavor contadas em voz baixa.
Snap-a Apple Night (1833), pintado por Daniel Maclise, mostra pessoas reunidas se divertindo com jogos de adivinhação em 31 de outubro na Irlanda
Snap-a Apple Night (1833), pintado por Daniel Maclise, mostra pessoas reunidas se divertindo com jogos de adivinhação em 31 de outubro na Irlanda
Já no século XX a tradição da festa recebe uma repaginada à moda americana e, com um bom marketing, conquista o mundo. Histórias de pavor contadas pelos mais velhos estavam dando lugar aos filmes de terror, as lanternas de nabos se transformaram em lanternas de abóboras (que não são nativas nem da Irlanda nem da Grã-Bretanha) e as fantasias de bruxos deram lugar a super heróis, personagens de desenhos animados e cantores famosos. A festa acabou perdendo completamente seu elo com o significado original.
Crianças vão de casa em casa para receber doces
Crianças vão de casa em casa para receber doces - Foto: George Ruiz CCBY
No Brasil a celebração do Halloween é recente. Foi chegando ao nosso país através da grande influência da cultura americana, principalmente vinda através televisão. Os cursos de língua inglesa também colaboram para a popularização da festa em território nacional, promovendo grandes festas e eventos como uma forma de vivenciar com os estudantes a "cultura norte-americana".

Da espiritualidade ao Terror modernizado

A Festa atual guarda poucas semelhanças com os rituais celtas que a inspiraram

A LANTERNA DE ABÓBORA

O símbolo mais conhecido da festa, a carranca esculpida em abóboras, representa uma antiga lenda celta: Jack, um homem mesquinho condenado a vagar pela eternidade, pediu uma brasa a um espírito maligno e a colocou dentro de um nabo para iluminar seu caminho. Com a imigração irlandesa para os Estados Unidos no século XIX, a representação da lanterna foi adaptada.
Como o nabo era difícil de ser encontrado na América, ele foi substituído pela abóbora acesa com uma vela, que ganhou o nome de Lanterna do Jack
Como o nabo era difícil de ser encontrado na América, ele foi substituído pela abóbora acesa com uma vela, que ganhou o nome de Lanterna do Jack - Foto: Foto James Jordan CCBYND

O FOGO DA RENOVAÇÃO

Na Antiguidade, o fogo era o elemento mais importante do Halloween, que coincidia com o Ano-Novo dos celtas. Na noite da celebração, em 31 de outubro, os druidas (sacerdotes desse povo), acendiam fogueiras que simbolizavam a renovação das esperanças para o ano seguinte. No topo das montanhas, o fogo também servia para espantar os espíritos.

A TROCA

Segundo a crença celta, o caos reinava na noite do Halloween. Para acalmar os espíritos despertados, era comum deixar leite e comida na porta de casa. A moda pegou nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, onde até hoje as crianças saem fantasiadas para pedir doces. Quando não são atendidas ameaçam pregar um susto, como fariam os espíritos. A senha é a famosa expressão trick-or-treating (doces ou travessuras).

BRUXAS DO BEM



Outra presença inconfundível no Halloween são as bruxas, mulheres de aparência assustadora que usam a magia para fazer o mal. Essa descrição negativa, entretanto, surge só no século IX, com a influência do cristianismo na comemoração.

Para os celtas, as bruxas eram apenas mulheres que conheciam poderes terapêuticos de plantas e ervas. Elas faziam parte da comunidade e eram sempre bem vindas.

Publicado por  em 
http://ecoviagem.uol.com.br/noticias/curiosidades/turismo/o-halloween-e-mesmo-uma-festa-americana--18673.asp

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

À Procura de um Oásis Espiritual

Um Deus capaz de abrir passagem no meio do mar, não poderia ter arrebatado Seu povo, levando-o diretamente para a Terra Prometida? Então, por que não o fez? Por que não poupá-los do desgaste provocado por quarenta anos no deserto? O próprio Deus assume a responsabilidade sobre isso, dizendo: "Tirei-os da terra do Egito, e os levei ao deserto" (Ez.20:10). Portanto, não foi um acidente de percurso. Havia propósito nisso. 

E mais: há quem diga que essa travessia poderia ser feita em quarenta dias. Outros acreditam que no máximo em dois anos. Então, por que demoraram tanto? Teriam eles andado em círculo? Ou teriam feito muitas paradas? Entre a saída do Egito e a zona fronteiriça de Canaã, o povo de Israel fez quarenta paradas. Era necessário que o povo descansasse. Havia muitas crianças e idosos entre eles. 

Quarenta anos foi o tempo necessário para que aquele povo olvidasse o Egito. Tirá-los de lá não foi tão difícil quanto tirar o Egito de seus corações. Afinal, foram mais de quatro séculos vivendo sob a égide dos Farós. Ademais, algumas lições imprescindíveis só poderiam ser aprendidas naquele ambiente hostil. 

Como toda aquela gente poderia sobreviver num ambiente inóspito como o deserto? Somos informados de que Deus provera uma nuvem para lhes proporcionar sombra durante o dia. Esta mesma nuvem se transformava numa coluna de fogo para aquecê-los durante as noites frias. O deserto é um lugar de extremos. Suas temperaturas alcançam mais de cinquenta graus durante o dia, e caem abaixo de zero à noite. A coluna de fogo também servia para espantar os animais selvagens. Aquela nuvem/coluna também serviu-lhe como uma espécie de GPS. Quando a nuvem estacionava, eles acampanham. Quando avançava, eles prosseguiam.

Parada obrigatória, desejada por todo caminhante do deserto, o oásis é um lugar de recobrar as forças. Muitos, no afã de encontrá-lo, acabam sendo enganados por uma miragem. Tão logo avistam o que parece ser um lago cercado de palmeiras, saem correndo, e ao mergulharem dão de cara com a areia. 

Além das constantes intervenções divinas, garantindo provisão, o povo hebreu passou por vários Oásis, entre os quais, o Oásis de Mara, o Oásis de Elim e o Oásis de Refidim. Cada um desses Oásis representa uma etapa de nossa jornada espiritual. 

É Mara! 

Três dias depois de terem atravessado o Mar Vermelho, os hebreus chegaram ao Oásis de Mara. Provavelmente o suprimento de água já havia terminado. Todos estavam sedentos. Porém, as águas de Mara eram intragáveis porque eram salobras. O próprio nome “Mara” significa “amarga”. Isso rendeu muita dor de cabeça a Moisés, pois o povo não cessava de reclamar. Sem saber o que fazer, “Moisés clamou ao Senhor, e o Senhor lhe mostrou uma árvore. Lançou-a Moisés nas águas e as águas se tornaram doces. Ali Deus lhes deu estatutos e uma ordenança, e ali os provou” (Êx.15:25).

A passagem dos hebreus pelo Mar Vermelho representa o momento em que somos batizados (1 Co.10:1-2). Rompemos com o Egito, que representa o mundo, e começamos nossa jornada rumo à Terra Prometida, que representa a glória final. Porém, entre o Egito e Canaã há um deserto que precisa ser atravessado. Não há atalhos. O próprio Jesus, depois de ter sido batizado, foi levado pelo Espírito ao deserto para ser tentado (Mt.4). Não há como queimar esta etapa. É no deserto que nosso caráter é forjado. Lá é o cenário onde experimentamos a provisão de Deus. É lá que aprendemos a depender cada vez mais d’Ele, e a confiar cada vez menos em nossos parcos recursos. 

Mara é uma representação de nossa natureza humana. Não deixamos de ser humanos ao nos convertermos, ou sermos batizados. Quando os hebreus avistaram Mara, encheram-se de esperança, achando que finalmente haviam encontrado algo bom no deserto. Quem dera fosse apenas uma miragem. A frustração teria sido menor. Mas Deus usaria aquela decepção para nos dar uma importante lição.

Temos que chegar à mesma conclusão a que chegou Paulo, que mesmo depois de convertido afirmou: “Eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum” (Rm.7:18a).

Que decepção sofremos quando nos damos conta de que aquele velho “eu” persiste em nos assombrar, e que os velhos apetites e vicissitudes ainda residem em nossos próprios membros. O fato incontestável é que nossa carne jamais se converterá (Rm.8:7). Não importa se fomos batizados com pouca ou muita água, se num tanque batismal ou no rio Jordão. Nem batismo em óleo quente resolveria! Não importa quantos jejuns façamos a cada semana. Teremos que conviver com natureza adâmica pecaminosa até o fim de nossa existência terrena. Entramos, então, numa crise antes desconhecida, enquanto vivíamos sob o domínio do pecado. Se de um lado, somos impulsionados pelo Espírito a fazer o que é certo, do outro lado, temos que lidar com as pulsões da nossa natureza pecaminosa, e com o poder atrativo que o mundo exerce sobre ela. Por isso, Paulo exclama: “Miserável homem que eu sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” (Rm.7:24). Quem imaginaria ouvir uma exclamação como esta dos lábios de Paulo? 

É nesta crise que alguns põem em xeque sua própria conversão. Ora, quem jamais se converteu pra valer, não tem porque preocupar-se com isso. Este tipo de crise só ocorre aos verdadeiramente convertidos. 

Para apimentar ainda mais nosso dilema, deparamo-nos com a questão levantada por Tiago: “Pode a fonte jorrar do mesmo manancial água doce e água amarga? Meus irmãos, acaso pode uma figueira produzir azeitonas, ou uma videira figos? Tampouco pode uma fonte de água salgada dar água doce” (Tg.3:11-12).

E agora? Como sair desta? Como administrar este conflito?

Aquela foi a primeira vez que os hebreus consideraram a possibilidade de retornar ao Egito. Afinal, estavam apenas a três dias de lá. Era só dar meia-volta. Da mesma maneira somos tentados a retroceder em nossa caminhada. Parece-nos mais razoável viver escravizados, porém saciados, do que livres, porém sedentos. Pelo menos, no mundo, fazíamos o que nos desse na gana. Sexo, drogas, álcool, tudo estava sempre às mãos. Porém, a liberdade oferecida pelo mundo é ilusória. Recordemo-nos da exortação de Paulo:

"Cristo nos libertou para que sejamos de fato livres. Estai, pois, firmes e não torneis a colocar-vos debaixo do jugo da escravidão" (Gl.5:1).

Será que Deus Se prontificaria a abrir novamente o Mar Vermelho para dar passagem àqueles que retrocedessem? Não! Esses teriam que voltar nadando. rs

A jornada com Deus é um caminho sem volta! Não demos "até logo" ao mundo, e sim "adeus". Por isso, Deus avisou aos hebreus antes de fazê-los passar pela fenda aberta no mar: "Aos egípcios, que hoje vistes, nunca mais vereis para sempre" (Êx.14:13b).

Deixamos de ser mão-de-obra escrava de Faraó! Já não somos engrenagens daquele sistema corrupto. Em vez de súditos do império das trevas, somos agora cidadãos do Reino de Deus. Nossa nova vida é a ferramente usada por Ele para sabotar os esquemas deste mundo tenebroso. 

O relato sagrado diz que, ao ser pressionado pela turba enfurecida, Moisés recorreu ao Senhor, que lhe mostrou uma árvore que deveria ser cortada e lançada nas águas para que estas se tornassem potáveis. Essa árvore é uma clara representação da Cruz. É através dela que Deus trata com nossa natureza pecaminosa. Não adianta tentar converter nossa carne. Temos que confrontá-la através da Cruz. E quando me refiro à Cruz, não me refiro ao acontecimento histórico, mas à sua aplicação em nossa vida cotidiana. A simples existência daquela árvore não mudava nada como relação à salubridade das águas de Mara. A árvore tinha que ser lançada às águas. Assim como a Cruz tem que ser aplicada em nossas vidas.

Confira a afirmação de Paulo:
“Estou crucificado com Cristo, e já não vivo, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl.2:20).

Foi este mesmo apóstolo que declarou considerar-se crucificado para o mundo, ao passo que o mundo estava crucificado para ele (Gl.6:14).

Tem muito cristão sincero querendo filtrar as águas de Mara. Buscam subterfúgios numa religiosidade asceta e legalista. Talvez por desconsiderarem a eficácia da obra da Cruz. Paulo argumenta: “Se estais mortos com Cristo quanto aos rudimentos do mundo, por que vos sujeitais ainda a ordenanças, como se vivêsseis no mundo, como: não toques, não proves, não manuseies? Todas estas coisas estão fadadas ao desaparecimento pelo uso, porque são baseadas em preceitos e ensinamentos dos homens. Têm, na verdade, aparência de sabedoria, em culto voluntário, humildade fingida, e severidade para com o corpo, mas não têm valor algum contra a satisfação da carne” (Cl.2:20-23).

Paulo considerava a Cruz como um fato consumado. Não se tata de submeter-se a um código de conduta severo, ou a uma doutrina comportamental. Não! Não se trata de algo que devemos fazer, mas de algo que devemos considerar já feito. É assim que mergulhamos aquela bendita árvore nas águas amargas do nosso ser.

Veja o que ele diz em outra passagem:
Pois sabemos isto, que o nosso velho homem foi com ele crucificado, para que o corpo do pecado seja desfeito, a fim de não servirmos mais ao pecado (…) Assim também vós CONSIDERAI-VOS COMO MORTOS para o pecado, mas vivos para Deus em Cristo Jesus nosso Senhor” (Rm.6:6,11).

Nosso ego não pode ser poupado. Nossa fragilidade tem que ser exposta. Nossa natureza pecaminosa tem que ser confrontada. Nossas presunções têm que ser denunciadas. Nossas aspirações carnais renunciadas.
Enquanto a Cruz de Cristo não se tornar em nossa própria Cruz, as águas que fluem de nosso ser se manterão salobras.

Cruz não é playground da alma. É lugar de suplício, de auto-sacrifício, de rendição absoluta. Toda renúncia é dolorosa. Toda rendição é vergonhosa. Só existe uma maneira de suportarmos aquilo que a Cruz nos traz. Veja a recomendação do Espírito Santo:

Olhando firmemente para Jesus, autor e consumador da nossa fé, o qual pela alegria que lhe estava proposta SUPORTOU A CRUZ, desprezando a ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus. CONSIDERAI aquele que suportou tal oposição dos pecadores contra si mesmo, para que não vos canseis, desfalecendo em vossas almas” (Hb.12:2-3).

Quem está na cruz não pode olhar para si mesmo. Nem mesmo para a cruz em si, uma vez que esta está às suas costas. À sua frente estão os que se opõem, que escarnecem, que lhe pedem prova, exigem evidências de que você é quem diz ser. A pressão é contínua. Todos esperam uma falha sua para apontar o dedo e lhe acusar. Só lhe resta olhar pra cima!

Em momento algum Jesus Se preocupou em provar qualquer coisa. Ele não cedeu à pressão dos que se Lhe opunham. Ele desprezou a ignomínia, isso é, desprezou o desprezo. Quem está crucificado com Cristo não se preocupa em provar nada a ninguém. Antes, considera a maneira como Jesus Se portou durante as seis horas de Seu suplício no madeiro. É mantendo o foco n’Ele, que nossas forças se renovam, e em vez de amargura, o que jorra de nosso interior é um rio de águas vivas. Mas não se engane: Mesmo depois de experimentarmos o poder da Cruz em nossas vidas, teremos que lidar com os resquícios de nossa velha e amarga natureza.

O escritor de Hebreus nos adverte: “Tende cuidado de que ninguém se prive da graça de Deus, e de que nenhuma raiz de amargura, brotando, vos perturbe,e por ela muitos se contaminem” (Hb.12:15). Esta raiz amarga nada mais é do que resquício da natureza adâmica tentando aflorar. Por mais tempo de conversão que tenhamos, temos que manter o cuidado e a vigilância, para que as obras da carne não voltem a germinar em nossa vida. Se sentirmos uma pontinha de inveja de alguém, temos que voltar nossos olhos para Cristo, e suplicar-Lhe graça para que esta raiz não se aprofunde e venha frutificar. Avareza, ressentimentos, idolatria de qualquer espécie, são algumas dessas obras que vire e mexe tentam vir à tona, comprometendo nossa comunhão e testemunho. Por mais cristalinas e potáveis que sejam as águas que fluem nosso interior, elas acabam absorvendo as propriedades dessas raízes amargas, assim como acontece quando mergulhamos folhas de boldo numa xícara de água quente. 

Sabe quando essas raízes amargas conseguem brotar em nossas vidas? Quando recorremos à nossa justiça própria, quando deixamos de confiar na obra consumada na cruz, para fiar-nos em nossas realizações pessoais. Somos privados da graça sempre que nos justificamos em nossas obras. “Separados estais de Cristo”, admoesta o apóstolo, “vós os que vos justificais pela lei; da graça tendes caído” (Gl.5:4).

Voltemos à Cruz! Deixemos de lado qualquer justiça própria residual, e confiemos inteiramente na justiça de Cristo que nos é imputada. Somente assim, viveremos em novidade de vida, e seremos mananciais de água doce e potável. Hermes C. Fernandes

terça-feira, 20 de outubro de 2015

A Última Trombeta

Confesso já ter enfrentado alguma dificuldade para entender por que o clarim do arrebatamento é chamado de a última trombeta. Discorrendo sobre o rapto da Igreja, o apóstolo é mais do que meridiano; é profeticamente conclusivo: “Num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados” (1Co 15.52). Todavia, não esclarece ele a razão pela qual a última trombeta é assim denominada. Seria esta uma terminologia já mui familiar aos cristãos daqueles dias? Vejamos, em primeiro lugar, o que não é a referida trombeta.

• Não é mera simbologia, conforme supõem os alegoristas. Estamos diante de um texto que tem de ser interpretado de acordo com as regras gramaticais e históricas da hermenêutica sagrada.

• Não é a sétima trombeta do apocalipse, segundo erradamente inferem alguns mesotribulacionistas. Isto porque, esta trombeta não anuncia o arrebatamento, e, sim a instauração do Milênio (Ap 11.15).

• Não é a trombeta que, de acordo com a teologia judaica, anunciará a derradeira etapa da ressurreição dos mortos, quando estes por-se-ão de pé para recepcionar o Senhor. Não é necessário esclarecer que tal interpretação é extravagante e antibíblica.

À guisa de esclarecimento, busquemos definir o que é a última trombeta. Em nosso Dicionário de Profecia Bíblica (CPAD), assim delimitamos o assunto: “Trombeta que, assoprada pelo arcanjo Miguel, anunciará a ressurreição dos que morreram em Cristo e o arrebatamento dos santos que estiverem vivos por ocasião da vinda do Senhor”.

Desde o levítico, quando ordenou Deus fosse assoprada a trombeta, apregoando o ano do Jubileu (Lv 25.9), até à sétima trombeta do Apocalipse, proclamando a chegada do Milênio, observamos que nenhuma delas constitui qualquer mistério, seja quanto à sua designação, seja quanto ao tempo de seu sonido. A única exceção é a última trombeta.

Que a trombeta será assoprada pelo arcanjo, não há dúvida. E que será ouvida pelos redimidos do Senhor, também não há dúvida alguma. Mas qual o tempo de seu sonido? E qual a razão de seu epíteto?

Tendo sempre como base a Bíblia Sagrada, seja-me permitido responder a estas perguntas:

• A última trombeta é assim chamada porque: a) marcará o fim do ministério terreno da Igreja; b) e introduzirá o mundo no âmbito do completo domínio de Cristo sobre todas as coisas.

• De igual modo, estará a última trombeta assinalando não somente a chegada do Dia de Cristo como também o Dia do Senhor. O primeiro diz respeito ao arrebatamento da Igreja; o segundo concerne à Grande Tribulação.

• Por conseguinte, a última trombeta é assim alcunhada por assinalar o término não somente da atuação da Igreja de Cristo no mundo, como também o início do fim do atual sistema do Maligno, que será totalmente destruído durante a Grande Tribulação, para que o Reino de Deus seja completamente estabelecido neste mundo.

• Apesar de não sabermos a data do sonido da última trombeta, as profecias e os sinais estão a alertar-nos: muito em breve estará o arcanjo estrugindo-a, assinalando o glorioso rapto da noiva de Cristo. Aleluia!

Acredito que avançar além destas explicações é cair no perigoso terreno da especulação. Afinal, onde a Bíblia se cala não precisamos ter voz (Dt 29.29). De uma coisa, porém, tenho certeza: a trombeta soará, e eu irei ao encontro do meu Senhor. Maranata! Sim, você e eu estaremos lá. Pr Claudionor de Andrade

domingo, 18 de outubro de 2015

O Evangélico e o Álcool


O que a maioria dos evangélicos brasileiros desconhece é que esta visão estigmatizada acerca do álcool é coisa muito recente na história da Igreja. Ao longo de quase 2 mil anos de cristandade, prevaleceu a noção de que a bebida, em si, é neutra, uma dádiva do Senhor que traz alegria – sendo o seu consumo excessivo, ou embriaguez, esta sim, pecaminosa. De fato, muitos crentes se escandalizariam ao descobrir que, na galeria dos heróis da fé protestante, homens e mulheres de Deus consumiam bebida alcoólica, e ficariam surpresos por saber que certos segmentos da Igreja, em nome do abstencionismo, alteraram até mesmo um dos ritos mais importantes, ao lado do batismo: a celebração da eucaristia. O detalhe é que o vinho é mencionado reiteradamente nas Escrituras, tanto no sentido literal como por expressão poética. E o produto da uva era parte fundamental da cultura, da religiosidade e da economia do povo hebreu, desde sua origem. 

Em relação ao álcool, os cristãos se dividem basicamente em três correntes: os abstêmios, que optam por beber eventualmente, mas não combatem quem pensa diferente; os temperantes – ou moderacionistas, que assumem beber em determinadas circunstâncias e com moderação –; e os proibicionistas, que advogam a condenação total ao ato de beber álcool. Por aí, já se tem uma noção do tamanho do problema.

Com ascendência religiosa ligada ao arminianismo das tradições batistas do sul dos Estados Unidos e ao pentecostalismo clássico, o movimento evangélico brasileiro tende historicamente à rejeição total ao álcool, posição que, no entanto, tem tantas motivações culturais quanto espirituais. E a prática evangelística dominante no país, muito pautada na oposição ao catolicismo, faz com que a maioria dos evangélicos brasileiros se surpreenda ao descobrir diferenças culturais marcantes entre eles e os cristãos de outros povos, em especial os europeus. De fato, na Europa, até mesmo os pentecostais não costumam ter qualquer pudor diante de um canecão de vinho ou de uma reluzente tulipa de cerveja.

A enfoque cristão da bebida está relacionado a cultura dos missionários. 
“Depois de ter vivido em diversos países, tenho percebido que a questão da bebida está mesmo muito ligada à cultura dos missionários que chegaram a cada região”, confirma o bispo Josep Rossello Ferrer, moderador da Igreja Anglicana Reformada no Brasil. No Velho Mundo, os cristãos veem o ato de beber com maior normalidade que os americanos, por exemplo – por isso, muitas práticas na Igreja brasileira de hoje são frutos de ideias religiosas oriundas dos Estados Unidos, o que explica porque as denominações surgidas do esforço missionário americano do século 19 (batistas e presbiterianos, por exemplo), guardem em sua memória a visão abstencionista.

Líder de uma comunidade anglicana em Pindamonhangaba (SP), Ferrer, que é espanhol, observa que sua organização religiosa não tem uma posição oficial sobre o assunto. “Entendemos que a decisão de beber ou não é uma questão de liberdade cristã. Alguns irmãos podem usar álcool sem nenhum problema de consciência, enquanto outros entendem que isso seria pecado”. Por isso, o sacerdote faz questão de não tratar o assunto como dogma. “Não se pode afirmar que a Bíblia condena a bebida. Encontramos nas Escrituras avisos claros contra o estado de embriaguez, que leva à perda do controle dos sentidos, mas não vemos nenhuma restrição ao consumo moderado.”

MODERAÇÃO SEM CONDENAÇÃO
Tal visão encontra reflexo na opinião de muitos crentes. Para o fotógrafo e missionário Duda Ferreira, 39 anos, de tradição batista (é neto de pastor) e hoje ligado à Igreja Bola de Neve, o episódio bíblico em que Cristo transforma água em vinho é emblemático: “É interessante constatar que tendo Jesus, juntamente com seus discípulos, sido acusado pelos fariseus de negligenciar os rituais de apropriados de limpeza antecedentes às refeições (Mateus 15:2) tenha usado exatamente desta água de purificação (João 2:6) para transformar em vinho nas bodas de Caná. Acho que havia uma lição extra neste episódio.” Recentemente retornado do Havaí (EUA), onde praticava surfe e liderava uma célula de crentes, ele observa que a questão cultural não pode mesmo ser deixada de lado na análise da questão, mas recomenda cuidado. 


















O missionário Duda (com sua célula de surfistas) diz que o episódio da transformação de água em vinho é emblemático. 

“No exterior, convivi muito com cristãos que consumiam álcool com moderação, da mesma maneira como presenciei pessoas estragando suas vidas com bebida”. Para Duda, o potencial destrutivo do álcool explica porque mesmo o uso moderado do vinho seja um escândalo para crentes brasileiros. “O choque cultural é real. Lembro-me de ter recebido, na minha célula aqui no Brasil, um casal francês que trouxe uma garrafa de vinho para a Ceia. Houve constrangimento entre os presentes. Eu acho que não faria qualquer diferença, mas, naquele contexto, o incômodo dos irmãos foi, por si só, razão para manter a garrafa fechada.”

“O tema sempre será delicado, e por isso devemos tratá-lo biblicamente, mas nunca na base do ‘pode ou não pode’”, opina, por sua vez, Hernandes Dias Lopes, pastor e escritor de confissão presbiteriana. “Este é um caminho que pode construir uma ética farisaica e uma espiritualidade rasa”. Para Hernandes, há uma dificuldade bíblica de se fazer uma defesa radical pela abstinência, de maneira que a questão deve ser ponderada. Ele lembra que a ética cristã não se baseia somente no direito ou na consciência de cada um, mas no direito do outro e no amor ao próximo. “Dessa maneira, não se pode fechar os olhos para a realidade de tantas tragédias pessoais decorrentes da bebida e das perspectivas da juventude brasileira, que está sendo consumida pelo álcool”. 


















Os perigos do álcool são destacados por Hernandes: "Se beber pouco ou muito escandaliza meu irmão, devo abster-me" 

Hernandes alerta que as igrejas nem precisam olhar para fora para constatar a imprudência no consumo do álcool, mas atentar para a secularização vista nas congregações hoje: “Tenho ido a casamentos de crentes a cujas cerimônias seguem-se festas suntuosas regadas a todo tipo de bebida. O que se passa é que, no fim da festa, se vê cristãos saindo destes repastos com as pernas bambas” . Se beber pouco ou muito é motivo de escândalo para um irmão, acrescenta Hernandes, “então eu devo abster-me de beber”. Princípio, segundo ele, que deve nortear de resto qualquer atitude do crente.

“Pensar que o álcool é intricadamente ruim é atribuir mal a Deus, que o fez”, avalia o pastor episcopal Carlos Moreira, 46 anos, de Recife (PE). “Deus é santo, e em Salmos 104.15 aprendemos que ele fez o vinho, que alegra o coração do homem, assim como o azeite que faz reluzir o seu rosto e o pão, que lhe fortalece”.

Moreira: “Não me parece que Jesus se importasse em escandalizar fariseus” 
Defensor da moderação, Moreira conta que certa vez foi flagrado por um membro de sua paróquia enquanto consumia cerveja em um restaurante. “Com tom condenatório, aquela pessoa perguntou-me como eu podia estar bebendo”. A resposta, simples e até bem humorada – “Minha irmã, não quero e nem posso ser melhor do que Jesus” –, expressa sua preocupação com o legalismo. “O legalista não está satisfeito com os padrões da justiça de Deus. Ele arrogantemente pensa que pode fazer melhor que o Senhor – legisla ele mesmo, segundo as suas próprias aspirações religiosas. Assim, proíbe o que Deus permite e, como resultado, muitas vezes permite que Deus proíbe.”

Carlos Moreira reconhece a gravidade do problema do alcoolismo e afirma que nenhum cristão, em sã consciência, deve oferecer motivo de tropeço a um irmão sob o jugo desta doença. “Contudo”, pondera, “essa lógica de que devemos eliminar alguma coisa por completo de nossas vidas porque há quem abuse da liberdade de usá-la não me parece uma atitude compatível com a nossa liberdade cristã e com o exercício de maturidade que esta envolve”. O pastor lembra que o reformador Martinho Lutero resumiu esta perversão que força uma religiosidade vazia com um comentário provocativo: “Ora, os homens são levados ao erro por conta de mulheres e bebidas. Deveríamos nós abolir as mulheres?”, cita.

Para Moreira, a ética cristã não possibilita que se traga escândalo ao irmão, o que é um conceito aplicável a situações específicas – “Caso de um crente novo na fé, por exemplo” –, não uma regra geral: “Considere o caso de Jesus, nosso padrão de santidade perfeita, que consumia vinho com os seus apóstolos com regularidade e sem fazer nenhum segredo disso”. A quem estranhar tal afirmação, o pastor explica que a própria Bíblia registra que o Filho de Deus foi caluniado pelos fariseus por não seguir o seu rigor ascético, entre outros aspectos, por se dar ao excesso de bebida e comida. “Não me parece que Jesus se importasse em escandalizar fariseus”, conclui.

“BÊBADO É DO DIABO”
A questão da bebida é tratada no primeiro catecismo cristão de que se tem registro, a Didaquê, do primeiro século. Ali, fica claro o uso livre do vinho, seja na eucaristia ou no consumo cotidiano dos irmãos. De fato, havia até mesmo uma instrução determinando a existência de um reserva da bebida da comunidade para os profetas visitantes e, na ausência destes, dado aos pobres.

Clemente de Alexandria (que viveu aproximadamente entre os anos 150 e 215 da Era Cristã) julgava absolutamente justo ao homem consumir a bebida para o seu relaxamento e defendeu fortemente a presença obrigatória do vinho na Ceia do Senhor, contra as tentativas de gnósticos de substituir o vinho por água. 

Don Perignon: o monge inventor do Champagne. Os religiosos deixaram a sua marca na história das bebidas fermentadas. 
Por fim, o período marca a consolidação na Igreja da visão da moderacionista –ou temperante- em relação ao álcool. E o aspecto curioso a este respeito é que a base teológica desta visão não tem origem no cristianismo, tão pouco no judaísmo. O conceito de temperança é um “empréstimo” da filosofia grega, mais especificamente do esquema de Platão. Foi dali que Santo Agostinho, Santo Ambrósio e outros se municiaram para construir o conceito das quatro virtudes cardeais ou cardinais do cristão (prudência, justiça, temperança e coragem). E foi a partir desta ótica que a questão do consumo álcool recebeu juízo dos grandes doutrinadores da igreja: o álcool não é um mal em si, mas uma benção de Deus e o seu abuso, este sim, um pecado, uma manifestação da gula, um dos sete pecados capitais. Todos os males causados pela embriaguez são derivados da falta de temperança. 

As vistudes cardeais do cristão no afresco de Rafael. O cristão é chamado a ser temperante em relação ao álcool. 
O fim do Império Romano, no século 5, fez surgir o modelo econômico feudal, no qual os mosteiros, abadias e outras estruturas religiosas passaram a produzir os seus víveres – e o vinho era item fundamental, não apenas na dieta, mas para as celebrações religiosas. A cerveja também era produzida e largamente consumida pelos religiosos. Os monges foram responsáveis pela maior parte da produção de vinho e cerveja na idade média e também pelo aprimoramento dos processos de fabricação. A disseminação de técnicas entre os mosteiros e ordens envolvia tipos de vinhas, grãos e sistemas de estocagem e fermentação. O vinho era motivo de celebração e a igreja católica relacionou diversos santos à produção do álcool, entre outros: São Adriano e São Armando – padroeiros dos cervejeiros e dos donos de taverna e São Martinho e São Vicente, padroeiros do vinho e dos vinicultores. 

Na idade média a produção de alcóol é dominada pelos religiosos cristãos. 
A Reforma Protestante é marcada pelo retorno às Escrituras, mas também pelo esforço dos reformadores em romper com as tradições católicas o quanto fosse possível, estabelecendo uma distância não apenas teológica, mas também cultural. Contudo, a visão dos reformadores quanto ao consumo da bebida não recebeu novo escrutínio, ao contrário: eles doutrinaram a Igreja a receber a bebida como uma bênção de Deus e a usufruir dela com moderação, não se deixando dominar por ela. Lutero consumia vinho e era conhecido como um grande bebedor de cerveja, produzida por sua esposa, Catharina. Já João Calvino recebia como parte de seu salário anual da Igreja Reformada suíça sete tonéis de vinho. Até os principais tratados de fé escritos nesse período – como confissão belga (1561) no artigo 35; o catecismo de Heidelberg na pergunta 80 (1563); no artigo 28 dos 39 artigos da doutrina Anglicana (1571); na fórmula Luterana de Concórdia no artigo 7 (1576); e no capítulo 29 da Confissão de Westminster (1647) – faziam clara menção ao uso do vinho.

E também os puritanos, sempre tão associados a um padrão frugal e conservador de comportamento, não dispensavam uma caneca. 

Mayflower levou os puritanos (e muita cerveja) para a América. 
Vindos para o Novo Mundo em busca da liberdade de exercer a sua fé e fazer da nova terra um preambulo do reino celestial, nossos irmãos não esqueceram a bebida na velha Europa, ao contrário. O navio Mayflower que os trouxe ao novo mundo carregava mais cerveja do que água – quase 30.000 litros da bebida e, ao desembarcarem, em Plymouth Rock –EUA, adivinhem qual foi o primeiro prédio permanente que eles construíram? Uma igreja? Uma capela? Não. Uma cervejaria! Increase Mather, clérigo renomado, presidente da Universidade de Harvard e protagonista dos célebres julgamentos relacionados a bruxaria em Salem, resume o ponto de vista dos puritanos sobre o tema em seu sermão Ai dos bêbados, de 1673: “A bebida é em si uma criação pura e boa de Deus, e deve ser recebida com gratidão, mas o abuso de bebida é de Satanás; o vinho é de Deus, mas o bêbado é do diabo.” Azar das bruxas da época e sorte de quem podia apreciar um bom copo de cerveja com assado no dia de ação de graças. 

O metodismo marca o início da mudança da visão da igreja em relação ao álcool. 
O movimento metodista nas Ilhas Britânicas marca o início da mudança da visão da igreja em relação ao consumo do álcool. O célebre evangelista John Wesley, no século 18, foi um dos primeiros a se insurgir contra os excessos de bebida entre os crentes, e também pioneiro na articulação de um movimento de proibição do seu uso. Em seus sermões, Wesley reprovava o uso não-medicinal de bebidas destiladas, como conhaque e uísque, e dizia que muitos destiladores que vendiam seus produtos indiscriminadamente não eram nada mais do que “envenenadores e assassinos amaldiçoados por Deus”. Novamente, o contexto histórico-cultural não deve ser ignorado. À época, com o advento da Revolução Industrial, as cidades não ofereciam infraestrutura suficiente para atender às demandas da população que afluía do campo para trabalhar nas fábricas. Faltava água potável e as bebidas destiladas e fermentadas eram largamente usadas”. O ambiente de miséria, somado à embriaguez endêmica, resultou em um grave problema social.” 

O movimento de temperança surge, em principio, como reação da Igreja ao sério problema de saúde pública provocado pelo alcoolismo nos Estados Unidos. Desde a Corrida do Ouro o Whiskey era a bebida da escolha popular e a cultura dos saloons se espalhava pela nação, trazendo consigo todos os outros males que lhe são próprios e já muito explorados nos filmes de bang-bang. A maioria dos estudiosos concorda que o marco zero foi a publicação, em 1805, de um folheto de autoria do médico Benjamin Rush tratando dos males do álcool. Pela primeira vez, foi introduzida a noção de vício potencial inerente ao consumo de bebidas destiladas e o autor prescreve a abstinência como única cura. Rush, presbiteriano, foi um dos signatários da Declaração de Independência americana e fundador da Sociedade Bíblica da Filadélfia. A relevância do autor explica o impacto que a sua obra recebeu na sociedade. 

Arcebispo William Mikler: A mudança de um elemento da Ceia do Senhor é uma dupla ofensa. 
O arcebispo episcopal William Mikler, do Apostolado para as Nações, com sede nos Estados Unidos e igrejas em todo o mundo, incluindo o Brasil – país que visita com regularidade –, lembra que este não era um movimento apenas religioso, tanto que um dos polos mais importantes do esforço partiu das feministas, mulheres como Frances Willard e outras personalidades ligadas ao movimento sufragista feminino que queriam a sua voz na nação (voto) e fizeram da igreja o seu palanque principal. O afastamento dos homens da igreja, que foram lutar a primeira guerra, ajudou muito a conquista deste espaço no cenário político e nas congregações. 

As mulheres estadunidenses lideraram o proibicionismo. 
“O movimento envolvia uma grande disputa por espaço político e, aos poucos, sob o entulho do farisaísmo, foi tomando conta da Igreja, chegando ao ponto de banir o vinho da Ceia do Senhor, o que vai diretamente contra a um mandamento de Cristo.” O resultado, explica Mikler , foi a defesa do proibicionismo como política de Estado, um dos motivos da Lei Seca – emenda à Constituição americana que proibiu a venda e o consumo de álcool no país. O tiro acabou saindo pela culatra, aumentando o consumo no país e estimulando as destilarias clandestinas, a exploração ilegal da indústria de bebida e o crime organizado. 

Para Mikler, a questão do alcoolismo, naturalmente, merece a atenção da Igreja, mas o grande erro do movimento de temperança foi construir uma teologia apontando a bebida como algo inerentemente mau, justificando, assim, a retirada do vinho da Ceia. “Isto foi uma dupla ofensa: A Deus, que deu o vinho ao homem, e a Jesus, que escolheu este elemento para a Ceia.”

Mais tarde, quando o metodista Thomas Welsh desenvolveu um processo de fermentação do suco de uva capaz de conservar a bebida sem promover a fermentação alcoólica criando o “suco de uva”, deu-se a substituição do vinho na comunhão. Contudo, vale lembrar, este não é o mesmo elemento (vinho) e nem um subproduto natural. O prensado natural da uva é o mosto (não alcoólico), o qual evolui rapidamente para um produto alcoólico, função da fermentação natural.

Rev. Rodrigo Lima: Fábulas para retirar o vinho das Escrituras. 
Desde então, há até gente que defenda a tese de que a bebida consumida por Jesus não era alcoólica. O pastor Rodrigo Lima, funcionário público e pastor da Igreja Presbiteriana Independente em Rondônia, rechaça essa ideia usando a própria passagem bíblica que narra o milagre da transformação da água em vinho. “Não bastasse a incoerência de tal afirmação com o comentário registrado nas Escrituras, quando alguém ali estranhou receber o ‘bom vinho’ àquela altura da festa, o vocábulo grego para definir a bebida servida por Cristo – ouinos – é o mesmo usado em todo o Novo Testamento em referência ao vinho alcoolico comum”. Mesmo assim, ele passa longe do copo, e tem bons motivos para isso. “Sou filho de pai alcoólatra, e a bebida destruiu não só seu casamento dele, como minha própria relação com ele. Por causa desse trauma eu não bebo, mas não recrimino quem o faça.”

LÍCITO x CONVENIENTE 
Associados, na Palavra de Deus, a uma série de problemas – caso de Noé e Ló, personagens bíblicos, que cometeram desatinos quando embriagados –, exageros com o álcool trazem não apenas malefícios espirituais, como a ruína de famílias, episódios de violência e vidas destruídas. O estigma social do álcool é tão intenso que muitas igrejas evitam até mesmo o vinho na celebração da Ceia. “Fazemos isso por consideração àqueles irmãos já enfrentaram ou ainda têm problemas com o alcoolismo”, explica o pastor Paulo Cesar Brito, líder da Igreja Missionária Evangélica Maranata, do Rio de Janeiro. Como também é médico, Brito sabe bem quais são os efeitos do álcool no organismo humano e que basta uma pequena dose para trazer de volta um vício devastador que, muitas vezes, foi deixado para trás graças à fé. Por isso mesmo, nas congregações de sua igreja, os pequenos cálices da comunhão trazem apenas alguns mililitros de suco de uva – o bastante, no seu entender, para manter o simbolismo e o significado espiritual do ato.

Mas tal posicionamento já foi (e continua sendo) alvo de polêmica. O teólogo reformado Keith A.Mathison é autor de trabalhos respeitados sobre o assunto. Ele acredita que a retirada do vinho da Santa Ceia é uma questão que desafia qualquer principio ordenador que se use na Igreja protestante. Em um de seus artigos mais recentes, Mathinson lembra que a noção do princípio regulador do culto – segundo o qual, no culto de Deus, o que não é ordenado é proibido – é ignorado por completo “quando o assunto é a mudança de um elemento na celebração do mistério da Ceia do Senhor”.
As igrejas reformadas subscrevem formalmente este princípio. Mathison lembra a história de Nadabe e Abiú, narrada em Levítico 10, para ilustrá-lo. “Deus emitiu comandos específicos sobre como devia ser adorado. Nadabe e Abiú decidiram que seria aceitável mudar algo. Ao fogo estranho, Deus respondeu com destruição”. Para o autor, Jesus instituiu a Ceia com pão e vinho, e não há autorização para mudar isso, assim como não se pode suprimir a água no sacramento do batismo.

Nicodemos: "Nas igrejas presbiterianas o uso do vinho na Ceia fica a critério das igrejas locais." 
O pastor presbiteriano e chanceler do Instituto Mackenzie, Augusto Nicodemos Lopes, contemporiza: “Não creio que princípio regulador seja tão abrangente a ponto de exigir que seus defensores tenham que usar o vinho. Ele trata de princípios que regem o culto público, e o uso de vinho ou suco de uva é uma questão de circunstância, e não de elemento de culto ou de princípios.” Nicodemos lembra que, mesmo no Brasil, não existe uma unanimidade entre os reformados sobre o uso do vinho ou de suco na Ceia. “Fica a critério das igrejas locais. Fui pastor da Igreja Suíça de São Paulo onde se usa vinho. E pastoreei igrejas presbiterianas onde se usava ou um ou outro. Isso vai muito da mentalidade do pastor e do Conselho.” 

Barros: Pentecostais transformaram costume em doutrina. 
A predominância da visão abstencionista, nas denominações históricas esta posição não é manifestada oficialmente. “O que não acontece entre os pentecostais, neopentecostais e grupos afiliados ou decorrentes destes”, observa, Thiago Lima Barros, advogado, servidor público federal e pesquisador da história da igreja. : “Esses grupos são os únicos que elevaram tais restrições ao status de doutrina; se não na teoria, pelo menos na prática diária”.

Para ele, a importância do movimento pentecostal e sua influência sobre toda a Igreja Evangélica brasileira explica muito a posição predominante em relação ao álcool no Brasil – “E não apenas neste aspecto, mas toda uma tradição de usos e costumes”. Diácono da Igreja Nova Aliança, comunidade de linha pentecostal, Barros lembra que na década de 40 após tentativas mais ou menos draconianas, em 1975 na 22ª reunião da Convenção Geral das Assembleias de Deus, realizada em Santo André (SP) deliberou oficialmente sobre vestuário, aspectos da aparência, a abstenção do uso de aparelho de televisão e, claro de bebidas alcoólicas. E estas posições só encontraram algum relaxamento em 1999, por ocasião do 5º Encontro de Líderes da Assembleia de Deus, onde as exigências foram contextualizadas, ainda que sem se abrir mão abrir mão da importância dos usos e costumes como prática saudável e de identidade da igreja.”
O diácono oferece um posicionamento conciliatório: “Nenhum cristão realmente nascido de novo em Cristo vai defender libertinagem ou embriaguez, que são posturas de evidente mundanismo. Precisamos, de fato, ser santos como o nosso Senhor o é . O problema é que, no afã de vivenciar essa santidade, houve um retorno inconsciente ao legalismo mosaico e aos seus rudimentos fracos, e o bebê foi jogado fora junto com a água do banho.”

Zibordi: Nem tudo convém ao crente. 
Pastor da Assembleia de Deus, a igreja que foi a principal responsável por essa influência, Ciro Sanches Zibordi cita o texto de Efésios 5.18 para enfatizar a importância de o crente ser dominado pelo Espírito Santo. Ele justifica a abordagem mais conservadora da denominação com um argumento baseado na história e na realidade social da expansão assembleiana. “Como se sabe, a igreja Assembleia de Deus sempre atuou entre as pessoas mais carentes, em favelas e morros, por exemplo, onde muitos alcoólatras são transformados radicalmente pelo poder do Evangelho. Não faz sentido dizer a pessoas que foram libertas de maneira sobrenatural de um vício que elas podem continuar usando com moderação a substância que abandonaram.” 

Autor de títulos como Erros que os pregadores devem evitar e Evangelhos que Paulo jamais pregaria (ambos editados pela CPAD), o pastor, que atua na Assembleia de Deus do Ministério de Cordovil, no Rio de Janeiro, afirma que todo patrulhamento deve ser evitado: “Ninguém tem o direito de interferir na individualidade e na privacidade das pessoas salvas em Cristo”. De fato, mesmo o apóstolo Paulo, tão radical nas regras de conduta que prescreveu à Igreja primitiva em suas epístolas, mostrou-se transigente em relação à bebida. Ele chegou a recomendar a seu filho na fé e colaborador ministerial Timóteo que usasse “um pouco de vinho” para melhorar suas enfermidades digestivas.

“A Palavra de Deus é um livro de princípios, e isso deve ser levado em consideração quando tratamos de assuntos tão delicados como o consumo de bebidas alcoólicas”, continua o pastor Zibordi. Por outro lado, pondera, um líder cristão consciente pode e deve pregar contra o uso da bebida e seus efeitos. “Tudo o que um alcoólatra precisa é de uma transformação radical, ao invés de uma orientação dúbia. Logo, a despeito de a Bíblia não condenar a bebida alcoólica pela força de mandamento, ela mostra que nem tudo o que lícito é conveniente para o cristão, conforme I Coríntios 6.12”. 

Extra
A tabela a seguir não consta da matéria original da Revista Cristianismo Hoje. Estamos disponibilizando para colaborar com o debate sobre o tema aqui no site:








































Esta tabela não faz parte da matéria original publicada na Revista Cristianismo Hoje 
Matéria de capa
Revista Cristianismo Hoje
Por Danilo Fernandes


sábado, 17 de outubro de 2015

O Dia do Professor no Contexto Atual

O dia do professor são todos os dias. Contudo, convencionou-se a data 15 de outubro, como um meio de homenageá-los. Homenagem esta, mais do que merecida, pois são profissionais do mais alto gabarito e importância na formação de jovens que serão o futuro da nação. Dedicam-se com afinco e possuem o dom ímpar de se fazerem entendidos por seus alunos. Sem contudo, deixar de falar na interação elementar que possuem com mães e pais. Isto posto, penso que, mais do quê uma homenagem, os professores precisam ser tratados com dignidade. Infelizmente não há o que se comemorar. O Brasil passa por uma forte crise econômica e os profissionais da educação são um dos mais penalizados. Diante do exposto, a falta de entusiasmo tende a diminuir. Antes tínhamos jovens com sonhos de serem professores. Era tradição em muitas famílias o sonho de ser mestre, desejo causado pela própria importância da função. Uma linda carreira. Atualmente, poucos são os que querem entrar na área. Mas este sonho não pode acabar. Temos que lutar para manter os que são professores na função e, mais, fazer reacender nestes e nos jovens a chama do entusiasmo de ser professor. Sei que não é uma tarefa fácil, pois formar alunos entusiasmados já é um desafio nos dias de hoje, uma vez que, a educação é tão deficitária. Enfim, mesmo diante de todo este quadro desalentador, cabe-nos sempre, a escolha de enxergarmos os problemas, por mais difíceis que sejam, e darmos soluções aos mesmos. 

Trata-se de um absurdo inaceitável o descaso com que o poder público trata a educação no Brasil, mas combater isto é fundamental. A sociedade precisa se mobilizar de maneira ordeira, pacífica e ir para as ruas fazer valer os seus direitos. Destemor, foco e determinação são características que não podem deixar de existir dentro do ser humano. Portanto, é imprescindível que todos os professores sejam guerreiros, como já o são. A despeito de todo o contexto de retrocesso político, social e econômico pelo qual passa o nosso país, contamos com o estímulo de idealistas e célebres acadêmicos brasileiros, tais como: Darcy RibeiroPaulo FreireAnísio Teixeira, dentre outros. Acadêmicos estes que, deixaram um legado de lutas e de exemplos. Intelectuais que, em vida, marcaram e delinearam um paradigma consistente e esperançoso de uma educação justa e igualitária. Uma visão abrangente. Aliás, a educação está ligada de maneira absoluta ao campo social e no olhar para o próximo com humanidade. Pelo menos é o que deve haver. 

Enfim, para todos os ideais que desejamos alcançar, temos que semear. Todavia, toda a semeadura deve ser feita através de muita luta e não de braços cruzados. Penso que, professores e toda a sociedade de modo geral devem se unir e lutar juntos a fim de que a justiça seja feita. Professores precisam de bons salários e de uma ótima infra-estrutura de trabalho para darem aula. Isto é um dever do governo. Gastam-se milhões de reais em obras de urbanização, muitas destas até desnecessárias, ao passo que o professor, dentre outros profissionais padecem as agruras de terem que sobreviver de migalhas.  Reflitam. Desejo a todos os mestres do Brasil e do mundo um sincero e carinhoso feliz dia dos professores! João Luciano Silva da Costa.